Algarve oferece 24 mil camas para construir no interior mas não há quem queira investir

Desde a revisão do Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve em 2007 até agora, 12 câmaras receberam luz verde para lançar Núcleos de Desenvolvimento Turístico. Nem um projecto foi concretizado

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evr enric vives-rubio

O sector imobiliário cresce um pouco por todo o país mas os grandes investidores na área do turismo algarvio não arriscam sair da “zona de conforto” do litoral. O Plano de Ordenamento do Algarve (PROT) de 2007 previa a construção de 24 mil camas no interior da região, enquadradas pela figura de Núcleos de Desenvolvimento Turístico (NDT). Até ao momento, nem um projecto foi concretizado — tudo não passou de intenções. A última proposta de investimento aconteceu há dois dias, de um promotor alemão: um hotel de cinco estrelas e dois aldeamentos turísticos na Goldra de Cima, freguesia de Santa Bárbara de Nexe.

A empresa Luxo Pitoresco, SA, foi a única interessada que se apresentou ao concurso público do NDT de Faro lançado no ano passado pelo município, com uma oferta de 1030 camas. A proposta do investidor ficou-se pelas 642 camas, num terreno com 42,26 hectares. Não se sabe quando a obra poderá começar. O presidente da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA), Elidérico Viegas admite: “Pode levar seis ou dez anos, se tudo correr bem”. Na região, lembra, há um caso [Quinta da Ombria, concelho de Loulé] onde os empresários estiveram quase 30 anos para ver aprovado o projecto. A morosidade burocrática, enfatiza, “desmotiva qualquer investidor”. Desde a primeira apresentação da proposta do NDT de Faro até à entrega dos documentos, para demonstrar a capacidade técnica e financeira da empresa, já passaram dez meses. Segue-se agora a contratação entre o município e o promotor para a elaboração do Plano de Pormenor, o que implica a alteração do Plano Director Municipal (PDM). A passagem de solo rural a urbano-turístico obriga a conjunto de procedimentos com consulta pública.

O antigo vice-presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve (CCDR), Porfírio Maia, arquitecto, reconhece que tem havido intenções de investimento fora da faixa litoral “mas tem falhado a capacidade técnica e financeira das empresas para concretizar os projectos”. Elaborar um plano de pormenor, enfatiza, faz-se em seis meses. Mas as garantias de financiamento anunciadas, na hora da verdade, ficam no ar. “Os bancos portugueses estão debilitados e preferem apoiar empreendimentos já construídos [pendurados nas vendas pela crise]”, admite.

O certo é que das 16 câmaras algarvias, 12 receberam parecer favorável da CCDR — Algarve para lançar os concursos para preencher as 24 mil camas, criando Núcleos de Desenvolvimento Turístico em áreas do interior e barrocal, incluindo Costa Vicentina e zona do Guadiana. Não existe um único projecto implantado no terreno. “As entidades oficiais deviam questionar-se porque razão é que os promotores não avançaram”, observa Elidérico Viegas, criticando: “O PROT-Algarve e os Planos Directores Municipais têm optado por uma atitude proibicionista e fecham as portas quando o mercado está receptivo e existem oportunidades”.

A câmara de Tavira foi a primeira a lançar um NDT, em 2009. Para uma oferta que podia chegar às 2610 camas obteve interesse de investimento para construir 1800 num prazo de cinco anos. Quando chegou à fase das garantias bancárias, o promotor desistiu. Faltou o financiamento.

No concelho de Loulé repete-se o cenário dos grandes investimentos virtuais. O projecto Vale do Freixo, Golf& Country Estate, situado numa zona do Barrocal (Benafim), é um exemplo extensivo a Castro Marim, Lagos ou Portimão. Em 2012, recebeu a chancela do Governo de Projecto de Potencial Interesse Nacional (PIN) para acelerar procedimentos e contornar obstáculos administrativos. Por sua vez, a CCDR-Algarve, que preside ao Observatório do PROT-Algarve, conferiu-lhe o reconhecimento de “interesse regional”. No Kuwait, o então ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Portas, apresentou o projecto estimando um investimento de 200 milhões de euros (1722 camas turísticas mais campo de golfe). O promotor seria a United Investments — empresa que integra capital da família Al Bahar, que tem negócios na região desde 1985. Segundo o município, a empresa não procedeu ao estudo de Avaliação de Impacto Ambiental (AIA), nem manifestou interesse em desenvolver o projecto, em solo classificado de Rede Natura 2000.

Quando foi discutido a revisão do PROT, em 2007, queixavam-se os autarcas, a oferta de 24 mil camas não chegaria para responder à procura.

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