Os tesouros do botânico cobrem uma encosta

O Jardim Botânico da Universidade de Coimbra sofreu várias mudanças nos últimos anos, desde a renovação da Estufa Grande à abertura de um percurso que liga a Baixa à Alta pela mata do jardim.

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Iniciando um percurso pelo Jardim Botânico da Universidade de Coimbra (JBUC) na entrada dos Arcos, o patamar elevado dá uma ideia vista geral sobre a mancha verde que se estende por mais de 13 hectares. Uns metros à frente, chegando ao primeiro lanço de escadas, encontramos o primeiro contraste de épocas: do lado esquerdo notabilizam-se as palmeiras, árvores tropicais, representantes de uma certa forma de ver estes jardins como espaços mais exóticos; do direito, surge a Estufa Grande, construída no século XIX e um dos primeiros edifícios de arquitectura do ferro e vidro do país, que reabriu este ano, depois de um período de reabilitação.

A Estufa Grande alberga uma das maiores atracções do jardim: a Victoria Régia, um nenúfar com folhas de grandes dimensões que produz uma flor efémera. A planta aquática da Amazónia que foi buscar o nome à monarca britânica está alojada no lago do compartimento central, sendo que as alas laterais são preenchidas por outras plantas, de regiões mais húmidas ou quentes.

O espaço, que originalmente foi construído com a estufa londrina de Kew Gardens como modelo, voltou a abrir portas em Março deste ano, depois de uma intervenção desenhada pelo arquitecto João Mendes Ribeiro.

Numa manhã luminosa de final de Agosto, não é difícil identificar o tipo de visitante que explora o jardim, de mochila e telemóvel em riste. “Neste mês está mais gente”, comenta o director do Jardim Botânico da Universidade de Coimbra, António Gouveia, que recebeu a Fugas ao portão. É por esta altura que mais se notam os visitantes, que são cerca de 180 mil por ano.

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Mas se é pelo Portão dos Arcos que mais pessoas descobrem o jardim (muito por conta da proximidade à universidade) a entrada principal foi desenhada noutro ponto. A estátua do primeiro director português do espaço, Avelar Brotero, esculpida por Soares dos Reis, recebe quem passa o Portão Principal, virado para Este.

Brotero, “que transformou o jardim numa espécie de campo de plantas portuguesas” e que mais tarde viria a dirigir o Botânico da Ajuda, explica o director, sucedeu a Domingos Vandelli, o primeiro responsável pelo espaço. Nisto da contabilização dos anos, o JBUC tem apontado 1772 como o ano de nascimento, uma vez que o documento fundador marca essa data. Mas do papel à prática terá levado mais dois anos. Será de 1774 “o primeiro sinal de um jardim com plantas”.

E essa primeira configuração pouco terá a ver com o que ali hoje se vê. O Botânico nasceu num terreno que antes fazia parte da cerca dos Beneditinos, num vale “que não tinha quase substrato”, aponta António Gouveia. Ao longo do século XIX, “foi ganhando a forma que tem hoje”, sendo organizado por patamares e escadarias. É ainda na parte superior que encontramos as árvores centenárias e de grande porte, algumas com 150 anos. Levantando os olhos, podemos observar as copas de sete espécies de araucária, ou de 30 espécies de eucaliptos, que fazem parte “de um momento histórico que mostra o interesse por espécies exóticas”.

Mas não é por o Botânico ser um espaço atractivo para o turista que deixa de ter uma componente académica. Enquanto descemos para a Alameda das Tílias, um espaço cénico com uma zona de lazer de mesas e bancos ao lado, o director refere que se mantém o interesse para estudo: desde canteiros com plantas de propriedades medicinais a projectos de conservação da flora nativa portuguesa. No JBUC são leccionadas cerca de 20 disciplinas de cursos diferentes, menciona, desde farmácia a arquitectura.

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Descendo novo patamar encontra-se o Quadrado Central que, apesar do aspecto neoclássico, com os portões em ferro forjado e canteiros geométricos, teve a última remodelação já durante o Estado Novo. Os mesmos responsáveis pelo risco da Alta Universitária desenharam para ali uma fonte monumental em pedra, que ocupa o centro do polígono, bem como os bancos de cantaria. As magnólias e o bordo do Japão também se fazem notar.

Este não é o único sinal de uma intervenção no botânico durante essa época. Descendo um novo patamar, encontra-se a Estufa Fria, de dimensões e materiais mais modestos que o edifício de ferro e vidro que tínhamos observado mais acima. A estrutura de betão e madeira oferece sombra e ameniza as temperaturas de Coimbra.

Percorrer o botânico de Coimbra é explorar uma encosta da cidade. Até há pouco tempo, as únicas possibilidades de acesso estavam na parte superior, através de uma das três entradas. No Verão de 2017, foi inaugurada a ligação à Baixa da cidade, que significou a abertura da mata (que ocupa nove dos 13 hectares do complexo) ao público. Essa operação deixou à vista elementos arquitectónicos do tempo dos Beneditinos, como a fonte dos três bicos e a capela.

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A restante área do bambuzal abriu ao público já este ano. As canas de crescimento rápido começaram a ser plantadas no fim do século XIX, “criando estas catedrais”, descreve o responsável, numa alusão aos arcos ogivais formados pelo bambu inclinado que serve de tecto ao piso empedrado.

Mas se os caminhos íngremes podem desencorajar a subida, há uma linha de autocarros eléctricos do município que ajudam a combater a gravidade.

A entrada no Botânico é gratuita, mas espaços como a Estufa Grande estão fechados, apenas abrindo para visitas guiadas. Quem quiser visitar o JBUC de forma mais informada tem que fazer marcação prévia junto do turismo da universidade. Ainda este ano deve ser lançada uma alternativa: uma aplicação móvel que pode servir como guia. O director refere que as visitas guiadas seguem um percurso tipo, mas que este é maleável aos interesses do grupo.

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