Levantar os tomates

Temos sempre de ter cuidado com as coisas que gostamos. “Each man kills the thing he loves,/Yet each man does not die” escreveu Oscar Wilde, com toda a razão.

Fomos almoçar salada-russa de gambas a uma cervejaria que cá sabemos. Pedimos meio quilo de gambas do Algarve, acabadinhas de cozer, e dois pratinhos de salada-russa, daquela que se fazia em casa com todos os vegetais imagináveis.

Depois descascamos as gambas, atirando uma ou duas para a boca para manter o entusiasmo. Por fim incorporamos as gambinhas na salada-russa, acrescentando uma colher da excelente maionaise caseira.

Dá trabalho, mas fica-se com uma salada-russa como deve ser, com o marisco abundante e saboroso.

Claro que a salada fica muito maior e, quando acabámos, vimos que sobravam muitas gambas e muita salada-russa. Havia duas grandes fatias de tomate que julgáramos puramente decorativas. Mas quando a Maria João as levantou, descobriu ainda mais salada-russa.

Deu para fazer outra salada de gambas. Caímos na asneira de pedir mais um pratinho de salada-russa para ser o nosso jantar. Quando chegou a altura de servir, a Maria João acrescentou uma lata de atum e outra de milho. Jantámos bem — mas sobrou muita salada. No dia seguinte lá tivemos de jantar salada-russa outra vez para acabar com o raio do tabuleiro. O que tinha começado como uma esperteza saloia tinha-se transformado num calvário.

Se passarem cinco anos sem eu avistar outra salada-russa, por muito boa que seja, duvido muito que cheguem para me passar o enjoo.

Temos sempre de ter cuidado com as coisas de que gostamos. “Each man kills the thing he loves,/Yet each man does not die”, escreveu Oscar Wilde, com toda a razão.

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