Relação enterra queixa-crime de autarca de Gaia contra fundador do Clube dos Pensadores

Tribunal confirma decisão da primeira instância que decidira não levar a julgamento Joaquim Jorge, acusado pelo Ministério Público de quatro crimes contra a honra.

Foto
Joana Goncalves

O Tribunal da Relação do Porto enterrou de vez a queixa-crime apresentada pelo presidente da Câmara Municipal de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues, contra o fundador do Clube dos Pensadores, o biólogo Joaquim Jorge, conhecido por organizar debates com personalidades da vida portuguesa.

Em causa estavam dois textos publicados na Internet em Setembro e Novembro de 2015, onde Joaquim Jorge denunciava a existência de “pressões” para que os seus artigos de opinião deixassem de ser publicados no jornal Audiência, sem nunca referir o nome de Eduardo Vítor Rodrigues. ”Não me pediram, mas vou dar um conselho a quem conduz os destinos de Gaia. Façam o vosso trabalho e deixem-me em paz”, escreveu Joaquim Jorge.

Mais tarde, num artigo intitulado Liberdade de Expressão em Gaia, o biólogo chamava a atenção para as declarações do director do jornal Audiência num programa de rádio onde este afirmara ter recebido pressões para que Joaquim Jorge fosse “banido de escrever”. Nesse texto, dá ainda conta que o jornal O Gaiense deixara de publicar notícias do Clube dos Pensadores. “Talvez para agradar a quem faz publicidade institucional e lhe dá um subsídio”, escrevia. E acrescentava: “No séc. XXI é inqualificável ainda haver lápis azul dissimulado”.

Num acórdão datado de 9 de Maio e agora conhecido, a Relação do Porto confirma a decisão do Tribunal de Instrução Criminal do Porto que recusara levar a julgamento o fundador do Clube dos Pensadores, que o Ministério Público acusara de quatro crimes: dois de publicidade e calúnia agravada e dois crimes de ofensa a pessoa colectiva. O recurso para a Relação tinha sido apresentado pelo autarca de Gaia e pelo próprio Ministério Público.

Notando que os ilícitos em causa se inserem no capítulo dos crimes contra a honra, dois juízes da 2.ª Secção Criminal da Relação do Porto lembram que os tribunais têm entendido que a tutela penal destes casos só abrange condutas que revelam uma “danosidade social intolerável”, o que excluiu afirmações “desrespeitosas ou falhas de educação”. Voltando a rever as declarações de Joaquim Jorge, os desembargadores só encontram uma “única referência” ao presidente da Câmara de Gaia, quando o biólogo pede que o deixem em paz. “Não se vê nessas referências nada que ultrapasse a danosidade social”, consideram os juízes da Relação, que realçam que essas afirmações não imputam ao autarca “qualquer facto ou juízo objectivamente ofensivo da sua honra e consideração”.  

Joaquim Jorge reagiu à decisão, considerando-a uma “boa noticia para quem perfilha a verdadeira liberdade de expressão”. O biólogo lamenta que “tenha sido gasto dinheiro dos contribuintes em todo este processo”, verbas que poderiam ter sido usadas “em algo mais importante e necessário”. E estranha que ao longo deste processo nenhum partido da oposição em Gaia “tenha tomado uma posição em defesa da liberdade de expressão”.

Contactado pelo PÚBLICO, a Câmara Municipal de Gaia ainda não quis reagir à decisão do Tribunal da Relação do Porto.

Sugerir correcção
Comentar