Há cada vez mais democracias a atacarem a liberdade de imprensa

O 25º Dia Internacional da Liberdade de Imprensa assinala-se nesta quinta-feira e numa altura em que esta está cada vez mais ameaça por todo o mundo.

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Reuters/THOMAS PETER

Em 2018, o declínio da imprensa livre a nível global aumentou relativamente ao ano passado e o mapa mundo está cada vez mais negro no que toca ao respeito pelo trabalho dos media. E este deterioramento é registado cada vez mais em democracias e não apenas nos regimes autoritários. 

A morte de dez jornalistas no Afeganistão na segunda-feira, em dois atentados suicidas em Cabul e um tiroteio na província de Khost, trouxe novamente para o centro da discussão a segurança e a defesa do trabalho jornalístico pelo mundo. Estas mortes vieram juntar-se a outras que se registaram já este ano e que estão directamente ligadas ao trabalho realizado pelos jornalistas.

Nesta quinta-feira celebra-se pela 25ª vez o Dia Internacional da Liberdade de Imprensa. E a data é assinalada numa altura em que “mais e mais líderes democraticamente eleitos não vêm mais os media como parte essencial da democracia, mas como um adversário contra o qual demonstram abertamente a sua aversão”, lê-se nas conclusões do index anual elaborado pela organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF), divulgado no dia 25 de Abril.

“A libertação de ódio contra os jornalistas é uma das piores ameaças às democracias”, diz Christophe Deloire, secretário-geral da RSF. “Os líderes políticos que alimentam a aversão aos jornalistas têm grande responsabilidade porque prejudicam o conceito de debate público baseado em factos em vez de propaganda. Contestar a legitimidade do jornalismo actualmente é brincar com fogo político extremamente perigoso”.

Neste relatório anual são analisados 180 países que são depois classificados de acordo com critérios como pluralismo, independência dos media, transparência, abusos ou violência contra jornalistas.

A Noruega lidera pelo segundo ano consecutivo este ranking, sendo por isso o país mais seguro para os jornalistas. Em segundo está a Suécia e a fechar o pódio a Holanda. No último lugar, tal como aconteceu em 2017, surge a Coreia do Norte abaixo da Eritreia e Turquemenistão.

Portugal está colocado na 14ª posição atrás da Islândia e à frente da Alemanha.

A Europa foi ao longo dos últimos anos a região com melhor pontuação relativamente ao respeito pela liberdade de imprensa, o que acontece novamente este ano. No entanto, a RSF destaca que foi também quem tem tido o maior declínio. Quatro dos cinco países que sofreram o maior declínio em 2018 são europeus: Malta, República Checa, Sérvia e Eslováquia.

Isto leva a concluir que “os jornalistas são assassinados na Europa também”. E a sustentar esta afirmação estão o homicídio da jornalista Daphne Caruana Galizia em Malta e de um jornalista de investigação de 27 anos na Eslováquia.

O relatório dá também exemplos de discursos políticos contra jornalistas na Europa. Um deles é o primeiro-ministro eslovaco, Robert Fico, que os chamou de “prostitutas anti-Eslováquia nojentos” e “hienas idiotas”. Na República Checa, o Presidente Milos Zeman apareceu numa conferência de imprensa como uma Kalashnikov falsa com a palavra “jornalistas” escrita.

Para além dos insultos dos políticos, o índex chama a atenção para outras ameaças ao trabalho jornalístico na Europa. Nomeadamente a exposição a organizações criminosas a operar no continente, e que têm muitas vezes como alvo jornalistas, ou aprovação de legislação que limita o trabalho dos media: neste campo um dos exemplos dados é o do Reino unido, onde o Governo de Theresa May tem tentado dificultar o trabalho jornalístico em nome da segurança nacional. Aliás, a RSF classifica o 40º lugar no ranking do Reino Unido como “desilusão”.

Mas, como disse Margaux Ewen, directora da RSF na América do Norte, durante a apresentação do relatório nos Estados Unidos, “estar em primeiro na lista não quer dizer que se é perfeito”. 

Outro dos países que tiveram um resultado insatisfatório foi os precisamente os EUA, que desceu dois lugares para o 45º. Aqui dá-se o exemplo de Donald Trump, quando se referiu aos jornalistas como “inimigos do povo”, um termo utilizado pelo líder soviético Estaline. Há duas semanas, o Presidente norte-americano sugeriu também prender jornalistas para descobrir a origens de fugas de informação.

Em termos gerais, e no mapa apresentado pela RSF, nota-se o declínio do respeito pela liberdade de imprensa. Classificando-se os países por cores, os pintados a branco são aqueles com uma pontuação “boa”, os de laranja “problemática”, vermelho “má” e preto “muito má”. E são cada vez mais as nações pintadas a negro: em 2017 foram 19 e este ano o número subiu para 21.

Mas quem continua a liderar o declínio da liberdade de imprensa são os antigos países soviéticos e a Turquia – onde o Presidente Recep Erdogan ordenou uma autêntica purga, depois da tentativa falhada de golpe de Estado em 2016, que levou à detenção de dezenas de jornalistas e condenação de vários. Quase dois terços destes países estão abaixo do 150.º lugar.

A região que alberga o Médio Oriente e o Norte de África foi a que registou a maior deterioração de um ano para o outro. Esta situação explica-se pela “guerras contínuas na Síria e Iémen” ou as acusações de terrorismo contra jornalistas no Egipto, Arábia Saudita e Bahrein.

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