Inquilinos a favor, proprietários com muitas dúvidas

Associação Lisbonense de Proprietários acusa governo de fazer “meros exercícios teóricos” e diz que lei não vai funcionar. Inquilinos receberam “positivamente” algumas medidas

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Governo apresentou ontem as linhas gerais de uma nova política para a habitação Joana Goncalves

Se o sucesso das medidas anunciadas pelo Governo pudesse ser aferida pela reacção que elas mereceram poder-se-ia dizer que apenas os inquilinos lhe reconhecem algum mérito. Os proprietários, que falam com vozes nem sempre concertadas, manifestam muitas mais dúvidas quanto ao sucesso destas medidas.

Romão Lavadinho, Presidente da Associação dos Inquilinos Lisbonenses, recebeu “positivamente” algumas medidas, nomeadamente o facto de as propostas apresentadas “fazerem o reequilíbrio” entre direitos dos inquilinos e dos proprietários. A redução dos impostos sobre os rendimentos para quem pratique contratos de arrendamento de 10 ou 20 anos (descendo de 28% para 14% e 10%, respectivamente) foi recebida com entusiasmo: “Mas para rendas especulativas esta redução não faz sentido, deve mesmo ser penalizado; só faz sentido para rendas acessíveis”, diz.

Já António Frias Marques, Presidente da Associação Nacional de Proprietários, sublinha que “o problema da falta de casas para arrendamento” é um “problema de Lisboa”: “No resto do país sobram casas”, refere. E sugere: “A maneira de se conseguirem rendas mais baratas é a contratação pública. Em Portugal só 2% da habitação é pública, na Suécia são 25%. Temos mesmo que ter habitação pública.”

Da parte dos proprietários “o Governo pode esperar cooperação”, referiu. “Mas as promessas foram tantas e tão boas, nomeadamente que até 2024 vai haver casas para todos e com rendas acessíveis, que vamos esperar para ver”.

Frias Marques refere que “em termos gerais não faz sentido que um proprietário tenha que pagar 28% de impostos”. E que a questão de privilegiar quem faz contratos mais longos parte de uma premissa errada: “Tomara nós, proprietários, que o arrendatário ficasse lá cinco anos.”

Romão Lavadinho e Frias Marques estiveram presentes no evento onde as medidas foram anunciadas. Já Luis Menezes Leitão, presidente da Associação Lisbonense de Proprietários (ALP), estava ausente do país, mas dedicou-lhes “toda a atenção possível”. No final do evento, e assimilados os ecos que lhe chegaram dos anúncios, estes foram reduzidos a “um mero exercício teórico”. “Temos pena, mas nenhuma destas medidas vai funcionar”, apressa-se a desmontar.

Menezes Leitão referia-se, sobretudo, ao anúncio de baixar a taxa liberatória cobrada aos proprietários que acedessem fazer contratos de arrendamento de longa duração: “Mas quem é que quer fazer contratos a 10 e a 20 anos na actual conjuntura? Os proprietários privados não o vão querer de certeza. E mesmo os proprietários institucionais terão dificuldade em faze-lo”, vaticinou. Menezes Leitão recorda que há contratos que não podem ser denunciados, como aqueles que foram feitos a inquilinos com mais de 65 anos ou com incapacidades superiores a 65%. O governo manteve a vigência do direito à renovação destes contratos, transformando-os em vitalícios.

O presidente da ALP diz, ainda, que também não será a anunciada isenção de taxa liberatória que vai convencer os proprietários a colocar os seus imóveis no chamado arrendamento acessível – e que é um programa de adesão voluntaria, feita pelos proprietários que aceitem cobrar rendas com um valor abaixo da renda de mercado em cerca de 20%, e que tenham duração de pelo menos três anos.

 “Estamos a falar de uma taxa de 28%, que deixa de pagar o proprietário que fizer um desconto de 20% nas rendas. O problema é que o INE está a apurar medianas, e estas já estão abaixo do real valor de mercado em cerca de 10%. Contas feitas, os proprietários não poupam nada, não têm ganho nenhum. Não vai funcionar”, limitou-se a descrever.

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