Bruxelas multa Altice em 125 milhões por controlar a PT antes de ter autorização

Ao começar a influenciar a gestão da empresa antes da autorização de Bruxelas, a multinacional violou as regras comunitárias. A Altice diz que vai recorrer da decisão da Comissão Europeia.

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A empresa vai recorrer da decisão de Bruxelas Ricardo Lopes

Com mão pesada, a Comissão Europeia castigou a empresa liderada por Patrick Drahi por ter dado como provado que a Altice queimou etapas na compra da PT Portugal, em 2015. Os serviços liderados por Margrethe Vestager, a comissária europeia com a pasta da Concorrência, aplicaram uma multa de 124,5 milhões à empresa, de que esta já garantiu que vai recorrer.

Bruxelas deu como provada a suspeita, que levou à abertura da investigação anunciada em Maio de 2017, de que a Altice começou a exercer o seu poder sobre a PT Portugal antes de a compra da empresa à brasileira Oi ter sido formalmente autorizada pela Comissão.

“A multa aplicada esta terça-feira à Altice reflecte a gravidade da infracção e pretende dissuadir outras empresas de violarem as leis europeias de controlo de fusões”, afirmou Vestager, citada em comunicado. Considerando que a Altice estava perfeitamente consciente das regras e das obrigações, a Comissão diz que a empresa de Drahi “foi, no mínimo, negligente”. A aplicação de uma coima de 124,5 milhões “é proporcional e dissuasora”, referiu a Comissão.

Com a aplicação desta coima – decisão da qual a Altice “discorda profundamente” – a Comissão dá por provado que “certas disposições do acordo de compra” com a Oi garantiram à Altice o "direito legal de exercer uma influência decisiva sobre a PT Portugal", nomeadamente atribuindo-lhe "direitos de voto sobre decisões relativas às actividades regulares" da empresa.

Noutros casos, a "Altice exerceu de facto uma influência decisiva sobre aspectos da actividade da PT Portugal". Em particular, a empresa de Patrick Drahi e Armando Pereira deu "instruções à PT Portugal sobre a orientação de uma campanha de marketing". Procurou ainda obter e receber "informações comerciais detalhadas confidenciais sobre a PT Portugal, fora do quadro de qualquer acordo de confidencialidade".

Já a Altice contrapôs (no comunicado) que os termos de transacção lhe garantiam “direito de consulta em certas matérias excepcionais”, mas que tudo isto estava dentro do legalmente permitido.

Não só as operações de fusão têm obrigatoriamente de ser notificadas a Bruxelas quando o volume de negócios das empresas envolvidas dá a estas transacções dimensão comunitária, como as partes envolvidas são obrigadas a congelar qualquer tipo de interacção enquanto estas são analisadas. Este lapso temporal visa evitar potenciais efeitos negativos no funcionamento do mercado, antes da análise pelos peritos da concorrência.

A Altice notificou a operação em Fevereiro de 2015 e recebeu luz verde em Abril, com a condição de se desfazer da Oni e da Cabovisão. Mas, quase dois anos depois, Bruxelas tornou públicas as suspeitas de que nem todos os procedimentos foram devidamente acautelados e que alguma infracções teriam ocorrido mesmo antes da notificação da operação.

Na ocasião, Armando Pereira, o sócio português de Patrick Drahi, que chegou a ser presidente da PT, desvalorizou a investigação e o eventual montante da coima (este tipo de infracção prevê uma penalização de até10% do volume de negócios das empresas, que no caso da Altice atingiu 23.400 milhões de euros em 2017). A suposta violação das regras europeias "tem apenas a ver com um email" trocado com um director da PT, disse então o português, em Vieira do Minho, à margem da inauguração de uma exposição da Fundação Portugal Telecom.

"Já estávamos a trabalhar com eles, é normal que haja contactos, é sempre assim", disse Armando Pereira, citado pela Lusa. Houve um email enviado a um dos directores da PT, dando conta que, a partir daquele momento, iria fazer "certas coisas", para "ganhar tempo", admitiu ainda.

"As empresas que se adiantam e implementam as fusões antes de notificarem a operação ou de obterem autorização para tal põem em causa a eficácia do nosso sistema de controlo de fusões", adiantou a comissária, frisando que é esse mesmo sistema que protege os consumidores europeus de operações que podem provocar subidas de preços ou reduzir as suas possibilidades de escolha.

Em 2016, também o regulador francês da concorrência condenou a empresa ao pagamento de uma coima de 80 milhões de euros por infracções semelhantes no caso da fusão entre a Numericable e a SFR, mas na nota divulgada nesta terça-feira, a Altice destaca que os dois casos em nada têm a ver. A empresa não recorreu dessa decisão.

Assegurando que cumpriu todas as regras comunitárias dos processos de fusão e aquisição, a Altice também frisa que os elementos apresentados pela Comissão Europeia não demonstram que tenha havido qualquer exercício de influência, ou seja, de poder exercido sobre a PT Portugal, nem antes da notificação, nem antes da autorização oficial.

A empresa argumenta ainda que os seus direitos processuais foram “violados em vários aspectos na investigação conduzida pela Comissão”.

Dizendo-se convencida que o seu recurso aos tribunais fará com que a decisão de Buxelas seja “anulada” ou que a multa seja “significativamente reduzida”, a Altice sublinha ainda que a decisão divulgada nesta terça-feira em nada afecta a autorização à operação de aquisição da PT Portugal, concedida há três anos.

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