Casa Branca fecha as portas ao Presidente polaco

Memorando do Departamento de Estado ameaça cortar financiamento de "projectos militares" se a Polónia não reformular a chamada "lei do Holocausto".

Foto
O Presidente polaco, Andrzej Duda, é um dos alvos Kacper Pempel/Reuters

Os Estados Unidos suspenderam quaisquer reuniões "ao mais alto nível" com a Polónia enquanto o país não reformular a lei que criminaliza a sugestão de que os polacos foram cúmplices do Holocausto nazi. Num memorando enviado ao Governo polaco, o Departamento de Estado norte-americano diz que a lei viola a liberdade de expressão e pode motivar uma resposta "drástica" se algum cidadão norte-americano vier a ser acusado.

Em causa está a chamada "lei do Holocausto", aprovada pelo Senado polaco no dia 31 de Janeiro e promulgada pelo Presidente Andrzej Duda seis dias depois. De acordo com a lei, qualquer pessoa (na Polónia ou no estrangeiro) pode ser condenada a três anos de prisão se acusar o povo polaco ou a nação polaca de responsabilidade ou cumplicidade nos crimes do Holocausto cometidos quando o país estava sob ocupação da Alemanha nazi.

Varsóvia diz que pretende evitar um erro comum (a menção a "campos polacos"), que sente ser uma dupla injustiça, já que a Polónia foi dos países que mais sofreu durante a ocupação nazi (são o grupo com mais mortos logo a seguir aos judeus); manteve um governo no exílio resistindo à ocupação; e é o país que tem mais cidadãos distinguidos pelo centro Yad Vashem como "justos entre as nações".

No seguimento desta crise nas relações entre os EUA e a Polónia, vários jornais polacos noticiam que o Governo do país recebeu um aviso do Departamento de Estado norte-americano por causa da aprovação da lei.

Segundo o portal polaco Onet.pl, citado pelo site norte-americano Politico, o aviso do Departamento de Estado norte-americano foi feito ao Ministério dos Negócios Estrangeiros da Polónia, que "não passou a informação" ao Ministério da Justiça (responsável pela elaboração da proposta de lei). Essa nota dos EUA só terá chegado ao conhecimento do Ministério da Justiça quatro dias depois da aprovação pela câmara baixa do Parlamento polaco, o Sejm.

Para além disso, o site polaco WP diz que o Presidente Andrzej Duda se recusou a aceitar um telefonema do secretário de Estado norte-americano, Rex Tillerson, pouco antes de Duda ter promulgado a lei – segundo o WP, Duda não quis falar com Tillerson porque o secretário de Estado norte-americano "deveria falar com um responsável abaixo do Presidente".

Uma decisão e dois avisos

Em primeiro lugar, os EUA dizem no memorando que "não haverá nenhum contacto bilateral ao mais alto nível entre os países até que a crise seja solucionada" – como os encontros ao mais alto nível referem-se a encontros entre os responsáveis máximos dos países, depreende-se que não haverá encontros entre os Presidentes Donald Trump e Andrzej Duda.

Se as autoridades polacas não alterarem a lei, o Congresso norte-americano poderá "bloquear o financiamento de projectos militares na Polónia". E se algum cidadão norte-americano for acusado ao abrigo desta lei, "as consequências para a Polónia serão dramáticas".

Primeira acusação

A primeira acusação ao abrigo desta lei surgiu na passada sexta-feira, feita pelo grupo conservador polaco Liga contra a Difamação (RDI).

O alvo é o site do jornal argentino Página 12, por causa da fotografia que acompanhou um texto sobre o massacre de judeus em Jedwabne, em Julho de 1941 – para ilustrar esse artigo, onde se fala do episódio em que centenas de judeus foram fechados num celeiro, que depois foi incendiado por cidadãos polacos supervisionados por soldados nazis, o jornal Página 12 usou uma fotografia de combatentes polacos que lutaram contra o regime instalado pela União Soviética.

Segundo a Liga contra a Difamação, o jornal argentino "manipulou" a fotografia e o texto para ligar o pogrom aos combatentes anti-comunistas, uma acção que atenta "contra a nação polaca e a reputação dos soldados polacos" com o objectivo de "dar credibilidade à tese do anti-semitismo da Polónia aos seus leitores", diz a queixa da RDI.

Sugerir correcção
Ler 9 comentários