A táctica de choque frontal

A marcação de terreno político da oposição interna a Rio fez-se sentir desde o primeiro momento.

A uma semana de ser investido pelo congresso como presidente do PSD, Rui Rio tem mantido um absoluto silêncio sobre as suas intenções para a liderança do partido, quer a nível programático, quer a nível da equipa directiva a propor à eleição pelos delegados que vão reunir-se na antiga FIL em Lisboa. Um silêncio que não é fácil na época da comunicação digital e que pode ser um indício sobre a política de comunicação da nova direcção do PSD, mas que é uma surpresa e uma prova de resistência, tanto mais que entre as directas de 13 de Janeiro até ao conclave de 16, 17 e 18 de Fevereiro dista mais de um mês. Já agora, de quem terá sido a ideia peregrina de estabelecer um período tão dilatado para organizar um congresso de consagração de um líder eleito em directas?

Rio tem mantido o país em suspenso à espera do congresso. Uma espera que vai desde os militantes do PSD aos eleitores em geral e que passa mesmo pelo próprio Governo de António Costa, que aguarda que haja direcção no PSD para negociar dossiers como a descentralização e o Portugal 2030. Mas nem todo o PSD consegue ou quer respeitar a atitude do novo líder. A marcação de terreno político da oposição interna fez-se sentir desde o primeiro momento. Iniciou-se mesmo antes das directas.

O tiro de partida foi dado por aquele que é conhecido como “fazedor de líderes”, pois esteve directamente ligado à conquista do poder por dois presidentes do PSD que foram primeiros-ministros, Durão Barroso e Passos Coelho. Miguel Relvas, em entrevista ao PÚBLICO,  afirmou: “Vamos ter um líder para dois anos, se ganhar as eleições continua, se não ganhar será posto em causa.”

Eleito Rio, seguiu-se a novela sobre a liderança parlamentar. Contra qualquer princípio do mais elementar bom senso, Hugo Soares insistiu na sua vontade de permanecer à frente da bancada. Calou-se depois de se reunir com Rio e este emitir um comunicado mortal para as suas ambições. Mas de facto o gesto de Hugo Soares mais não foi do que uma marcação de terreno, até porque ele sabe — até um recém-inscrito na JSD sabe — que se Rio cedesse nesta sua exigência, estaria a atirar a toalha ao chão na sua afirmação como líder que pretende lutar pelo poder governativo.

Em apoio de Hugo Soares saiu de imediato o ex-líder parlamentar Luís Montenegro, um dos putativos candidatos a líder. Montenegro não só considerou legítimo o direito de Hugo Soares permanecer à frente do grupo parlamentar — como se o próprio Montenegro não soubesse que ocupou o cargo, que é partidário, porque tinha absoluta confiança do então líder Passos Coelho —, como fez questão de reafirmar a meta estabelecida a Rio: tinha de ganhar as legislativas. Um prazo de validade que foi, logo na noite de dia 13 na TVI, assumido por Carlos Carreiras, presidente da Câmara de Cascais.

Eis se não quando surge, esta semana, a divulgação de uma carta dirigida a Rio por Miguel Pinto Luz, o vice-presidente da Câmara de Cascais, que liderou a distrital de Lisboa do PSD durante anos, tendo-se notabilizou pela erosão eleitoral do partido na Área Metropolitana de Lisboa, onde detém apenas duas câmaras (Cascais e Mafra) — para além da perda de freguesias, como aconteceu em Lisboa. Miguel Pinto Luz, que tem também pretensões a ser putativo candidato à liderança do PSD, tendo já sido apontado por Miguel Relvas como hipótese, repete a exigência de vitória nas legislativas e defende que Rio não entre em acordos com o Governo nem viabilize Orçamentos do Estado.

A aberta luta interna pelo poder é um acto não só legítimo mas também saudável nos partidos democráticos, mas será minimamente inteligente o barulho que tem sido feito pela oposição a Rio? Será que acreditam, de facto, que vão ganhar alguma influência na futura direcção? Ou, pelo contrário, como sabem que não a terão, entraram numa táctica de choque frontal, de provocação pública, para precisamente se afirmarem internamente para o futuro? Afinal, Miguel Relvas já tinha essa prática quando desenhou a estratégia de ascensão interna de Passos Coelho contra a líder de então, Manuela Ferreira Leite.

Correcção às 11h26 de 11/02/18: Miguel Pinto Luz estava incorrectamente identificado como Miguel Pinto Leite.

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