Comissão de Ambiente alerta Governo para não repetir no rio Ave os erros do Tejo

Foram detectadas em 2016 no rio Ave quatro estirpes de bactérias resistentes a antibióticos usados em hospitais para tratamento de infecções graves.

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Pedro Soares teme que aconteça no rio Ave (na foto) uma situação similar à que se tem visto no rio Tejo Rita Franca

O presidente da Comissão de Ambiente no Parlamento alertou nesta quarta-feira o Governo a não repetir erros cometidos com o rio Tejo no caso das bactérias multirresistentes do rio Ave, para não ter de "correr atrás" do prejuízo.

"Já devíamos ter aprendido com aquilo que se está a passar no rio Tejo. Não é andar atrás do prejuízo, é ter uma atitude preventiva e, se de facto há estudos científicos que demonstram que há bactérias multirresistentes, que resistem aos antibióticos de última linha, mais fortes do que aquilo não há. Portanto, se eles entram no consumo humano, na alimentação ou se têm contacto com a população, por qualquer motivo, é de facto um problema complicadíssimo", declarou à Lusa o deputado Pedro Soares.

Foram detectadas em 2016 no rio Ave quatro estirpes de bactérias resistentes a antibióticos usados em hospitais para tratamento de infecções graves e, na altura, o ministro do Ambiente garantia que estava a acompanhar a situação, para investigar as origens, frisando que não havia motivos para alarmismos. A recolha de amostras de água foi feita em seis pontos do rio Ave, desde a nascente até um troço abaixo de Santo Tirso.

As estirpes eram resistentes a todos os 20 antimicrobianos testados, incluindo um antibiótico de última linha que se usa com muita contenção e apenas quando o tratamento com outros antibióticos de primeira e segunda linha não seja eficaz, disse na altura à Lusa Paulo Martins Costa, professor no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, que participou na investigação científica sobre as bactérias.

"Esta atitude de deixar que as coisas corram e cheguem a momentos de crise e só depois é que se intervém foi o que se passou no Tejo e gostava que não fosse isso que se passasse no rio Ave", avisou o presidente da Comissão do Ambiente e deputado do Bloco de Esquerda (BE).

Negligência do Governo

O presidente da Comissão do Ambiente lamentou que só depois de haver uma situação de crise com grande visibilidade pública é que o Governo intervenha, como ocorreu no caso do rio Tejo. "Em relação ao problema do rio Ave, há uma situação que nos preocupa que é em vez de haver uma atitude preventiva e de precaução (...), parece que se está a deixar que a coisa corra e, se um dia houver uma crise de poluição grave no rio Ave, nomeadamente relacionada com um problema muito grave que é o das bactérias multirresistentes, possivelmente haverá uma intervenção urgente".

No dia 23 de Janeiro, a Águas do Norte adiantou que estava em "fase de adjudicação" um estudo ao rio Ave sobre a eventual existência de bactérias multirresistentes e teria um prazo de 12 meses de execução. O deputado Pedro Soares classificou de "incompreensível" que passados quase dois anos o estudo ainda não esteja em marcha.

"O compromisso que houve na audição da Comissão Parlamentar era de que o estudo estaria concluído ao fim de dois anos [meados de 2018]. Ao fim de [quase] dois anos, ele nem sequer foi iniciado. E isso é um problema" disse.

O deputado bloquista acrescentou que o estudo anunciado e em fase de adjudicação é "pouco exigente", porque "se fica pelas ETARs (Estações de Tratamento de Águas Residuais), quando devia abordar as origens", designadamente unidades hospitalares, explorações pecuárias de maior dimensão, aterros sanitários e locais de tratamento das águas de lixiviação e indústrias produtoras de efluentes.

"Quase dois anos para dar início a um estudo urgente parece-me um exagero. A que se deve este atraso?", questionou o deputado, considerando "estranho" que no troço do rio Ave identificado no estudo científico, em que há uma rápida degradação da qualidade da água, a emergência de bactéria multirresistentes e o aparecimento de bactérias resistente "não faça parte dos pontos de amostragem".

Pedro Soares defende que a prioridade deva ser "identificar as fontes emissoras de bactérias e, eventualmente, de antibióticos ou outros compostos que estimulem a emergência e disseminação de resistências".

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