Marcelino Sambé, o bailarino português que a Forbes tem debaixo de olho

Aos 23 anos, Marcelino Sambé é primeiro solista da companhia britânica Royal Ballet, em Londres, e foi distinguido pela revista “Forbes” na lista "30 under 30"

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Royal Opera House

É a dança — e o ballet em particular — que define a vida de Marcelino Sambé, mas as datas e os números não deixam de impressionar. Nasceu no Dia Mundial da Dança, que se celebra a 29 de Abril, há 23 anos. Com apenas 18 juntou-se à companhia britânica Royal Ballet, da Royal Opera House, com 15 já coleccionava prémios em Pequim, Moscovo, Berlim, Nova Iorque e Lausanne. Aos nove deu o primeiro passo em direcção a uma carreira de sucesso, ao ingressar na Escola de Dança do Conservatório Nacional — Lisboa. Agora, o primeiro solista da companhia de Londres — cidade onde vive — foi distinguido pela revista norte-americana Forbes, que o incluiu na lista dos “30 jovens mais brilhantes, inovadores e influentes da Europa”, na categoria Arte e Cultura. 

Quando soube da nomeação da Forbes, a 22 de Janeiro último, Marcelino Sambé lembrou-se imediatamente da música Billionaire, de Bruno Mars. Num dos versos do tema, o cantor norte-americano (que há dias arrecadou seis Grammys) expressa o desejo de aparecer “sorridente na capa da revista Forbes, ao lado da Oprah e da rainha [Isabel II]”. "Sempre achei que a Forbes fosse um pouco mais virada para o dinheiro e a economia", confessa o jovem em entrevista ao P3, admitindo ter ficado surpreendido pela nomeação. "Pode resultar em muitos contactos e eventos", refere o bailarino, que também já tinha sido considerado uma promessa a seguir pelo jornal britânico The Independent, em 2015.

Distinguido a par de mais três portugueseso líder da Juventude Popular, Francisco Rodrigues, e as empreendedoras e criadoras do Chic by Choice, Filipa Neto e Lara Vidreiro —, Marcelino gosta de dançar desde que tem memória: nas festas do bairro, juntava-se sempre ao círculo de dança. Esta expressão artística foi algo que sempre o fez feliz. Começou por experimentar danças africanas no Centro Comunitário do Alto da Loba, em Paço de Arcos, de onde é natural. E, por influência de uma psicóloga daquela instituição, decidiu apostar na carreira de bailarino. 

Apesar de todo o trabalho e dedicação que colocou na sua arte ao longo dos anos, considera que não fez muitos sacrifícios. "Dançar foi algo que sempre quis fazer", refere o bailarino. O “maior sacrifício”, admite, foi mesmo “perder contacto" com algumas pessoas de quem se foi afastando ao longo do tempo, conforme a carreira foi progredindo. Marcelino acredita ter “um dom desde nascença”, que “apenas se desenvolve com muito trabalho e dedicação”.

“A dança é sentimento, não é um desporto”

O pequeno resumo do seu percurso, escrito pela Forbes em forma de justificação para a recente nomeação, reflecte a intensidade do seu trabalho. O que o apaixona no bailado é a forte "característica interpretativa", capaz de transformar a mesma dança, interpretada por dois bailarinos, num produto artístico completamente diferente. “Os bailarinos são os atletas de Deus”, diz, citando Albert Einstein. O ballet exige dos bailarinos todas as capacidades atléticas, mas o que os diferencia é a "graciosidade" com que interpretam os seus papéis. "A dança é sentimento, não é um desporto", sublinha. “A técnica é muito importante”, mas o facto de o bailarino "sentir a música" e se “deixar guiar por ela" desempenha também um papel relevante.

Desde criança que Marcelino teve de abdicar de uma vida social mais activa, uma vez que os treinos e ensaios diários o obrigavam a ter um horário preenchido. "Agora, finalmente, tenho tido mais tempo para ter uma vida social", conta. Desde que atingiu o patamar de primeiro solista na companhia de ballet da capital britânica, consegue ter um pouco mais de tempo para se dedicar a outros interesses. "Adoro comer", revela, entre risos. "Vou bastante a restaurantes, experimentar todas as comidas.” Comprar plantas é um dos seus passatempos, razão pela qual a casa onde vive se assemelha a uma "selva urbana". "Sempre consegui ter um bom equilíbrio entre a vida pessoal e a minha carreira", garante Marcelino, para quem os desequilíbrios impedem as pessoas de alcançar o "potencial máximo". Mais difícil do que chegar até aqui é manter-se a esse nível: “apenas dez bailarinos por geração” chegam aonde ele chegou. E a ambição não fica por aqui. O próximo objectivo é tornar-se bailarino principal.

Os saltos e as piruetas vistosas que recolhem aplausos têm, por vezes, um grande impacto no corpo do bailarino. Em Agosto de 2017 teve a primeira lesão séria: o desgaste do osso da tíbia obrigou-o a parar durante cinco meses e a passar os seus papéis a outros profissionais. "Foi um inferno", recorda Marcelino, que desde a infância sonhava com os personagens que se viu obrigado a abandonar. 

Para já, está concentrado num novo espectáculo, com estreia marcada para Fevereiro na Royal Opera House. Em Giselle, uma produção de Peter Wright do clássico de Marius Petipa, Marcelino fará par com Francesca Hayward, bailarina com quem já contracenou em La Fille Mal Gardée, de Frederick Ashton, e As Aventuras de Alice no País das Maravilhas, de Christopher Wheeldon. A longo prazo, confessa que gostaria de de fazer teatro. “Espero que voltemos a falar em breve”, brinca. “Por bons motivos.”

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