Governo apresenta Zero Carimbos no Portugal 2020

Medida insere-se no Simplex e pretende eliminar o excesso de trabalho administrativo. Consultores de investimento continuam a queixar-se dos atrasos na avaliação dos projectos

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Marco Duarte

Foi assim durante trinta anos. Cada vez que os promotores dos projectos apoiados por fundos da União Europeia precisavam de apresentar uma despesa para pedir o respectivo reembolso, tinham de passar por um circuito administrativo que implicava a factura de despesa ser carimbada por um administrativo. Até poderia parecer um circuito rápido. Não fora o caso de o carimbo em causa obrigar ao preenchimento, à mão, de uma enorme quantidade de informação: código de operação/projecto, rubrica de investimento, valor imputado, percentagem de imputação, número de lançamento contabilístico, número de conta, etc. Este procedimento administrativo era, assim,  tudo menos simples e o Governo entendeu que se estava a afectar os recursos humanos “a tarefas pouco produtivas”.

A partir de agora, e sem que seja necessária nenhuma portaria ou decreto de lei (porque, aparentemente, esta obrigatoriedade de carimbos não foi dessa forma enquadrada), passará a bastar que o promotor faça uma declaração em sede de pedidos de pagamento.

Para garantir que não há abusos, "porque não vamos facilitar que a aplicação de dinheiros públicos seja feita com rigor", como disse ao PÚBLICO o secretário de Estado do Desenvolvimento e Coesão, Nelson de Souza, a máquina do Portugal 2020 obriga-se a fazer um reforço das verificações regulares dos projectos. E será feito através de uma forma também ela aparentemente simples: "Bastará fazer o cruzamento de todas as facturas que temos vindo a recolher no formato digital e verificar se há alguma sobreposição", explicou o secretário de Estado.

A iniciativa “Zero Carimbos no Portugal 2020” é apresentada esta quinta-feira pelo Governo e está inserida no âmbito do programa Simplex e, para o secretário de Estado, reveste-se sobretudo de um cariz "simbólico" que representa uma ruptura com a máquina burocratizada.

O Governo tem noção de que o sistema é complexo, tem dezenas de milhar de entidades envolvidas (o número de entidades registadas nesta máquina administrativa excede os 66 mil) e o número de documentos que será preciso cruzar no âmbito das verificações de gestão já atinge os 1,5 milhões. "São as vantagens do processo de digitalização que traz ganhos imediatos com pequenos incrementos no processo e com custos marginais", argumenta Nelson de Souza.

Os promotores passarão a integrar uma base de dados única a todos os promotores, onde constará toda a informação existente no Instituto de Registo e Notariado, informação das dívidas fiscais e da segurança social, ou sobre situações de dívida que eventualmente existam no âmbito dos Fundos Europeus Estruturais e de Investimento (FEEI).

Da parte da máquina administrativa, os números são igualmente complexos: 15 autoridades de gestão relativas a cinco fundos - e só relativas aos Fundos da Coesão (FEDER, FC e FSE) estamos a falar de 130 organismos intermédios, quase 450 tipologias distintas, mas de 30 mil pedidos de pagamentos, e 1,5 milhões de documentos submetidos no âmbito das verificações de gestão.

É uma máquina pesada que pode ajudar a explicar por que é que continuam a existir uma derrapagem no cumprimento dos prazos previamente estabelecidos para a comunicação de resultados. O mais recente estudo efectuado pela Associação de Consultores de Investimento e Inovação de Portugal (ACONSULTIIP) encontrou desvios entre a data de decisão prevista e aquela em que ela ainda (não) foi comunicada.

As derrapagens de prazo chegam aos 245%. É o caso do aviso aberto em Lisboa em Janeiro de 2017 pelo POISE (Programa Operacional de Inclusão Social e Emprego) para "promover a sustentabilidade e a qualidade de emprego e apoiar a mobilidade dos trabalhadores": a data prevista para as decisões estava prevista para o dia 10 de Maio de 2017. Mas até agora ainda não foram conhecidas. Para já, estas medidas que vão ser anunciadas pelo Governo terão impacto sobretudo no processo de acompanhamento dos projectos e não tanto na fase de apreciação das candidaturas. 

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