Kuczynski obrigado a remodelar Governo após indulto a Fujimori

A polémica decisão levou milhares a protestar na rua e fez várias baixas no executivo e no aparelho de Estado.

Presidente do peru já deu posse ao novo ministro do Interior
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Presidente do peru já deu posse ao novo ministro do Interior Reuters/GUADALUPE PARDO
Familiares das vítimas do regime de Fujimori vão pedir anulação do indulto
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Familiares das vítimas do regime de Fujimori vão pedir anulação do indulto LUSA/Ernesto Arias
Apoiantes do antigo ditador mantém vigília à porta do hospital onde Fujimori está internado
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Apoiantes do antigo ditador mantém vigília à porta do hospital onde Fujimori está internado Reuters/MARIANA BAZO

O indulto assinado pelo Presidente do Peru, Pedro Pablo Kuczynski, que retirou o antigo ditador Alberto Fujimori da cadeia onde cumpria uma pena de 25 anos por abusos dos direitos humanos e corrupção, pode ter assegurado a sua sobrevivência no cargo a curto prazo – mas está a ameaçar a unidade do seu Governo e da sua (pequena) bancada parlamentar, que já perdeu três dos seus 18 deputados.

Uma remodelação governamental estará a ser pensada, à pressa, para recompor o executivo e preencher as vagas abertas após a a assinatura do polémico perdão presidencial a Fujimori, que segundo a imprensa peruana terá sido negociado por Kuczynski (conhecido pelas iniciais PPK) e o deputado Kenji Fujimori, filho mais novo do antigo ditador, para inviabilizar a destituição.

O conhecido actor e realizador Salvador del Solar, que era ministro da Cultura, foi o primeiro a pedir demissão, por discordar do perdão. O conselheiro presidencial Máximo San Román, que chegou a integrar o primeiro Governo de Fujimori, também se afastou do gabinete de Kuczynski no rescaldo da decisão. San Román fora um dos primeiros a denunciar Fujimori em 1992, na sequência do auto-golpe do então Presidente, que nos anos subsequentes lançou uma brutal campanha de repressão para eliminar a guerrilha maoista do Sendero Luminoso.

O director-geral do gabinete de direitos humanos do Ministério da Justiça, Roger Rodríguez, e o presidente executivo do Instituto de Rádio e Televisão do Peru, Hugo Coya, deixaram os postos, desagradados com o indulto a Fujimori. PPK já tinha perdido Carlos Basombrio, o ministro do Interior que decidiu não tornar públicas as razões da sua demissão – apresentada no mesmo dia em que o Parlamento votou a moção de destituição do Presidente.

Na rua prosseguem os protestos contra o perdão assinado por PPK. O caso poderá chegar brevemente a tribunal: os familiares das vítimas do chamado Grupo Colina, a unidade do Exército responsável por desaparecimentos e execuções extrajudiciais durante o mandato de Fujimori, estão a preparar uma acção a contestar a legalidade da decisão presidencial e a pedir a anulação do indulto.

O Presidente alegou “razões humanitárias” para validar o pedido de perdão apresentado pela família Fujimori. Os serviços da presidência explicaram que a decisão foi tomada após um parecer de uma junta médica independente ter concluído que as condições carcerárias não ofereciam garantias de tratamento para o quadro clínico de doença degenerativa progressiva do antigo ditador (que foi transferido da prisão para uma unidade de cuidados intensivos na véspera de Natal).

Mas a explicação não convence os críticos do Presidente – nem os seus próprios apoiantes, que acreditam que PPK cedeu à pressão dos Fujimori em troca da sua crucial abstenção no voto parlamentar que poderia resultar na sua destituição. Promovida pelo movimento Força Popular, criado por Fujimori, a moção defendia a vacância do cargo por “incapacidade moral” do Presidente, que é suspeito de envolvimento no mega-escândalo de corrupção Lava Jato, com origem no Brasil.

Esta quinta-feira, Kuczynski foi inquirido por magistrados da unidade anti-corrupção, numa audição que decorreu à porta fechada no palácio presidencial de Lima. Foi a segunda vez que o Presidente peruano prestou esclarecimentos aos investigadores sobre os pagamentos que foram feitos pela construtora brasileira Odebrecht – uma das peças do esquema de corrução da Lava Jato – a duas empresas de consultoria a que estava ligado.

Esses pagamentos, que totalizaram quase cinco milhões de dólares, ocorreram entre 2004 e 2013, um período em que PPK teve ocupou vários cargos no Governo de Alejandro Toledo, também imputado no esquema de corrupção.

Quase em simultâneo, a sua antiga rival presidencial e líder da Força Popular, Keiko Fujimori, esteve na procuradoria a explicar as transferências feitas pela Odebrecht a título de financiamento da sua campanha eleitoral.

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