Num palco, em 30 minutos, “o limiar da loucura que nós todos temos”

Composta em 1969, a ópera Eight Songs for a Mad King de Peter Maxwell Davies é encenada em Portugal pela primeira vez. Esta terça-feira às 21h na Escola Superior de Música de Lisboa, com entrada livre.

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Eight Songs for a Mad King pelo Psappha Ensemble, numa representação recente DR
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A representação de Roy Hart, em 1969 DR
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Sir Peter Maxwell Davis (1934-2016) DR

A versão encenada de Eight Songs for a Mad King, ópera de câmara do compositor britânico Peter Maxwell Davis, vai ser apresentada pela primeira vez em Portugal esta terça-feira, na Escola Superior de Música de Lisboa (ESML), em Benfica, às 21h. Com encenação de Sílvia Mateus e direcção do maestro e compositor Carlos Marecos, a interpretação está a cargo do barítono Tiago Amado Gomes e de um ensemble de alunos da ESML. Os figurinos são do artista plástico Élio Oliveira. A entrada é livre.

Quando da sua estreia, em 1969, Eight Songs for a Mad King (Oito Canções para Um Rei Louco) foram consideradas pela BBC, agora citada pela agência Lusa, “a última fronteira da vanguarda”, “determinantes para [a evolução do] teatro musical”. Com libreto de Randolph Stow, Eight Songs baseia-se em palavras do rei britânico George III, que cumpriu um dos mais longos reinados da coroa e que se acredita ter chegado louco ao fim da vida. Diz ainda a Lusa que, segundo o maestro e compositor Sir Peter Maxwell Davis (que nasceu em 1934, em Salford, e morreu em 2016 vítima de leucemia), a ideia para a peça nasceu quando ele descobriu um órgão mecânico em miniatura que pertencera a George III e que tocava automaticamente oito melodias. São estas que, nesta ópera, o rei tenta ensinar às aves de estimação, sustentando conversas errantes.

As oito canções, tal como surgem originalmente no alinhamento (com uma duração aproximada de 30 minutos), são: 1. The Sentry (King Prussia’s Minuet); 2. The Country Walk (La Promenade); 3. The Lady-in-Waithing (Miss Musgrave’s Fancy); 4. To be sung on the Water (The Waterman); 5. The Phantom Queen (He’s ay a-kissing me); 6. The Counterfeit (La Contrefaite); 7. Country Dance (Scotch Bonnett); 8. The Review (A Spanish March).

Um trabalho exigente

Porquê esta representação agora? Sílvia Mateus, encenadora, diz ao PÚBLICO que a escolha tem a ver com ela. “Fiz a Miss Donnithorne como recital final de mestrado em Sheffield e fiquei completamente apaixonada pela obra do Peter Maxwell Davies. E este Eight Songs for a Mad King é também um monólogo, mas em versão masculina, de exposição total dos sentimentos, da loucura, da voz, da dificuldade total da música. E o aluno que vai interpretá-lo, o Tiago Gomes, era a pessoa perfeita para fazer isso.”

Um trabalho exigente, diz: “É preciso uma pessoa que tenha uma técnica vocal muito grande para fazer este tipo de trabalho. Porque não é qualquer um que consegue fazer, quer a Miss Donnithorne quer o Eight Songs for a Mad King, porque ainda por cima elas foram escritas para pessoas específicas, a [meio-soprano] Mary Thomas e o [barítono] Roy Hart. Portanto, ou isto é muito bem feito ou mais vale nem pegar na obra.”

Desafio extraordinário

Composta para barítono e conjunto de câmara, Eight Songs for a Mad King estreou-se em Inglaterra em 22 de Abril de 1969. A versão integral já tinha sido apresentada em Portugal em Dezembro de 2004, pelo britânico Psappha Ensemble, na Gulbenkian, em Lisboa, mas a versão encenada só agora se estreia em Portugal, por iniciativa da ESML.

E a actualidade da obra, criada há quase meio século? Sílvia Mateus vê-a desta forma: “Transmite o limiar da loucura que nós todos temos. O passar de pessoa normal para pessoa louca é um clique. O George III tinha uma doença, mas qualquer um de nós tem momentos de loucura e isso é muito difícil de representar; pode parecer que a pessoa está bêbada, mas não é isso. O ir dentro de nós próprio para experimentar o que é ser-se louco é uma catarse, é quase um exercício de psiquiatria. É um desafio extraordinário.”

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