A TAP quer ser a montra do que melhor se come e bebe em Portugal

Em 2016, a TAP serviu nos seus aviões 14 milhões de refeições e 1,2 milhões de garrafas de vinho português. Números impressionantes de uma companhia que, apesar de ter accionistas estrangeiros, pretende ser cada vez mais a montra de Portugal

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Horacio Villalobos/Corbis

Lembram-se da última cerimónia dos Óscares, quando, por engano, Warren Beatty anunciou “La La Land” como o melhor filme? Na primeira gala dos TAP Awards, realizada no passado dia 16 de Novembro nas caves da Real Companhia Velha, em Gaia, viveram-se cenas gagas idênticas no anúncio dos vinhos seleccionados para as novas cartas das classes executiva e económica da TAP. Mas as falhas acabaram por ser recebidas com bonomia e não chegaram para estragar a festa, que teve direito a passadeira vermelha, números de ilusionismo de Luís de Matos e uma actuação soberba de Maira Andrade.

O que sobra do evento é a vontade da TAP de reforçar o seu envolvimento na promoção da gastronomia e dos vinhos nacionais e de ser cada vez mais a montra de Portugal. Nem pensamos nisso, mas a TAP é o maior restaurante e a maior garrafeira do país. Em 2016, serviu nos seus aviões 14 milhões de refeições e 1,2 milhões de garrafas de vinho português. Nos próximos anos, estes números deverão continuar a crescer, acompanhando o também crescente aumento de rotas e de passageiros.

Para melhorar a experiência gastronómica a bordo, porque é nos aviões da TAP que muitos dos turistas que visitam Portugal têm o seu primeiro contacto com a comida e os vinhos portugueses, a companhia aérea lançou o programa Taste the Stars. A consultoria gastronómica continuará a cargo de Vítor Sobral, mas, todos os meses, o menu da classe executiva irá ter receitas de cinco chefes nacionais já estrelados pelo Guia Michelin (José Avilez, Henrique Sá Pessoa, Rui Paula, Rui Silvestre e Miguel Lafan). O jantar que foi servido na gala do TAP Awards já incluiu uma criação de cada um deles.

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Algumas propostas deixaram um sabor amargo na boca das cerca de três centenas de convidados, mas os chefes têm uma atenuante: quem confeccionou as receitas foi uma das empresas de catering que trabalham para a TAP e a refeição foi servida nas mesmas condições em que é servida no avião. Ora, cozinhar na hora num restaurante não é mesmo que cozinhar para um avião, onde é necessário aquecer a comida e se trabalha com quantidades quase industriais. A (má) experiência da gala pode, no entanto, ser virtuosa, se for aproveitada pelos chefes para afinar e adequar melhor as receitas às exigências de um avião comercial.

2,5 milhões de garrafas de vinho nos proximos dois anos

A par do Taste the Stars, a companhia aérea lançou também a TAP Wine Experience, através da qual ambiciona ser o “maior canal de comunicação e experimentação do vinho português em todo o mundo”. A ideia passa por oferecer aos passageiros das classes executiva e económica experiências vinícas enriquecedoras e surpreendentes. As novas cartas de vinhos da TAP pretendem ser um mostruário da diversidade e da qualidade dos vinhos portugueses e terão um leque de ofertas mais alargado do que é habitual, contemplando as principais regiões vinícolas nacionais e todos os tipos de vinho, desde tintos e brancos a rosés, espumantes e fortificados (moscatéis e vinho do Porto). Ao todo, a companhia irá ter quatro cartas de vinhos distintas, que serão renovadas semestralmente, para abranger o maior número de produtores e de vinhos possível.

Nos próximos dois anos, a TAP espera comprar e servir nos seus aviões cerca de 2,5 milhões de garrafas de vinho português. É uma quantidade já por si muito importante, mas o impacto da TAP Wine Experience poderá ser ainda mais significativo, porque vai passar a ser possível encomendar, a partir do avião, qualquer um dos vinhos servidos a bordo, os quais serão depois entregues na casa dos passageiros. Além de que uma boa experiência a bordo ajuda sempre a estimular o consumo de vinho em terra.

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Por outro lado, com o Portugal Stopover, lançado em parceria com várias associações e operadores turísticos e que tem como objectivo incentivar os passageiros de longo curso da TAP a fazer escala em Portugal, permanecendo até três dias, sem custo adicional nas tarifas aéreas, irão ser oferecidas pelos restaurantes parceiros cerca de 15 mil garrafas de vinho aos turistas que cheguem a Portugal através daquele programa. 

Provas em terra e em altitude

Para elaborar as suas novas cartas, a TAP partiu de uma pré-selecção de cerca de 800 vinhos a concurso. Concorreram 124 produtores. Os vinhos foram depois provados em terra, durante três dias, por um grupo de jornalistas de vinho e sommeliers de Portugal, do Brasil e dos Estados Unidos. Os vinhos melhor pontuados em terra voltaram a ser provados num voo entre Lisboa e Praga. A selecção final resultou da soma das duas pontuações.

É uma experiência de prova inédita, já testada há dois anos pela TAP e que voltou a dar resultados surpreendentes. O comportamento de um vinho varia muito com a altitude. Por exemplo, um vinho tinto com estágio prolongado em barrica e taninos bem presentes pode proporcionar uma bela prova em terra e ser uma experiência pouco agradável a bordo de um avião a cerca de 10 mil metros de altitude. Do mesmo modo, um branco fermentado em barrica tende a perder no confronto com um branco fermentado e estagiado em inox mas cheio de fruta e boa acidez.

 

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Do Alentejo aos Verdes

Um wine tour inédito por algumas regiões portuguesas

A TAP quer tornar-se no maior divulgador dos vinhos portugueses no mundo e, para começar, realizou um wine tour inédito, levando dezenas de jornalistas de todo o mundo a conhecer algumas das regiões vitivinícolas nacionais a bordo de uma das aeronaves que ligam diariamente Lisboa ao Porto. A viagem decorreu entre os dias 14 e 16 de Novembro.  

Foram três dias intensos, sempre com muitos vinhos e refeições abundantes e saborosas. Nem tudo correu bem. No primeiro dia, o grupo já chegou de noite à Herdade do Esporão e ao Monte da Ravasqueira, onde foi servido o jantar. No dia seguinte ainda deu para conhecer um pouco de Évora e ficar com uma ideia, embora vaga, da paisagem alentejana. No Douro nem isso. O grupo chegou de noite ao Pinhãoe, duas horas depois, seguiu viagem para o Hotel Douro Palace, no concelho de Baião (já na região dos Vinhos Verdes), onde dormiu e jantou. No dia seguinte foi directo para Braga. Ou seja, quem não conhecia o Douro – a esmagadora maioria dos jornalistas – saiu sem ver literalmente nada.

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Tão mau só mesmo a infeliz ideia de servir no jantar de recepção em Lisboa aos jornalistas estrangeiros, patrocinado pelo Turismo de Portugal, risotto de cogumelos e pato confitado. Dois pratos “portuguesíssimos”, como se sabe! Também não se percebeu bem que os três primeiros produtores visitados (Quinta da Alorna, no Tejo, e Herdade do Esporão e Monte da Ravasqueira, no Alentejo) tivessem servido alguns vinhos feitos com castas estrangeiras. Não há nada de mal, mas se andamos sempre, e bem, a encher a boca com a grande diversidade e riqueza das nossas castas, não se entende que mostremos a jornalistas estrangeiros vinhos feitos com Chardonnay,  Viognier ou Syrah.

Tirando isso e a intensidade do programa, com várias viagens de autocarro pelo meio, o primeiro wine tour da TAP merece todos os aplausos. A recepção na Quinta da Alorna, em Almeirim, logo no primeiro dia, onde serviram a tradicional e deliciosa sopa de pedra, foi encantadora. Os vinhos deste produtor histórico da região do Tejo, mesmos aqueles que levam castas estrangeiras, são muito bons. O Quinta da Alorna Grande Reserva Branco 2015, por exemplo, está fantástico.  

Na Herdade do Esporão, o enólogo David Baverstock deu a provar um conjunto de vinhos brancos e tintos de grande nível que reflectem bem o perfil da casa. Uma delícia o branco Teste 9 de 2016, um vinho de talha feito com as castas Arinto, Roupeiro e Antão Vaz e que, por ser uma experiência, só é vendido na loja da herdade. Na Ravasqueira, provou-se um pouco de tudo, mas o vinho que mais impressionou foi o Monte da Ravasqueira Vinha das Romãs Tinto 2015. Um vinho que, colheita após colheita, se vem afirmando como um dos grandes tintos do Alentejo.

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A visita ao Dão foi circunscrita ao Paço dos Cunhas de Santar, da Dão Sul, naquele que acabaria por ser um dos momentos mais elogiados de toda a viagem. O grupo foi recebido à sombra de um sobreiro, na bonita e romântica Vinha dos Amores, com o novo e delicioso espumante Casa de Santar Vinha dos Amores Touriga Nacional 2014. O almoço foi acompanhado com vinhos bem representativos do Dão: o Paços dos Cunhas de Santar Vinha dos Amores Encruzado 2014, um branco ainda um pouco marcado pela madeira mas com um corpo e uma frescura formidáveis, o fresquíssimo e perfumado Casa Santar Vinha dos Amores Tinto 2011 e o mais sério e complexo Casa de Santar Reserva Tinto 2012. 

No Douro, o wine tour passou pela quinta do Bonfim, do grupo Symington. Entre provas de alguns vinhos da Quinta do Ataíde e de um dos grandes vintages daquela companhia, o Dow´s 1980, os jornalistas foram desafiados a viver a experiência do lote, a grande arte e segredo do vinho do Porto. O exercício, didáctico e sempre marcante, começou com a prova do Graham`s 20 anos. A partir dos três vinhos base que deram origem a este Tawny com uma média de idade igual ou superior a 20 anos, os jornalistas tinham que encontrar a combinação certa. Houve quem tivesse quase acertado e houve também quem tenha ficado muito longe.  

O primeiro wine tour da TAP prosseguiu no dia seguinte (num jornada que já não acompanhámos), com a visita, durante a manhã, ao belíssimo Paço de Palmeira, em Braga, seguida de um almoço no restaurante D` Elvira Lda- elogiadíssimo por toda a gente, tal como alguns dos vinhos brancos que o empresário Carlos Dias (dono do Paço) produz na região dos Vinhos Verdes. E culminou com uma prova de vinhos do Porto nas caves da Ramos Pinto, em Vila Nova de Gaia, já ao fim da tarde mas, desta vez, ainda com luz suficiente para os jornalistas estrangeiros poderem apreciar a paisagem ribeirinha do Porto.

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