Sindicato denuncia irregularidades e perseguição no serviço de otorrino do Santa Maria

Sindicato apresentou denúncia no Ministério Público e nas autoridades de saúde contra director do Serviço de Otorrinolaringologia, que acusa de ter feito um curso para uma empresa dinamarquesa quando estava de licença.

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Bruno Lisita

Um sindicato médico apresentou uma denúncia no Ministério Público e autoridades de saúde contra o director do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Santa Maria, em Lisboa, que acusa de irregularidades e perseguição, bem contra a administração dessa instituição. O hospital Santa Maria já se afirmou disponível para dar todas as informações relevantes às autoridades.

Em comunicado, o Sindicato dos Médicos da Zona Sul (SMZS) informou que entregou ao Ministério Público, à Inspecção-geral das Actividades da Saúde (IGAS) e à Entidade Reguladora da Saúde (ERS) documentos que estão na sua posse, com vista ao "apuramento das respectivas responsabilidades" do director do Serviço de Otorrinolaringologia (ORL) do Hospital de Santa Maria (HSM).

"A documentação apresentada evidencia, entre o mais, que o Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Lisboa Norte (CHLN), através da chefe de gabinete do ministro da Saúde, prestou falsas declarações à Assembleia da República sobre as relações do director do Serviço de ORL do HSM com uma empresa dinamarquesa fabricante de equipamento de estudo da vertigem e que o CHLN veio a adquirir", lê-se no comunicado.

O sindicato acusa o director de serviço em causa de ter realizado no hospital um curso sobre vertigem para essa empresa dinamarquesa "durante um período em que se encontrava de licença sem vencimento".

Na documentação do curso, com inscrições a 500 euros, o director de ORL é apresentado como professor da Faculdade de Medicina e é usado o símbolo da Faculdade de Medicina de Lisboa, adianta o comunicado.

O sindicato denuncia que esse director de serviço "aceitou, da mesma empresa, pagamentos de viagem ao estrangeiro em valor pecuniário ilícito para um titular de cargo público do Estado português". "As circunstâncias são em tudo idênticas às que levaram muito recentemente o Ministério da Saúde a afastar de funções outros titulares de cargos públicos", refere o SMZS.

Por sua vez, o hospital Santa Maria afirma estar disponível para dar todas as informações relevantes ao Ministério Público e a outras autoridades e encara "com natural serenidade" esta intervenção pedida pelo sindicato.

Fonte oficial do Centro Hospitalar de Lisboa Norte (CHLN), a que pertence o Santa Maria, assegura que o equipamento em causa foi adquirido por 12 900 euros e mediante a consulta a três empresas. Acrescenta também que o agora director de serviço de otorrinolaringologia "nem se encontrava à data ao serviço do hospital".

Oito médicos do serviço divulgaram, entretanto, uma carta de apoio ao director em que dizem não se identificar com esta denúncia, que não passa, na sua opinião, de "um instrumento disruptivo". Os médicos acrescentam que reconhecem no director do serviço "qualidades de chefia, carisma e diferenciação técnica adequadas".

"Atitude persecutória"

Segundo o comunicado do sindicato, "a Ordem dos Médicos foi informada sobre a atitude persecutória" desse director "em relação a um conjunto de médicos mais diferenciados do serviço que contestaram a sua nomeação. Tal perseguição, entre outros actos, traduziu-se na proibição desses médicos, desde há vários meses, de efectuarem intervenções cirúrgicas".

"É particularmente gritante o que se passa com o programa de implantes cocleares. A cirurgia dos implantes cocleares foi suspensa 'em castigo' à experiente equipa que, há anos, realizava com sucesso essa cirurgia no serviço, isto enquanto o director nomeado frequenta 'desesperadamente' cursos no estrangeiro com a intenção de vir ele próprio um dia a realizar a referida cirurgia. O que não aconteceu ainda ao fim de quase um ano da nomeação, e com doentes em lista de espera desde 2015", denuncia o SMZS.

Para o sindicato, esta é uma "situação escandalosa". "As responsabilidades são ainda maiores para a entidade que nomeou o referido director de serviço e o mantém em funções contra todas as evidências, responsabilidades essas que atingem o próprio ministro da Saúde, que continua a fingir-se distraído com tamanhos atentados aos princípios mais elementares da Administração Pública".

De acordo com a denúncia, o conselho de administração do CHLN "não só alega em tribunal que a referida nomeação é do interesse público, como recorre em 'outsourcing' a um dos mais caros gabinete de advogados privado no país para defender juridicamente a nomeação e o nomeado, isto quando existe um gabinete jurídico nesse hospital público, pago pelos dinheiros públicos, ao mesmo tempo que são aplicadas restrições orçamentais nos hospitais públicos que diariamente se traduzem em cortes nos cuidados de saúde prestados aos portugueses".

Em Abril passado, o SMZS já tinha vindo a público acusar o serviço de ORL do Santa Maria de viver numa situação escandalosa de "mecanismos clientelares" e de "compadrio político". Em causa estava a nomeação do director do serviço de otorrino.

Em resposta na altura, a administração do Centro Hospitalar que integra o Santa Maria garantia que a nomeação do director de serviço cumpriu a lei de forma irrepreensível.

Pouco tempo depois, em Julho, o bastonário da Ordem dos Médicos realizou uma visita àquele serviço do maior hospital do país, juntamente com elementos do colégio de Especialidade de Otorrinolaringologia e do Colégio Regional do Sul. A visita aconteceu na sequência de uma denúncia sobre o ambiente que se vive no serviço e sobre a formação dos internos.

com PÚBLICO

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