EDP diz que opções políticas vão aumentar em 280 milhões os custos do sector eléctrico

A empresa critica a introdução de novos impostos e avisa que os custos introduzidos no sistema “mais cedo ou mais tarde” acabam na factura dos consumidores.

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Rita França

Entre os custos com a tarifa social, com a contribuição extraordinária sobre o sector energético (CESE), com o imposto para equilibrar a balança de encargos no mercado grossista com as centrais espanholas e a nova taxa de ISP prevista na proposta de Orçamento do Estado para as centrais a carvão, o sector eléctrico português vai ter de pagar no próximo ano cerca de 280 milhões de euros de custos adicionais. As contas são da EDP e foram apresentadas pelo administrador da EDP Comercial, António Coutinho, num encontro da associação sectorial, a Elecpor, sobre o novo pacote de política energética da Comissão Europeia (Clean Energy for All), em que o gestor advertiu que o aumento de custos para as empresas acaba sempre por ir parar à factura da luz de famílias e empresas.

“Sempre que se aumentam os impostos, alguém tem de pagar esse custo, e é sempre o cliente”, sublinhou António Coutinho, para quem um dos pontos fracos do novo pacote europeu é o “pouco foco na subida de preços aos consumidores” e o facto de ignorar que a principal causa da subida tem a ver com o aumento de impostos e taxas que são colocados na factura eléctrica e que representam cerca de 40% do total pago (quase tanto como a componente de energia e mais do que a componente de custo das redes, segundo a associação europeia Eurelectric). Isto apesar de ter sido a constatação por parte de Bruxelas de que “a descida dos preços [da electricidade] no mercado grossista não estava a ser acompanhada pelos preços de retalho, o que motivou a revisão” da legislação energética, explicou o gestor.

Segundo Coutinho, a Comissão constatou que os países europeus que têm os preços finais mais elevados são aqueles com mais impostos e taxas na factura eléctrica, “mas apesar de haver esta conclusão, aquilo que apareceu nas quatro directivas e quatro regulamentos [do novo pacote] sobre este tema é zero”, afirmou. Isto leva o administrador da EDP Comercial a considerar que “a Comissão está muitas vezes longe do consumidor” e tem “uma dificuldade prática de dar resposta a este tipo de situações”.

Apesar de reconhecer que não se trata de um problema português, mas sim europeu, o gestor considerou “Portugal um caso paradigmático, em que parte grande dos custos resulta de decisões políticas”, como os apoios às renováveis (com um sobrecusto para o sistema – ou seja, para os consumidores – na ordem dos 1145 milhões) ou os contratos CMEC [Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual] da EDP (que até 2017 pesaram cerca de 295 milhões nos encargos suportados anualmente pelos consumidores).

Por isso, António Coutinho criticou que, no caso português, se estejam a preparar “mais impostos para o sector eléctrico”. Nomeadamente o fim das isenções de ISP para as centrais a carvão (previsto na proposta orçamental e que no próximo ano poderá ter um custo na ordem dos dez milhões) ou o imposto para equilibrar o regime concorrencial com Espanha – que está no centro de uma polémica em que o Governo acusa o anterior Executivo de ter permitido às empresas repercutir os custos da CESE e da tarifa social aos consumidores –, que nos cálculos da EDP deverá custar cerca de 85 milhões aos produtores (à EDP e à Endesa).

“Mais importante do que dizer qual será o impacto desta ou daquela medida, o importante é perceber que os custos que se colocam sobre o sistema, mais cedo ou mais tarde são repercutidos nos consumidores”, disse António Coutinho à margem do evento. “Algumas implicações podem ser visíveis logo, outras demorar mais tempo, e podem ter efeitos com aquilo que se passa na balança comercial ou com investimentos que se fazem ou deixam de fazer no parque electroprodutor”, adiantou o administrador da EDP Comercial.

No caso do imposto destinado a equilibrar a balança de encargos no mercado grossista com as centrais espanholas (e a que os produtores chamam clawback), o primeiro efeito será o de tornar as centrais eléctricas portuguesas menos competitivas do que as espanholas ao aumentar os custos de produção. No pressuposto de que as centrais portuguesas (nomeadamente as centrais de ciclo combinado) vão passar a produzir menos porque não conseguem um nível de preço para concorrer no mercado ibérico, vai descer a quantidade de gás natural que passa pelos gasodutos, mas os custos fixos destas linhas irão manter-se e, no final, vão sobrecarregar-se as facturas dos restantes consumidores de gás (famílias e indústria), sustentou António Coutinho.

Quanto à tarifa social e à CESE (com efeitos estimados de 100 milhões e 85 milhões, respectivamente), a legislação diz que “não podem impactar directamente [os preços], mas se eu tenho estes custos de produção, tenho de recuperá-los”, acrescentou o gestor. Lembrando que “a própria Comissão Europeia já diz no novo pacote energético que as tarifas sociais não podem ser aplicadas sobre as empresas”, António Coutinho sublinhou que não podem ser os clientes de electricidade a pagar “um objectivo que é da sociedade como um todo”, seja ele o de descarbonização da economia ou de apoio a consumidores de electricidade mais vulneráveis. O esforço deve recair sobre os contribuintes, por via do Orçamento do Estado, e esse é um caminho que já está a ser feito na Dinamarca ou, mais recentemente, em França, exemplificou.

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