Pedido para mãe emprestar barriga à filha foi admitido

Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida admite primeiro pedido de autorização prévia apresentado de gestação por substituição

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Nuno Ferreira Santos

Um passo decisivo para que uma mulher de 50 anos empreste o útero à filha e carregue o neto na barriga: os nove membros do Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida (CNPMA) acabam de admitir o pedido de autorização apresentado por um casal cuja mulher perdeu o útero.

O CNPMA ainda não emitiu o comunicado sobre a apreciação deste que é o primeiro pedido de autorização prévia para a celebração de um contrato de gestação de substituição. Antes ainda de enviar um comunicado, o presidente daquele órgão, Eurico Reis, confirmou ao PÚBLICO que houve um “despacho liminar”.

“Acho que é um passo muito importante”, reage Vladimiro Silva, consultor da Direcção Geral da Saúde para a área da medicina de reprodução. “Acho que é um marco histórico. Fico muito feliz.”

Não são favas contadas. Admitido o pedido de autorização prévia, o CNPMA irá agora enviar toda a documentação para a Ordem dos Médicos. Além da identificação do casal e da gestante de substituição, remeterá o contrato-tipo, a informação médica com origem no centro de Procriação Medicamente Assistida, a declaração do director do centro disponível para acompanhar o caso, a apreciação de um psicólogo.

A Ordem dos Médicos tem 60 dias para se pronunciar. O seu parecer, porém, não é vinculativo. Seguir-se-á um novo período de deliberação do CNPMA, que disporá de outros 60 dias para chegar a uma decisão final. Durante esse período, poderá solicitar uma avaliação do casal e da gestante de substituição feita por uma equipa multidisciplinar.

A história da família foi revelada pelo semanário Expresso. Isabel sofreu uma endometriose, doença caracterizada pelo crescimento de tecido endometrial fora do útero. Essa condição levou-a a fazer mais de dez cirurgias. Antes se se submeter à última, o médico sugeriu-lhe que tirasse ovócitos para congelar. É neles que reside a sua esperança. A mãe, que conta 50 anos, já deu à luz duas vezes. “É um acto de amor”, esclareceu. “Se eu posso, por que não hei-de dar-lhe essa oportunidade?”

A gestação de substituição gerou alguma controvérsia em Portugal. A lei que regula o acesso a esta possibilidade foi publicada em Diário da República a 22 de Agosto de 2016. Só a 31 de Julho de 2017 saiu a regulamentação necessária para a pôr em prática. O diploma entrou em vigor a 1 de Agosto. Uma semana depois, aquela família formalizou a candidatura agora admitida.

Esta solução está reservada para situações excepcionais. “Só é possível a título excepcional e com natureza gratuita, nos casos de ausência de útero e de lesão ou doença deste órgão que impeça de forma absoluta e definitiva a gravidez da mulher ou em situações clínicas que o justifiquem”.

Ao contrário do que acontece noutros países, a gestante de substituição não pode receber qualquer pagamento pelo acto. Por isso mesmo, não será correcto falar-se em Portugal em “barrigas de aluguer”. As gestantes são apenas ressarcidas das despesas que têm durante o processo.

Havia algum receio que este primeiro pedido não fosse admitido, já que a legislação determina que a relação entre a criança e a gestante se limite ao “mínimo indispensável, pelos potenciais riscos psicológicos e afectivos que essa relação comporta”. Os conselheiros, todavia, consideraram que a lei não impede que uma mãe empreste o útero à filha, pelo contrário. Entendem como positiva a existência de uma relação próxima entre o casal e a gestante. O que lhes parece fundamental a este nível é salvaguardar o interesse da criança.

Desde que a lei foi aprovada, ao CNPMA chegaram 54 pedidos de esclarecimento. Todos meras manifestações de intenções, tirando o caso agora admitido. A CNPMA deverá avançar em breve com um contrato-tipo que possa servir de guia aos eventuais interessados. Houve duas situações “não viáveis” que foram colocadas à consideração do CNPDM, conforme noticiou o Diário de Notícias

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