Encontrada a cadeira eléctrica que aproximou Alice Cooper e Andy Warhol

Little Electric Chair, serigrafia de Andy Warhol, estava desaparecida há mais de 40 anos e foi encontrada entre os adereços de palco do músico. Cooper e Warhol tornaram-se amigos na década de 1970.

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Little Electric Chair (1964) Fotografia de Alice Cooper

Antes de ser Andy Warhol, a mais emblemática figura da pop art, o pintor era apenas um artista em ascensão que frequentava com regularidade o Max’s Kansas City, o restaurante e clube nocturno que aglomerava a grande massa artística de Nova Iorque e servia de incubadora à cena do glam rock dos anos 1960 e 1970. Depois de um breve encontro com Alice Cooper, Andy Warhol foi a um concerto do músico e saiu com inspiração para a próxima obra. Numa das suas extravagantes actuações, o cantor sentava-se numa cadeira eléctrica e fingia que estava a ser electrocutado. Foi junto daquele adereço de palco que foi descoberta Electric Chair (1964), a serigrafia a vermelho de Andy Warhol que estava desaparecida há mais de 40 anos e que faz parte de Death and Disaster, um conjunto de trabalhos que ilustram acidentes de automóvel, suicídios ou execuções em cadeiras eléctricas como eles eram retratados pelos media.

A obra tem por base uma fotografia de imprensa de 13 de Janeiro de 1953 onde se pode ver a cadeira eléctrica onde Julius e Ethen Rosenberg foram executados após serem acusados de conspirar contra o governo norte-americano e de passar informações sobre a bomba atómica à Rússia. Andy Warhol aprimorava então a técnica da sucessiva reprodução de uma imagem ao longo da tela para testar a hipótese que havia sugerido em 1963: “Quando vemos uma imagem macabra várias vezes, ela deixa de produzir o mesmo efeito”. Ora o elemento macabro estava entranhado na persona que Alice Cooper levava a palco todas as noites e a sua namorada da altura, Cindy Lang — uma modelo que havia aparecido na capa da revista Interview de Warhol —, conhecendo bem a afeição que este tinha pelo sinistro objecto, comprou a serigrafia por 2500 dólares (cerca de 2142 euros). “Ela trouxe-a para casa e ofereceu-a a Alice como prenda de aniversário”, revelou o seu agente de longa data, Shep Gordon, ao artnet News.

Andy Warhol e Alice Cooper tornaram-se próximos quando o músico se mudou para Nova Iorque com a namorada em 1972. “Andy era um bocado groupie e Alice também. Adoravam pessoas famosas. Por isso criaram uma ligação e adoravam estar juntos”, recorda Gordon ao jornal britânico The Guardian. Mas durante o auge de uma carreira impregnada de álcool e drogas, Alice Cooper esqueceu-se da obra e foi pouco depois internado num hospital psiquiátrico. “Na altura, Alice fazia dois álbuns por ano e andava em digressão no resto do tempo. Era a época do rock’n’roll, nenhum de nós pensava em nada”, justifica Shep Gordon.

Alice Cooper enrolou a obra e guardou-a dentro de um tubo protector numa unidade de armazenamento com controlo de temperatura em Los Angeles, onde mantinha parte do seu vasto equipamento de digressão. Durante quatro décadas esqueceu-se que tinha em sua posse o original de uma das mais icónicas obras da pop art. “Alice lembra-se de ter uma conversa com Warhol sobre a imagem. Ele acha que a conversa de facto aconteceu, mas não poderia pôr a mão sobre a Bíblia e afirmá-lo com certeza”.

Há quatro anos, Shep Gordon jantava com Ruth Bloom, coleccionadora de arte radicada em Los Angeles, quando esta comentou o valor alcançado por um quadro de Warhol em leilão. O agente de Cooper mencionou que o músico tinha tido em mãos um exemplar de Little Electric Chair e a conversa voltou-se para a obra, o seu paradeiro e o valor que poderia gerar. “A mãe de Alice lembrou-se de que [a tela] tinha ido para o depósito”, conta Gordon. “Por isso fomos procurar e encontrámo-la enrolada num tubo”.

Shep Gordon sugeriu que o seu cliente pendurasse o trabalho de Warhol em casa, mas Cooper não queria ter nada que valesse tanto dentro da sua residência (o recorde atingido por uma versão a verde da obra num leilão da Christie’s em Novembro de 2015 foi de 11,6 milhões de dólares – cerca de 10 milhões de euros) e ordenou que a obra fosse guardada de novo. O original, que vem sem assinatura do artista, não pode ser autenticado pela Andy Warhol Foundation for the Visual Arts, uma vez que a instituição deixou de oferecer serviços de autenticação em 2011 após uma disputa legal com um colecionador. De acordo com o artnet News, “as obras que não têm o selo de aprovação da fundação tendem a ter dificuldades a ganhar um empurrão no mercado”.

Para verificar a autenticidade da serigrafia, Shep Gordon levou-a a Richard Polsky, um negociante de arte, escritor e especialista em Warhol que publicou recentemente uma adenda desautorizada ao Warhol Catalogue Raisonné, o multidisciplinar catálogo de obras do pintor. Polsky acredita que o trabalho em questão é um original de Warhol. “Tudo bate certo. Alice e Andy eram bons amigos no início dos anos 1970 quando Alice estava no seu melhor”, explica ao artnet News. Ao The Guardian, Richard Polsky reitera que está “100% seguro” de que esta é a verdadeira versão da obra. “É difícil apreciar o pouco que valia a arte de Warhol na altura. Mas 2500 dólares era a taxa de circulação da época. Por que é que Andy lhe venderia uma cópia falsa?”.

O agente de Alice Cooper confirma que o músico e o pintor faziam parte do mesmo círculo e que “Alice chegou a ir ao Studio 54 [uma lendária discoteca em Manhattan] com Andy em diversas ocasiões”. Segundo Gordon, nunca ninguém acreditou que a tela tivesse qualquer valor. “Andy Warhol não era ‘Andy Warhol’ na altura. Tudo era uma espiral de álcool e drogas. Deviam ter visto a cara de Alice quando soube a estimativa de Richard Polsky. Ficou de queixo caído e olhou para mim. ‘Estás a falar a sério? Isso pertence-me!’”.

Gordon afirma que a venda da tela não está inteiramente fora de questão, mas para já não é claro o nível de interesse que um trabalho autenticado por Polsky teria junto das grandes leiloeiras, já que muitas delas continuam a proceder à verificação dos trabalhos pelas fundações dos artistas em causa antes de pô-las à venda. A base de dados do artnet News inclui centenas de imagens da mítica cadeira eléctrica em diferentes cores e tamanhos. Por agora, o original em vermelho deverá ficar em exibição na casa de Alice Cooper quando o músico concluir a digressão mundial no final do ano.

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