Já ouviu falar no TCI?
Não podemos pensar a Constituição só em termos nacionais. Um Tribunal Constitucional Internacional é uma grande ideia a crescer no terreno.
Todos sabem já o que é o TPI (Tribunal Penal Internacional), mas o TCI é ainda um desconhecido. Ora, um Tribunal Constitucional Internacional (TCI) não é uma quimera: é uma grande ideia a crescer no terreno, pela democracia e pelos direitos humanos.
Os satisfeitos com a sua democracia e com o nível de respeito pelos direitos humanos podem considerar o TCI fantasia ou luxo. Mas os que se lembram das ditaduras e, sobretudo, os que ainda nelas vivem têm-no por última esperança. Os despotismos renascem sempre do adormecimento cívico, dizia Montesquieu. E nós andamos muito sonolentos na Europa, onde os autoritarismos sobem o tom de voz.
Não podemos pensar a Constituição só em termos nacionais. Os valores constitucionais internacionais são um facto: estão vivos em princípios e regras. Há até quem proponha uma codificação, pois abundam costumes e tratados: Declaração Universal dos Direitos do Homem, Carta da Organização dos Estados Americanos, Ata Constitutiva da União Africana, Tratados da União Europeia — v.g. o Tratado de Lisboa —, Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Só estas fontes são uma grande Constituição material dispersa mas, como se vê, já formalizada. O TCI estará preocupado com procedimentos eleitorais democráticos, assim como com garantias processuais e relativas ao funcionamento independente e legal do poder judicial.
O TCI não aplicará só Direito internacional, mas também nacional, designadamente nos casos de países que não cumpram a sua própria Constituição ou as leis, bloqueando o acesso à justiça aos seus cidadãos, assim legitimando a sua intervenção.
O TCI terá funções jurisdicionais, uma vez esgotadas as vias de recurso em cada ordem jurídica, nacional e regional. Podendo preliminarmente instituir-se uma fase de mediação, a aplicação das decisões do tribunal dependerá ainda dos Estados, claro.
Uma novidade útil consiste em o TCI ser ainda instância de aconselhamento de governos, organizações internacionais e forças vivas da sociedade civil, nacionais e internacionais.
O TCI precisa de programar a sua capacidade de ação (p. ex., financiamento, recursos humanos, instalações físicas), prever a interoperatividade normativa (articulando um constitucionalismo global a vários níveis), e tem de ver garantida a sua autoridade formal e a sua competência exclusiva.
É um grande desafio trabalhar neste projeto. Dada a conjuntura internacional, é cada vez mais urgente fazê-lo. Onde togas justas falam, calam-se as armas e o discurso das calculadoras pesa menos. Os povos querem Justiça, não um futuro hipotecado à lógica fria dos números ou à irracionalidade sangrenta dos extremismos.
Pela primeira vez este problema foi discutido em Portugal. Aconteceu na Universidade Aberta e na Universidade Europeia, em Lisboa, em 6 e 7 de abril deste ano, e o debate continuará, alargado a mais instituições e pessoas.
O autor escreve segundo as normas do novo Acordo Ortográfico