Sobre a função social de um banco público

Paulo Macedo assumiu que o plano inicial será ajustado e não penalizará nenhum concelho

A Caixa Geral de Depósitos (CGD) é um banco público e como tal tem uma função social a cumprir que torna única e específica a forma como deve ser gerido. A CGD não é um banco igual às instituições bancárias privadas e, embora possa estar no mercado em condições de concorrência, há limites que lhe são impostos pelo estatuto público, os quais não permitem que possa agir do mesmo modo.

Esta constatação é banal, mas parece que terá sido esquecida pelo efémero e ex-presidente da CGD António Domingues ao preparar a recapitalização, bem como pelo ministro das Finanças, Mário Centeno, ao negociá-la com a Comissão Europeia. A estratégia prevê uma redução de 25% dos balcões até 2020, o que resultará na diminuição para 490 ou 470 das  actuais 651 agências presenciais.  Este corte, nos moldes em que estava previsto, teria como consequência o fecho de agências da CGD em concelhos onde são o único banco.

Após o PÚBLICO ter noticiado que um conjunto de deputados de todos os partidos parlamentares, incluindo do PS, tinha já questionado o Governo sobre este critério, o actual administrador da CGD, Paulo Macedo, assumiu que o plano inicial será ajustado e não penalizará nenhum concelho

Ora, reestruturar a CGD, sendo esta um banco de Estado, é recapitalizá-la e torná-la competitiva no mercado, ou seja, rentável como negócio, mas sem esquecer a sua matriz e sem sacrificar a função social que está obrigada a prestar. Isto para já não falar do papel que desempenha obrigatoriamente no domínio simbólico, enquanto sinónimo de unificação nacional.

A CGD não é um banco igual aos outros, por mais que o primeiro-ministro, António Costa, insista que ela tem de ser gerida de acordo com as leis do mercado. Até porque o mercado da CGD é também ou sobretudo este “mercado” do papel social que desempenha enquanto meio de ligação do Estado aos cidadãos.

O seu papel social não passa apenas pelo facto de a CGD ser o suporte da estrutura de pagamento de ordenados, de pensões e reformas do Estado. E ao sê-lo não serve apenas o funcionalismo público presente e passado, mas também todos os pensionistas que têm direito a reformas de sobrevivência.

Há um outro nível em que a CGD tem um serviço público a prestar. Tem a obrigação social e nacional de estar principalmente nos sítios onde os privados não estão. O facto de os privados terem fechado balcões em locais pouco competitivos e despovoados não significa que a CGD o possa fazer. Pelo contrário. Precisamente porque os bancos comerciais privados aí fecharam ou nunca existiram, a CGD tem de permanecer em todos os concelhos.

A concorrência da CGD com a banca privada e a rentabilização do banco público tem de ser feita ao nível do que são os investimentos e não sacrificando precisamente a sua missão de entidade pública. E neste domínio é preciso assumir que rentabilizar a CGD é não fazer negócios ruinosos, como foi o caso da proliferação de empréstimos sem garantias reais que estão na origem das imparidades, ou seja, dos créditos malparados que consistiram em emprestar dinheiro no volume de milhões de euros aos amigos através de uma rede de influência escusa e promíscua.

Falemos de números. Entre 2011 e o final de 2016, a CGD teve 3878 milhões de euros de prejuízo, 1859 milhões dos quais em 2016. No balanço de contas de 2016, estão previstos 3017 milhões de euros para fazer face ao crédito de risco, às ditas imparidades.  O Estado português vai injectar na CGD 3,9 mil milhões, numa recapitalização autorizada por Bruxelas que, no total, ascenderá a cinco mil milhões. Sendo que, em 2013, a CGD já recebeu 1650 milhões de euros saídos também do Orçamento do Estado.

Ao lado do verdadeiro assalto ao cofre que foi a satisfação, com contornos mafiosos e criminosos, dos interesses de uma quadrilha através da concessão de empréstimos sem garantias reais de serem pagos, manter um balcão da CGD em todos os concelhos terá certamente um custo monetário ridiculamente irrisório.

Sugerir correcção
Ler 4 comentários