Apanhado na rede

Mesmo quando Herzog não está no seu melhor, há sempre qualquer coisa de idiossincrático que justifica a visão.

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Menos discurso consistente, mais colecção de vinhetas
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A premissa é, por si só, todo um programa – Werner Herzog, o explorador dos recantos mais estranhos do mundo e da mente humana, atira-se à internet, traça o percurso que a levou de simples ferramenta de trabalho de cientistas a infraestrutura essencial do mundo contemporâneo, olha para as suas grandezas e misérias. Apesar de ter sido co-produzido por uma empresa da nova economia, Eis o Admirável Mundo em Rede não podia estar mais longe da ideia de “conteúdo patrocinado” - Herzog está a perseguir as mesmas questões de sempre sobre o que faz mover a mente humana, daquela maneira tão transviada a que nos habituou; basta ver aquela projecção futurista de monges Hare Krishna agarrados ao telemóvel numa futura Terra despovoada que partiu para colonizar as estrelas, ou o modo como uma família de luto que sofreu bullying online após a morte da filha é filmado quase como um congresso de bruxas. Mas – talvez devido à sua estrutura em capítulos, ou ao modo como, tal como um link, o filme está sempre a saltar entre temas e aberturas - Eis o Admirável Mundo em Rede é menos um discurso consistente, Herzogiano, e mais uma colecção de vinhetas, de variações sobre um tema, que nunca mergulham a fundo e ficam ali pela rama. Não é um Herzog de primeira água como Into the Abyss, empalidece perante o posterior Para o Inferno, mas como sempre no cineasta alemão é suficientemente idiossincrático para justificar a visão.

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Para este lançamento em cinema, o filme é antecedido por aquela que é a melhor curta de Gabriel Abrantes, divertidíssimo exercício de desconstrução e reconstrução do impulso artístico e crítico à volta de uma escultura de Constantin Brancusi, A Brief History of Princess X. Há algo de comum com Herzog na iconoclastia de que a curta faz prova; mas estes brevíssimos e incisivos sete minutos provam como o prolífico artista plástico tornado cineasta, é capaz do melhor, bastando-lhe para isso eliminar toda a ganga pesadona e o traço grosso redundante do seu humor piadético e rasca, ejectar a necessidade de explicar à exaustão a sua abordagem, reduzir o gague à duração exacta e imprimir-lhe ligeireza e velocidade.

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