Brasil e Portugal: para muito além do BRIC’s e PIGS

Costa é hábil e diplomático e em nenhum momento escorrega. Não fala em corda em casa de enforcado, por isso ignora solenemente temas relacionados com a crise política e econômica brasileira.

O Primeiro Ministro visita o Brasil e nos faz pensar em um jogo ganha-ganha inovador nas nossas relações bilaterais.

No já longínquo ano de 2009, o Brasil era o ‘b’ de BRIC's e Portugal o ‘p’ de PIGS.

Para o Brasil o momento era êxtase e euforia. O espírito dos brasileiros era de que tinha enfim chegado a nossa hora gloriosa, de deixar para trás o complexo de cachorro vira-latas e de deixar de ser o eterno “país do futuro”.

O então presidente Lula, aclamado de norte a sul e intitulado por Barack Obama de “o cara” (“the guy”), dizia que não tínhamos nada a temer em relação à grande crise econômica mundial iniciada em 2008 a qual deveria chegar por aqui como uma “marolinha” e não como tsunami.

Falastrão e boa praça, lastreado por mais de 80% de aprovação dos brasileiros, Lula fazia o delírio das audiências mais diversas, fossem essas constituídas de empresários, sindicalistas, favelados, investidores, foros internacionais, etc. De quebra prometia que o Brasil faria da Copa do Mundo de 2014 e das Olímpiadas do Rio em 2016, as mais lindas e venturosas edições jamais vistas na história desses megaeventos globais.

Como contraponto, Portugal, por sua vez, vivia seu momento negro. Sobretudo pelos problemas relativos à economia, nossos irmãos de além-mar eram colocados no mesmo saco de Itália, Grécia e Espanha, o qual recebeu dos economistas maledicentes o infame rótulo de PIGS.

Nos anos seguintes, de 2009 até aí mais ou menos final de 2012, lembro muito bem de reuniões com jovens executivos portugueses, que aportaram no Brasil, parte de uma nova geração, que juntamente com outros jovens profissionais de outros países europeus, com destaque para espanhóis, franceses, alemães e ingleses, resolveram deixar a Europa, levados pelo sentimento de que a União Europeia deveria ficar em ponto morto ao longo da década então iniciada.

Coitadinhos dos irmãos portugueses, pensávamos nós, brasileiros. Mas a vida é assim: “não há mal que sempre dure, nem bem que nunca se acabe”, como dizia minha vó, portuguesa de Podentes, que veio para o Brasil em 1908.

E eis que hoje, dia 8 de setembro de 2016, estou eu assistindo à palestra do primeiro-ministro português António Costa, em almoço promovido pela Câmara Portuguesa de Comércio e Indústria do Rio de Janeiro. Simpático, mas sem ter nem o carisma nem tampouco a fanfarronice do Lula, o premier português é modesto, realista e convenhamos, está a fazer bem aquilo que se propõe neste momento, que é vender aqui no Brasil uma mercadoria que está em terrível escassez entre nós, brasileiros: otimismo.

O primeiro-ministro começa lembrando que o remédio amargo foi devidamente administrado em Portugal. Entre os presentes, interessados na mensagem do primeiro-ministro, não estão apenas brasileiros, também foram ouvir portugueses que para cá vieram no começo desta década e que agora pensam em retornar.

O primeiro-ministro é um vendedor convincente, persuasivo e habilidoso. Sabe expor as vantagens de colaboração comercial e empresarial entre as duas nações como um jogo ganha-ganha e não como um jogo de soma-zero. Mostra fatos, dados e estatísticas para apoiar sua argumentação de que a nação lusitana tem hoje condições de ser uma parceira mais próxima e presente dos brasileiros na superação da crise que nos deixou estatelados no chão. "Sermos atualmente o 10º maior importador do Brasil e o 11º exportador está muito aquém daquilo que Portugal e Brasil podem fazer", aponta o PM lusitano.

Costa é hábil e diplomático e em nenhum momento escorrega. Não fala em corda em casa de enforcado, por isso ignora solenemente temas relacionados com a crise política e econômica brasileira. Pinta um panorama sedutor de Portugal para projetos envolvendo um amplo espectro de potenciais parceiros brasileiros, desde grandes empresas – como a EMBRAER que já relocou parte de suas unidades de São Paulo para Évora – investidores e empreendedores bem-sucedidos, sem esquecer de pequenos empresários, startups e mesmo aqueles da economia criativa, como artistas plásticos e designers.

Em um fechamento feliz para seu sedutor discurso o primeiro-ministro lusitano nos brinda com uma metáfora muito positiva. Portugal e Brasil, tem ao longo de suas histórias um relacionamento duradouro, que tem sobrevivido às crises de um lado e outro do Atlântico, mas que nestes tempos de globalização o mais adequado é entendermos nosso relacionamento luso-brasileiro como portas. E portas devem ser usadas ou são simplesmente paredes. “Portugal deve ser visto por brasileiros como a sua porta natural para a União Europeia e o Brasil deve ser visto pelos portugueses como a porta natural para a América Latina. ”

Amém!

Nota: texto escrito em português do Brasil.

Sugerir correcção
Ler 2 comentários