A prisão de Oscar Wilde em Reading por Patti Smith, Steve McQueen e Ai Weiwei

A prisão onde Oscar Wilde esteve entre 1895 e 1897 abre pela primeira vez ao público em Setembro e vai inspirar a iniciativa Inside – Artists and Writers in Reading Prison.

Fotogaleria
Oscar Wilde e Alfred Douglas em 1893 National Portrait Gallery/DR
Fotogaleria
A cela de Oscar Wilde em Reading Morley von Sternberg
Fotogaleria
Os prisioneiros em Reading Gaol antes da sua libertação ou transferência Berkshire Record Office/DR
Fotogaleria
O exterior do estabelecimento prisional Morley von Sternberg
Fotogaleria
O manuscrito de A Balada de Reading Gaol The British Library Board/DR

Oscar Wilde viveu numa época em que a homossexualidade era crime e tabu social. Acusado de “cometer actos indecentes com pessoas do sexo masculino” em 1895, o escritor irlandês cumpriu uma pena de dois anos na prisão de Reading, em Inglaterra. O estabelecimento prisional deixou de funcionar em 2013 e, entre 4 de Setembro e 30 de Outubro, propiciará a criação de vários artistas com base em temas como a dor da separação imposta pelo Estado, o passar do tempo, a redenção e o amor.

Inside – Artists and Writers in Reading Prison vai juntar nomes de várias expressões artísticas para contar a história do recluso mais famoso de Reading, o prisioneiro C.33. A cantora Patti Smith e os actores Maxine Peake, Ben Whishaw e Ralph Fiennes irão participar nas leituras de De Profundis, a carta de amor de 50 mil caracteres que Wilde escreveu a Lord Alfred Douglas, seu amado, enquanto encarcerado. Richard Ellman, biógrafo de Wilde, afirma que “é uma das mais longas e belas cartas de amor alguma vez escritas”.

As leituras acontecem todos os domingos na capela da prisão e duram quatro horas e meia. “Será uma experiência íntima para uma audiência que terá a liberdade de ir e vir ou ficar preso ao seu lugar”, diz Michael Morris, da associação artística Artangel (conhecida por apresentar obras em lugares incomuns), ao The Arts Newspaper.

O realizador Steve McQueen irá explorar a ideia do enclausuramento com uma intervenção surpresa nas celas. O artista chinês Ai Weiwei e as escritoras Jeanette Winterson e Gillian Slovo irão criar as suas próprias versões da carta tendo como inspiração “a separação imposta pelo Estado” a partir de experiências reais ou imaginadas. As cartas serão, depois, expostas nas celas e, no dia 11 de Setembro, a BBC Radio vai transmitir a leitura de algumas delas.

A fotógrafa norte-americana Nan Goldin mostrará novos trabalhos que retratam o “desejo obsessivo” e serão reveladas novas pinturas e esculturas de Marlene Dumas e Robert Gober, respectivamente. Já artistas como Roni Horn, Doris Salcedo e Felix Gonzalez-Torres terão os seus trabalhos expostos nos corredores do edifício vitoriano. “Wilde não foi só a primeira celebridade da prisão, mas a primeira celebridade que deixou a máscara cair”, refere Michael Morris.

Além deste tributo, será realizada a primeira grande exposição francesa dedicada a Wilde, que terá lugar no Petit Palais, em Paris, de 28 de Setembro de 2016 a 15 de Janeiro de 2017, e mostrará mais de 200 manuscritos, fotografias, desenhos e pinturas. Afinal, depois de dois anos enclausurado e tido como um pária, Wilde passou os últimos três anos da sua vida em Paris, onde morreu na pobreza e no anonimato em 1900. Foi enterrado no cemitério Père Lachaise.

Oscar Wilde casou-se, em 1884, com Constance Lloyd, com quem teve dois filhos, Cyril e Vyvyan. Entre a escrita de peças de teatro, poemas e do seu único romance, O Retrato de Dorian Gray, levava uma vida discreta. Até ao momento em que ganhou atenção pública devido a uma rixa com Sir John Solton Douglas, marquês de Queensberry e pai homófobo do seu amado, Lord Alfred Douglas, que lhe terá deixado um bilhete à porta de casa que dizia “Oscar Wilde: sodomita fingido”.

Apesar de a sua homossexualidade ser conhecida publicamente, Wilde ficou tão enraivecido com o bilhete que decidiu processar John Douglas por difamação. Contudo, Douglas argumentou que Wilde teria pedido 12 rapazes para práticas sodomitas entre 1892 e 1894 e apresentou como prova as passagens eróticas dos seus trabalhos literários e as cartas de amor escritas a Alfred. Numa audição em que se punha a hipótese de sair sob fiança, empregadas de um hotel onde costumava ficar alojado afirmaram ter visto jovens rapazes na sua cama.

Face à consistência das provas, o advogado do escritor desistiu do caso e a Coroa britânica mandou emitir um mandado de prisão. Foi assim que Oscar Wilde chegou a Reading (anteriormente, Reading Gaol). A prisão, projectada pelos arquitectos William Bonython Moffatt e George Gilbert Scott, impunha uma estrita filosofia de isolamento que privava os prisioneiros de qualquer contacto humano. Condenado à solidão, Wilde compôs algumas das “mais belas e tristes páginas da literatura britânica” em De Profundis,  classifica o Le Figaro. "Se depois de eu sair, um amigo meu desse uma festa e não me convidasse, eu não me importaria nada. Tendo liberdade, flores e a lua, quem poderia não ser feliz?", escreveu Wilde.

Quando saiu em liberdade, em 1897, estava fisicamente e mentalmente debilitado. Partiu para o exílio em França onde viveu em casas de amigos e hotéis baratos até à morte. Os últimos anos da sua vida foram pouco produtivos na escrita. Desta época da sua vida apenas ficou A Balada de Reading Gaol, um poema de 1898 sobre o seu tempo na prisão.

 

Editado por Vasco Câmara

Sugerir correcção
Comentar