Procurar a Dory pode ser uma ameaça à espécie

A corrida aos aquários proporcionada pela sequela de "À Procura de Nemo" preocupa as associações de defesa de animais

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É azul, fala "baleiês" e o seu coração gigante compensa a sua pequena memória. Falamos de Dory, o peixe cirurgião-paleta que ficou mundialmente conhecido quando em 2003 se tornou um dos companheiros de aventura de Marlin em "À Procura de Nemo". Agora, 13 anos depois, Dory é protagonista da sequela, que é já o filme de animação com a melhor estreia de sempre.

Com receitas acima dos 155 milhões de euros nos EUA, a que se somam ainda 57 milhões das estreias mundiais que já aconteceram, o filme roubou o recorde de bilheteira a "Shrek Para Sempre". Os números conquistados pelo sucesso da simpática, mas esquecida, Dory foram duas vezes melhores do que os alcançados pelo filme "Divertida-Mente", vencedor do Óscar de melhor filme de animação, e fica apenas atrás de "Capitão América: Guerra Civil" na lista de melhores estreias de 2016.

Com uma espera de 13 anos, a expectativa para este filme era grande e a corrida às salas de cinema comprova-o. As crianças agora adolescentes e os adolescentes agora adultos mantiveram-se fãs da saga e o filme continua a ser procurado nos horários de exibição mais tardios, onde as salas se enchem de gente de faixas etárias acima dos 12 anos.

No entanto, o seu sucesso está a deixar preocupados alguns grupos de defesa de animais e já existe uma petição para que a Disney e a Pixar tomem precauções, sensibilizem para as consequências de uma corrida às lojas de animais e garantam a protecção das espécies marinhas que protagonizam o filme.

Em "À Procura de Nemo", a história desenrola-se na viagem de Marlin e Dory para encontrar Nemo, o peixe-palhaço filho de Marlin que vive na Grande Barreira de Coral, na Austrália, e é capturado por dois mergulhadores. Apesar de uma das mensagens do filme ser a protecção de espécies, o sucesso estrondoso da película levou a um aumento de vendas de peixes desta espécie.

Em 2012, quase uma década depois da estreia do filme, o peixe-palhaço ocupava o quinto lugar na lista de animais mais importados pelos EUA. A pressão da procura foi tal que, durante o processo, várias populações desta espécie desapareceram por completo do seu habitat natural, como nas Filipinas, alertam alguns ecologistas.

“As pessoas apaixonam-se pelas personagens e querem tê-las como animais de estimação em vez de compreenderem a mensagem do filme a respeito da conservação das espécies, como a de manter o Nemo no oceano [e não no aquário do dentista]”, partilha Anita Nedosyko, co-fundadora do projecto Saving Nemo, em declarações ao jornal britânico "The Guardian".

“Os peixes de recife já estão a lutar contra o aumento da temperatura média das águas e contra a acidificação causada pelo aquecimento global. A última coisa que estas espécies precisam é de serem tiradas do seu habitat”, alerta Carmen da Silva, uma das coordenadoras do projecto Saving Nemo Conservation Fund, criado para tentar combater o desaparecimento do peixe-palhaço do seu habitat natural.

A organização não-governamental criada por cientistas e biólogos tem investido, desde 2005, na criação desta espécie em cativeiro, uma vez que mais de 90% das espécies marinhas vendidas em lojas de animais são retiradas do seu habitat natural.

No entanto, as associações de protecção de animais receiam que "À Procura de Dory" se traduza numa nova corrida às lojas de animais. Desta vez, a preocupação é ainda maior uma vez que, ao contrário do peixe-palhaço, o cirurgião-paleta não é reproduzida em cativeiro e por isso os espécimes vendidos são todos eles selvagens.

E se uma Dory pode viver entre 20 a 30 anos, o seu dia-a-dia no aquário é uma luta por uma muito mais curta sobrevivência, alerta Rene Umberger, directora da organização For the Fishes.

Além disso, a preocupação estende-se também à forma como o processo de captura decorre. Para conseguir apanhar estes animais em ambiente selvagem é frequente o recurso a cianeto, o que mata corais e outros peixes e que adoece os próprios peixes-palhaço e cirurgião-paleta, que no limite resultam mesmo na sua morte.

Actualmente, todos os anos são retirados dos oceanos cerca de 400 mil peixes cirurgião-paleta, detalha a organização Saving Nemo Conservation Fund. No entanto, este é um número que deverá aumentar nos próximos tempos, caso se repita o fenómeno que sucedeu o primeiro filme. Para já, a Disney afirma estar a trabalhar com a Monterey Bay Aquarium no lançamento de uma campanha que deverá chegar às redes sociais ainda esta semana.

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