Nem a reestruturação impediu negócio da TAP no Brasil de duplicar perdas

Prejuízos de 40,2 milhões interrompem evolução positiva dos últimos anos. Novo contrato de venda do grupo, com 50% a passar para as mãos do Estado, será assinado esta semana.

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M&E Brasil estava a reduzir prejuízos nos últimos anos, mas os resultados voltaram a piorar em 2015 DR

No ano em que a TAP concluiu um plano de reestruturação a longo prazo da manutenção no Brasil, este negócio voltou a agravar os prejuízos, interrompendo a evolução positiva que se verificava. O relatório e contas do grupo, agora divulgado, mostra que esta subsidiária teve perdas de 40,2 milhões em 2015 – praticamente o dobro das registadas um ano antes. A par do impacto da Venezuela, os resultados desta empresa brasileira elevaram os prejuízos globais do grupo para 156 milhões de euros. Estes números são conhecidos na semana em que o Governo vai assinar com a Atlantic Gateway o novo contrato de venda que devolverá ao Estado 50% do capital.

No documento, a TAP justifica o agravamento dos prejuízos em 17,6 milhões de euros com “o adiamento de algumas inspecções por força de uma menor actividade das companhias áreas brasileiras clientes, com particular incidência durante a primeira metade do ano”. O segundo semestre permitiu “uma recuperação assinalável”, com seis meses consecutivos de resultado operacional positivo, mas não foi suficiente para que o ano terminasse com melhores resultados. Aliás, desde que o plano de reestruturação a cinco anos foi iniciado em 2011, a M&E Brasil tinha vindo a reduzir continuamente as perdas, mas esse ciclo foi agora interrompido.

Bens penhorados de 11,4 milhões

A TAP escreve que “as perspectivas para 2016 continuam positivas”, depois de, no ano passado, as receitas terem crescido cerca de 11%. “A estratégia mantém-se focada na diversificação do portefólio, no sentido de atender às mudanças de produtos verificadas no mercado e possibilitar, desta forma, o alargamento do espectro de clientes, bem como ganhos de eficiência e na consolidação dos processos produtivos”. Além das perdas, o grupo ainda teve de contabilizar provisões relacionadas com as acções laborais e tributárias movidas contra esta subsidiária, que já levaram à penhora de bens avaliada em 11,4 milhões de euros no final de 2015.

No relatório e contas, são elencados processos interpostos por actuais e antigos trabalhadores, num valor de 9,4 milhões de euros, em grande parte relacionados com a migração de funcionários da Varig (a companhia de aviação que detinha a empresa). Já no que diz respeito às contingências tributárias, a TAP explica que as dívidas foram totalmente pagas ao abrigo de uma medida adoptada pelas autoridades brasileiras em 2014, que lhe permitiu reduzir parte da factura através de créditos fiscais. Estão, ainda assim, pendentes acções nesta área, nomeadamente uma no valor de 18,7 milhões de euros relativos a isenções fiscais, mas que o grupo acredita que lhe serão favoráveis.

Os 40,2 milhões de euros de prejuízos do negócio de manutenção no Brasil, cuja compra integral em 2007 à Geocapital está sob investigação da Procuradoria-Geral da República, somaram-se às perdas de 99 milhões de euros da actividade de transporte aéreo, que foi muito penalizada pela contabilização dos mais de 90 milhões de euros que estão retidos na Venezuela. No relatório, fica também a saber-se que, em Angola, estão retidos outros 27,7 milhões. As restantes empresas do grupo registaram resultados positivos, com destaque para as Lojas Francas (8,7 milhões) e para a Groundforce (4,9 milhões, embora a TAP detenha apenas 49,9% do capital).

Financiamento mais dilatado

Com as perdas agregadas de 156 milhões registadas em 2015, os capitais próprios da TAP agravaram-se ainda mais, para um valor negativo de 530,3 milhões de euros. O grupo destaca que este agravamento aconteceu apesar da entrada de dinheiro fresco: cerca de 150 milhões de euros de prestações suplementares logo em Novembro do ano passado, quando a privatização ao consórcio Atlantic Gateway foi consumada, estando para breve as alterações prometidas pelo actual Governo, que vão devolver ao Estado 50% do capital. E explica-se que, além desta injecção de capital, prevê-se que até Junho seja materializado o empréstimo obrigacionista de 120 milhões, ao qual se somarão mais 67,1 milhões de prestações suplementares ainda em 2016.

O relatório mostra ainda que a venda do grupo trouxe significativas alterações na sua estrutura de financiamento, com muita da dívida de curto prazo a desaparecer do balanço. Em 2014, quase 80% da dívida bancária remunerada tinha maturidade até um ano, mas esses 515,9 milhões de euros caíram para apenas 108,1 milhões no final do ano passado. E, se em 2014 não existiam empréstimos com prazos acima de quatro anos, o panorama mudou completamente 12 meses depois, passando a entrar nesta categoria mais de 40% do financiamento. Além disso, por força da privatização, “foi concedida, por parte de diversos financiadores nacionais e estrangeiros, a renúncia (waiver) a cláusulas que previam o termo antecipado das respectivas transacções em caso de alteração da estrutura accionista que determinasse a perda da maioria do capital por parte do Estado português”. Nos casos das instituições financeiras que não aceitaram esta alteração, os empréstimos foram todos liquidados antecipadamente, com o passivo global do grupo a cair 8%, em cerca de 170 milhões de euros.

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