Banqueiros querem estabilidade, finanças consolidadas e compromissos cumpridos

Presidente recebeu a banca em Belém, mas ninguém se pronunciou sobre soluções de Governo. Nesta quinta-feira é a vez de economistas e cinco ex-ministros das Finanças e amanhã Cavaco Silva reúne-se novamente com os partidos.

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Fernando Faria de Oliveira, presidente da Associação Portuguesa de Bancos, considera ser “fundamental” criar um “clima de confiança e de segurança” junto dos cidadãos e dos mercados financeiros, bem como dos “mercados políticos” Miguel Manso
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José de Matos, presidente da CGD, considerou "importante salvaguardar as condições de estabilidade para o sistema financeiro e estabilidade macroeconómica em geral para o país". Miguel Manso
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"Nós somos um banco da economia social e por isso preocupam-nos os impactos sociais que um clima de instabilidade e de retrocesso pode ter", afirmou José Félix Morgado, presidente da caixa Económica Montepio Geral. Miguel Manso

Com palavras diferentes mas todos com o mesmo sentido: os sete banqueiros que esta quarta-feira passaram pelo Palácio de Belém defenderam que o país precisa de estabilidade económica, financeira e fiscal, de prosseguir o esforço de consolidação das contas públicas, e de cumprir os compromissos internacionais. Entre a maioria dos que apenas fizeram uma curta declaração aos jornalistas e os raros que aceitaram perguntas, nenhum quis falar sobre a natureza do próximo Governo – se de gestão ou de iniciativa do PS , mesmo que isso possa ter implicações sérias seja no rating da República seja no cumprimento dessa espécie de caderno de encargos que os banqueiros deixaram ao Presidente da República.

Fernando Faria de Oliveira, presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB), foi directo: um futuro novo executivo deve ter “capacidade de acção estratégica, muita lucidez e grande realismo”. Para isso, o patrão dos banqueiros considera ser “fundamental” criar um “clima de confiança e de segurança” junto dos cidadãos e dos mercados “não só dos financeiros mas também dos mercados políticos”. Para isso é fundamental que se continue a cumprir os compromissos internacionais – “europeus e outros”, vincou ­-, se prossiga o “rigor das finanças públicas e se acelere a trajectória económica que o país vem seguindo desde os últimos anos”.

O presidente da APB salientou ser “absolutamente necessário criar condições para atrair, mobilizar e dar segurança aos investidores”, mas também é preciso que “haja um grande contributo do Governo para a estabilidade do sistema financeiro”. Vincando que a criação de riqueza depende do investimento e do financiamento”, Faria de Oliveira defendeu que o país, as empresas e os cidadãos precisam que haja um sistema financeiro “sólido e rentável”, com “bancos fortes”. Porque, argumentou, “não há possibilidade de melhorar a condição de vida dos portugueses se não houver criação de riqueza, que antecede sempre a sua distribuição”.

Faria de Oliveira foi o último dos sete banqueiros ouvidos nesta quarta-feira por Cavaco Silva sobre as “condições de financiamento da economia portuguesa no quadro da rejeição" do programa de Governo e sobre as "orientações de política económica e financeira essenciais para assegurar a estabilidade do sistema financeiro", descreveu a Presidência.

O presidente do Millennium BCP, Nuno Amado, defendeu que os dois aspectos mais importantes a que um futuro Governo deve dar atenção são a estabilidade nas políticas, em especial nas fiscais para aumentar a confiança dos investidores, e o cumprimento dos “compromissos mais importantes” a nível europeu – e para isso o Orçamento [do Estado] tem um papel “charneira”.

Eduardo Stock da Cunha, presidente do Novo Banco, recusou qualquer relação entre a natureza do próximo Governo e o processo de venda. Preferiu focar-se em defender que “Portugal terá de continuar a garantir junto dos mercados internacionais que honra os seus compromissos, que é uma pessoa de bem” e manter a trajectória de consolidação das contas públicas. Questionado sobre a demora do Presidente em decidir, vincou que Cavaco Silva “sabe bem os prazos de que dispõe; compete-nos a nós aceitar e respeitar as opções que tem nessa matéria e assumir isso com a maior das tranquilidades”. Não há porém, na lei, quaisquer prazos para que o Chefe de Estado decida sobre o assunto.

À necessidade de estabilidade do sistema financeiro defendida por todos, o presidente da Caixa Geral de Depósitos, José de Matos, acrescentaria a “estabilidade macroeconómica em geral para o país". "Nós somos um banco da economia social e por isso preocupam-nos os impactos sociais de um clima de instabilidade e de retrocesso", vincou o presidente do Montepio Geral, José Félix Morgado, sem especificar que tipo de Governo traria essa instabilidade. Também numa declaração sem direito a perguntas, António Vieira Monteiro, do Santander Totta, defendeu que Portugal precisa de um Governo "forte e estável” e salientou a importância fundamental da diminuição do desemprego e a justiça social - a mesma que Passos disse ser o centro da acção do seu novo Governo - para o desenvolvimento do país.

Fernando Ulrich, do BPI, considerou que Passos fez um “excelente trabalho” desde 2011, mas “confia” que António Costa, se for nomeado primeiro-ministro, terá o “sentido de responsabilidade necessário” para manter o “rigor das finanças públicas e a garantia da estabilidade do sistema financeiro”.

Economistas e ex-ministros quinta-feira, partidos na sexta
Os conselheiros de Estado escolhidos por Cavaco, Vítor Bento e António Bagão Félix, assim como os antigos ministros das Finanças do PS Fernando Teixeira dos Santos, Luís Campos e Cunha, Daniel Bessa, e do PSD João Salgueiro, e o antigo ministro da Economia Augusto Mateus (PS) são os economistas convidados por Cavaco Silva para audiências nesta quinta-feira. São quatro ministros de governos socialistas e dois de executivos sociais-democratas. Amanhã será a vez dos sete partidos com assento parlamentar.

Daniel Bessa (PS) defendeu há pouco tempo não ser bom ter um Governo de gestão, e que este é antes uma “solução de recurso", que poderá acabar em “inflação”. O também socialista Campos e Cunha disse em Outubro estar “relativamente convencido de que [um governo à esquerda] nunca acontecerá”. Seria um “saco muito estranho” e uma solução “possível” mas que não lhe agradava muito prometia ser “duradoura” para o país.

Teixeira dos Santos afirmou há semanas que "a cor política do Governo não será o que mais importará aos agentes económicos. Será, isso sim, dissipar incertezas criadas" e que maior desafio de governo do PS é repor a confiança interna e externa. E o economista Augusto Mateus considerou “muito positivo” que a nova composição do Parlamento traga a “oportunidade para haver uma relação mais interactiva entre os partidos e para colaborarem mais uns com os outros naquilo que é do interesse nacional". Mas avisou: "Não podemos correr o risco de deixar que os mercados, sobretudo os que financiam a economia portuguesa, convirjam para uma situação de desconfiança sobre o futuro da nossa economia. É algo, obviamente, que deve ser profundamente acautelado."

À direita, Bagão Félix acusou António Costa de estar a fazer uma “batota eleitoral” ao querer impor um Governo de iniciativa do PS. João Salgueiro, embora admita que um Governo de “maioria de esquerda consistente podia ser uma boa experiência, ainda que arriscada”, rejeita a eficácia de “um simples apoio parlamentar” que “dificilmente será estável e penaliza, em especial, o PS”. Adivinha um “estado de graça de seis meses” com a complacência da Europa, “mas depois vamos pagar a conta”, avisa.

A audição dos partidos costuma ser o último passo do Presidente antes de anunciar a sua decisão, mas Cavaco Silva poderá ainda convocar o Conselho de Estado, para o que precisa de três dias de antecedência. com Sérgio Aníbal

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