Protecção de dados pessoais, o novo eldorado da Suíça
“Os dados são o novo eldorado da Suíça. Há um verdadeiro boom”, analisa Franz Grüter, director-geral do Green.ch, uma das principais empresas suíças especializadas no armazenamento de dados pessoais, com um crescimento anual de 30%.
Os escândalos de espionagem generalizada, revelados pelo ex-consultor da Agência de Segurança Nacional (NSA) americana Edward Snowden, colocaram a nu, especialmente para as empresas, a necessidade de protegerem os seus dados pessoais, algo de que a Suíça conta tirar partido.
“Os clientes têm necessidade de confiança, discrição, fiabilidade e estabilidade. Estas são as características deste país desde sempre”, acrescenta Franz Grüter, segundo quem, na Suíça, foram investidos mil milhões de euros em centros de dados informáticos nos últimos cinco anos.
Com 64 centros de dados contra os 1151 na União Europeia (segundo o site datacentermap), a confederação helvética ocupa o quinto lugar europeu.
“Um estado que oferece um nível de protecção elevado às empresas oferece igualmente vantagens económicas que não são negligenciáveis”, afirma Jean-Philippe Walter, adjunto na comissão federal de protecção de dados e da transparência. “A Suíça tem todo o interesse em colocar-se acima do nível europeu em termos de regulamentação, por razões económicas”, acrescenta.
Relocalização
Nesta área, ter oportunidades económicos passa, antes de mais, por um regresso da confiança nos Estados. “É primordial restaurar a confiança nos direitos fundamentais como a reserva da vida privada nos estados democráticos, pelo que é necessário saber o que acontece aos nossos dados”, sublinha Jean-Philippe Walter
O contexto jurídico é bastante favorável à Suíça: a lei sobre protecção de dados, uma das mais restritivas do mundo, impede qualquer administração de ter acesso a informações pessoais sem a autorização de um juiz.
Por isso, várias empresas estrangeiras não hesitam em relocalizarem-se na Suíça. É o caso da Multiven, um dos líderes mundiais de manutenção de redes de Internet, que trocou Silicon Valley, na Califórnia, EUA, por Zurique, em 2009. “Mudámo-nos para a Suíça, antecipando já este futuro propício”, explica Deka Yussuf, presidente da Multiven.
“Prevemos um futuro em que indivíduos, empresas e organizações do mundo inteiro procuram alojar os seus activos numéricos (propriedade intelectual, invenções, segredos comerciais, etc) na Suíça, transformando o país num santuário de activos físicos (dinheiro, ouro, arte) em santuário digital. Nos próximos 25 anos, a maioria dos activos registados na Suíça serão numéricos”, acrescenta Deka Yussuf.
Quadro legal protector
Outras empresas, como a ProtonMail, que desenvolve um sistema de email cifrado, e que conta já com “mais de 300 mil utilizadores em todo o mundo”, implantaram-se por causa do quadro legal ser protector.
“A cultura de respeito pela vida privada é muito importante. As recentes declarações feitas pelo primeiro-ministro britânico, David Cameron, e pelo presidente americano, Barack Obama, sobre interditar a encriptação que seja inacessível aos governos, seriam impensáveis na Suíça”, prevê Andy Yen, director da ProtonMail.
Ainda durante 2015, a operadora de telecomunicações suíça Sunrise vai repatriar os seus serviços e deixará de trabalhar com o gigante Google, a quem tinha entregue a gestão dos serviços de mensagens.
“É preciso admitir que, nas sociedades actuais, a protecção total e absoluta é impossível” salienta Jean-Henry Morin, professor de sistemas de informação na Universidade de Genebra, fazendo referência ao recente ataque informático que afectou 47 mil empregados da Sony.
Este professor espera que a Suíça se torne um centro mundial de dados, mas considera que deveria ter acordado há dez anos. É que, dentro de algumas semanas, será aprovada uma reforma do regime europeu de protecção de dados. Este novo quadro reforçará a legislação sobre o tratamento de dados pessoais dos cidadãos europeus pelas empresas, independentemente da sua localização geográfica e do seu tamanho.
Segundo Jean-Henry Morin, a Suíça poderá, no entanto, aproveitar a “onda” que se seguirá com o problemático armazenamento de dados, que se tornará central na Europa.