Cem mil pessoas contra o Governo nas ruas de Bruxelas

Sindicatos mobilizam-se contra reformas económicas e mudanças na política social. Greve geral marcada para 15 de Dezembro.

Houve confrontos entre a polícia e os manifestantes
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Houve confrontos entre a polícia e os manifestantes Francois Lenoir/Reuters
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Cem mil pessoas saíram à rua contra a política do Governo Yves Herman/Reuters
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A multidão partiu montras e incendiou carros Francois Lenoir/Reuters
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A polícia tentou dispersar a multidão com canhões de água e gás lacrimogéneo Francois Lenoir/Reuters
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O Governo quer baixar os gastos sociais Francois Lenoir/Reuters

Degenerou em violência o protesto desta quinta-feira em Bruxelas (Bélgica) contra as reformas económicas e sociais anunciadas pelo novo Governo. A polícia avançou contra a multidão — mais de 100 mil pessoas — com gás lacrimogéneo e canhões de água e os manifestantes partiram vidros e incendiaram carros.

É um protesto sem precedentes nos tempos mais recentes, devido à mobilização conseguida pelas três maiores centrais sindicais. Só em 2001 a capital belga viu tanta gente na rua e, nessa altura, a manifestação foi contra a União Europeia e contou com muitos milhares de estrangeiros.

Desta vez, o alvo é o Governo liderado por Charles Michel, uma coligação entre o partido liberal francófono (M.R., de Michel) e três formações flamengas (os nacionalistas do N-VA, os democratas-cristãos do CD&V e os liberais Open VLD). O Governo tomou posse a 11 de Outubro e anunciou um programa de reformas que vão afectar as políticas sociais e as leis do trabalho. Estão previstas, entre outras, alterações nas prestações sociais, um aumento na idade da reforma e mudanças no regime que indexa anualmente os salários à subida do nível de vida.

Os três sindicatos — democratas-cristãos, socialista e liberal — convocaram todos os sectores profissionais e disseram que o protesto é "um acto de resistência" contra as propostas do Governo, que é acusado de ter feito "um pacto anti-social, desequilibrado e injusto".

O primeiro-ministro emitiu um comunicado convidando os sindicatos para o diálogo esta quinta-feira — que foi aceite, segundo o jornal Le Soir, mas sem que a agenda de protestos tivesse sido suspensa.

Estão marcadas greves sectoriais para 24 de Novembro (em Liège, Limburgo e Antuérpia) e para Dezembro (Namur, Hainaut e Flandres Oriental e Ocidental). No dia 15 de Dezembro deverá realizar-se uma greve nacional.

"Esta é a mais importante mobilização dos últimos anos", disse Marie-Helène Ska, da central CSC. "O que me impressiona é a presença de pessoas que, por norma, não se manifestam", disse Ska, citada pelo L’avenir.net. "No clima de evasão fiscal reinante, há que encontrar um equilíbrio. O peso [da austeridade] não pode ser todo sustentado pelos ombros dos trabalhadores."

Marc Goblet, secretário-geral do FGTB, disse: "Se este plano de acção não for suficiente [para demover o Governo], outro será traçado." "Mas para pararmos os protestos é preciso que as nossas prioridades sejam respeitadas: suspender a alteração na indexação dos salários, preservar a Segurança Social e introduzir um regime de impostos mais justo e equitativo."

Elio di Rupo, da oposição social-democrata — ex-primeiro-ministro, que em 2011 e 2013 também foi alvo de manifestações devido a programas de austeridade —, esteve na manifestação e exigiu a demissão imediata do executivo.
 

Desmantelar o país

O Governo do primeiro-ministro Charles Michel é apenas o segundo liderado por um liberal francófono desde 1938. Com 38 anos, o líder do Movimento Reformador é também o primeiro-ministro belga mais jovem de sempre, à frente de um governo de coligação invulgar, onde o partido mais forte são os nacionalistas flamengos da Nova Aliança Flamenga (N-VA), cujo primeiro objectivo é a existência de uma Flandres independente.

 Na coligação entram ainda os separatistas da Aliança Neoflamenga e os cristãos-democratas flamengos. O único partido francófono é o do primeiro-ministro, que tomou posse em meados de Outubro, com um programa que Bart de Wever, líder da N-VA, disse ser o “dos seus sonhos”. Julga-o capaz de pôr em prática uma política liberal-conservadora, que reduza o peso do Estado federal e acelere o desmantelamento do país.

Dois separatistas flamengos fizeram-se notar logo nos primeiros dias pelos seus laços com o passado colaboracionista nazi – um assunto não resolvido na Bélgica. O ministro do Interior Jan Jambon, figura de proa da N-VA, deu uma entrevista em que dizia que flamengos que colaboraram com os nazis “tiveram sem dúvida as suas razões”, e que era preciso “perdoar os erros” destas pessoas, animadas pelo ideal da independência da Flandres. Jambon, visto numa reunião de antigos combatentes ao lado da Alemanha nazi, tem boa companhia em Theo Francken, secretário de Estado da Imigração, que participou na festa do 90º aniversário do fundador de uma milícia de extrema-direita, diz o Le Monde.
 

   





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