Bloco errado?

Pode bem ser que os actuais dirigentes e militantes do BE sintam que o seu é o bloco certo. E se o actual BE estiver a reflectir correctamente o pensamento ideológico maioritário dessas pessoas, então, tem razão. Porém, aos olhos de muitos eleitores que já votaram BE, este é um bloco profundamente errado

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Enric Vives-Rubio

O Bloco de Esquerda é um partido político que foi criado através da junção de pequenos partidos da extrema-esquerda portuguesa (antes incompatibilizados pelos seus dogmas ideológicos) que, dos confins da sua insignificância eleitoral, decidiram juntar forças para tentarem a relevância política. E aquilo que começou timidamente, e com parcos resultados eleitorais, acabou por demonstrar ser um partido político com reais possibilidades de crescimento. Em eleições sucessivas, o BE foi ganhando eleitorado e, consequentemente, impacto mediático.

Lutando, inicialmente, muito por questões socio-culturais como o direito das minorias ou pela despenalização do aborto, e posicionando-se como uma força de protesto jovem e de mudança cultural, foi capaz de apelar a muitas pessoas: desde comunistas desiludidos, passando por alguma da ala esquerda socialista, até eleitores de esquerda sem prévia simpatia partidária. Todos viram no BE a possibilidade de algo novo, que viesse refrescar o estagnado sistema partidário nacional.

Apoiado na capacidade mediática de figuras como Francisco Louça, Miguel Portas, Fernando Rosas, José Manuel Pureza ou Ana Drago, o BE foi criando um espaço próprio. E isso rendeu-lhes diversas vitórias eleitorais (sempre mais difíceis ao nível autárquico por falta de implantação nacional e de estrutura).

A verdade, porém, é que, do ponto de vista político-ideológico, a mensagem do Bloco nunca foi muito clara. Ou melhor, a mensagem e imagem mediáticas que foram criadas (e que trouxeram muito eleitorado ao Bloco) acabavam por ser dissemelhantes daquilo que, realmente, era o projecto ideológico do BE.

O que muitos portugueses queriam era uma força de esquerda social-democrata (logo capitalista) que estivesse disponível para fazer pontes com o PS, na ambição de colaborar em soluções governativas, de poder, à esquerda. E, para isso, há massa crítica eleitoral, já demonstrada em eleições como as Presidenciais em que Manuel Alegre teve um milhão de votos.

Quando o BE duplicou os seus votos, aquando da segunda legislatura de José Sócrates, grande parte dos votantes do Bloco foram sociais-democratas, nunca extremista da esquerda. Eram eleitores que votavam PS, PCP ou que se abstinham e que se mobilizaram para votar BE, na expectativa de que o BE fosse capaz de puxar o PS para a esquerda, numa solução governativa. Ao ter ficado demonstrado que não era essa sua a natureza, esvaziou-se o seu espaço. Ou seja, a tendência será para o BE ficar dimensionado pela proporção de portugueses de extrema-esquerda.

É evidente que a perda de visibilidade (por diferentes razões) de figuras carismáticas como Louçã, Portas ou Ana Drago e as querelas com Daniel Oliveira ou Rui Tavares ajudaram às quedas eleitorais que o Bloco tem sofrido. Mas a profunda razão dessa perda tem a ver com a ostentação da verdadeira essência do Bloco: uma agremiação de partidos de extrema-esquerda.

Pode bem ser que os actuais dirigentes e militantes do BE sintam que o seu é o bloco certo. E se o actual BE estiver a reflectir correctamente o pensamento ideológico maioritário dessas pessoas, então, tem razão. Porém, aos olhos de muitos eleitores que já votaram BE, e que tinham a expectativa/percepção de que o BE seria algo que acabou por demonstrar não ser, este é um bloco profundamente errado.

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