Intermediários é o que mais há no negócio da nova imigração chinesa rica

Negócio envolve agências de emigração chinesas, escritórios de advogados portugueses, imobiliárias portuguesas e chinesas instaladas em Portugal e consultores de investimento.

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Em pleno Chiado, a empresa Libertas abriu uma nova loja da rede Casa em Portugal Daniel Rocha

A obtenção de um visto gold implica um conjunto de procedimentos legais e administrativos, e envolve um conjunto elevado de intermediários, que podem fazer disparar o custo final do investimento e dificultar a sua rentabilização futura, constatou o PÚBLICO numa consulta a vários agentes no mercado.

Do lado português, grandes escritórios de advogados, mediadoras imobiliárias portuguesas e chinesas instaladas em Portugal e consultores de investimento mobilizaram-se para aproveitar este novo negócio. Algumas destas entidades foram constituídas recentemente e especificamente para isto.

Ainda em terreno nacional, estão a proliferar redes informais de angariação de clientes, que incluem funcionários de embaixadas, empregados de hotéis ou de conhecidas casas de alterne de Lisboa, e cidadãos estrangeiros radicados em Portugal, com destaque para a comunidade chinesa, contam todos os que conhecem este negócio e com quem o PÚBLICO falou, mas pedindo anonimato.

Do lado chinês, existem as agências de emigração públicas e privadas, estas últimas a trabalhar em regime de subcontratação ou licenciadas pelas primeiras.

A ofensiva para conquistar clientes faz-se essencialmente em relação aos chineses, dado que nas restantes nacionalidades são os investidores que, na maioria dos caso, procuram directamente o país, envolvendo depois os mediadores, os advogados ou outros intermediários.

Em relação ao grande mercado chinês ­- onde é elevado o número de fortunas, e grande a preocupação de colocar dinheiro no exterior, por receio de algum retrocesso na actual política de liberalização da economia ­­- a promoção do negócio é feita nos dois sentidos.

Os grandes escritórios de advogados/mediadoras e consultoras portugueses estão a abrir instalações ou a deslocar-se regularmente ao país asiático para apresentar imóveis, que têm de se encontrar em condições de venda imediata. Esta característica é fundamental para a concretização do negócio, porque os chineses não percebem e, por isso, não aceitam, que uma venda fique dependente de burocracias, como a falta de licença de habitabilidade, indispensável à realização da escritura.

Na iniciativa nacional, são oferecidos pacotes de imóveis para residência de chineses, onde as exigências de localização são importantes, e pacotes para rendimento (arrendamento), onde o critério de toda a envolvente de localização pesa menos que a taxa de rentabilidade. Neste aspecto, os chineses exigem taxas de rentabilidade da ordem dos 4 a 5%, comparativamente a investidores angolanos ou brasileiros, que pretendem valores próximos ou mesmo acima dos 10%. Os russos procuram o país essencialmente para residência familiar, temporária ou permanente.

Agências de emigração “oferecem” investidores
Do lado chinês também há prospecção activa de negócios, através das agências de emigração. Estas encarregam-se de convidar potenciais investidores, que depois reencaminham para as entidades portuguesas ou agências chinesas já a trabalhar em território português.

Despois de identificados os potenciais clientes, da visita aos imóveis e da aceitação do preço, o primeiro passo é a contratação dos serviços de um advogado, para dar início às formalidades legais. O segundo passo é a abertura de uma conta num banco português e, neste caso, o BES e o BCP têm merecido a preferência, que muitas vezes é determinada apenas pela proximidade das agências ao escritório de advogados.

Seguem-se as primeiras diligências para pedir o ARI, com a deslocação dos potenciais beneficiários (não é possível a representação por terceiros) aos Serviços de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), para recolha de dados biométricos (como impressões digitais, entre outros).  Estes dados são indispensáveis para a emissão de um cartão de identificação, que não é dourado, mas sim cor-de-rosa, muito semelhante ao cartão de cidadão português, e que é o documento que permite a entrada e estadia em Portugal e a circulação no espaço Schengen. Este cartão inclui um número de identificação fiscal.

Cumprida esta formalidade, segue-se a assinatura de um contrato de promessa de compra e venda e o pagamento de um sinal que, nos negócios que seguem a via mais formal, é paga pelas agências de emigração. Concluída esta fase, o investidor regressa à China e entrega o contrato de promessa de compra e venda no seu banco, e dá instruções para que seja feita uma transferência directa para a conta aberta em Portugal.

A China tem limitações à saída de capitais, mas estes investimentos, designadamente a compra de imóveis para residência, têm sido facilitados, pelo interesse que o país tem em alargar a sua influência ao mundo ocidental. 

Quando o dinheiro chega a Portugal, é marcada a escritura de venda do imóvel (ou imóveis, dados que em alguns casos são comprados vários apartamentos no mesmo prédio, de forma a atingir os 500 mil euros) e só com cópia desse documento é pedida a emissão do ARI.

Nesta fase entram novamente em acção os escritórios de advogados, que surgem com representantes legais dos investidores estrangeiros, uma exigência que visa assegurar o pagamento de impostos.

Os advogados passam a ter um negócio extra, que resulta do serviço de pagamento dos impostos e posteriores pedidos de renovação das autorizações, mas também, no caso dos imóveis para investimento, o recebimento de rendas e o pagamento de encargos, como o condomínio.

“Informalidades” que agravam o custo do investimento
A obtenção dos vistos pela via formal implica o pagamento de várias comissões, a começar pelas agências de emigração chinesas, e a acabar nos advogados, mediadores, consultores. Estas comissões correspondem a uma percentagem do valor do imóvel, podendo atingir percentagens acima da prática normal do mercado. A actividade tradicional de mediação imobiliária envolve comissões que rondam os 5%, mas no caso dos vistos gold têm sido referido valores da ordem dos 20 a 25%.

A par dos negócios formais, contam-se muitas histórias de “informalidades”, mas também sob a condição de anonimato. Como é o caso de imóveis com preços de mercado de 300 mil euros vendidos acima dos 500 mil euros para permitir o ARI, mas em que o proprietário acaba por devolver ao investidor parte do excesso de valor declarado na escritura, algumas vezes sem acautelar o acerto de mais-valias que vai ter de fazer com as Finanças. São referidas ainda saídas clandestinas de dinheiro da China, através das regiões administrativas especiais de Hong Kong e Macau. Estas saídas de capital terão um custo aproximado de 20%. Se a este custo forem somadas as comissões de 20 a 25 por cento aos intermediários, praticadas com frequência, o custo do investimento pode subir para 45% do montante a realizar. Ou seja, para garantir em Portugal a aquisição de um imóvel no valor de 600 mil euros, o empresário pode gastar mais de 900 mil, o custo da lavagem do dinheiro.

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