As Sextas de Bicicleta de Mariana Carvalho

Tudo começou com uma bicicleta na garagem e hoje já são oito, que servem as deslocações citadinas dos filhos, da própria e dos pais

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Mariana Carvalho, bióloga, com 36 anos e dois filhos de seis e nove anos regressou a Lisboa há dois anos e nunca mais deixou a bicicleta. Experimentou, e, mesmo com os dois filhos e a viver a meio da colina entre os Anjos e a Graça, nunca usa o automóvel durante a semana.

Activista convicta da mobilidade em bicicleta, promove-a sempre que pode junto da família, amigos e colegas de trabalho – tudo começou com uma bicicleta na garagem e hoje já são oito, que servem as deslocações citadinas dos filhos, da própria e dos pais. Venceu todos os mitos relativos à utilização da bicicleta e é um exemplo claro de uma mobilidade sustentável, tendo contribuído para uma melhoria do seu estilo de vida. Por todas as razões, e acima de tudo porque a faz sentir muito mais feliz.

O que te levou a começar a usar a bicicleta para te deslocares?

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Voltei para Portugal há cerca de dois anos e andava preocupada com o facto de ter de usar o carro diariamente, porque a minha experiência de conduzir em Lisboa era exasperante – muito trânsito, falta de estacionamento, um condicionamento que não queria de todo sentir, depois de quatro anos em ritmo tropical - vim de São Tomé. Tinha todas as desculpas para usar o automóvel: dois filhos para deixar em duas escolas separadas, local de trabalho na Tapada da Ajuda, no ponto mais alto da cidade e a mais de dez quilómetros de casa, mas… a vontade era nula. Conhecia quem usasse a bicicleta para se deslocar na cidade e em menos de um mês resolvi experimentar. Percebi que conseguia, que era mais fácil do que parecia, e não quero outra coisa desde então.

De que formas usas a bicicleta à sexta-feira?

Uso a bicicleta praticamente para todas as deslocações. À sexta, geralmente, vou até à Tapada da Ajuda, depois de deixar os miúdos na escola, e de lá regresso para os ir buscar. Se sair, também o faço preferencialmente de bicicleta, ou alternativamente a pé. Nunca uso o carro durante a semana.

Quando te inscreveste no Sexta de Bicicleta?

No início da iniciativa, que achei excelente. Acho que sem experimentar ninguém sabe o bom que é, e as pessoas têm geralmente esta necessidade de ter uma desculpa para o fazer. Ao inscrever-me seria mais uma a juntar-se a um movimento que pretende estimular a iniciativa de sair de bicicleta e que é o mote para um uso mais regular. É mais fácil se nos sentirmos acompanhados, claro.

Como te deslocavas antes?

Enquanto vivi em Lisboa (em vários períodos alternados ao longo da minha vida), deslocava- me geralmente a pé ou de transportes. Desde que tenho filhos que tenho carro e utilizava-o quando estava na cidade. Mas eles sabem o quanto eu refilava com o trânsito e a falta de liberdade que era conduzir… para além da questão ambiental, que também me preocupa muito.

Que tipo de bicicleta ou equipamento?

Tenho duas bicicletas (principais). Uma Globe/Specialized, um modelo citadino com um porta-bagagens reforçado, que serviu para dar boleia ao meu filho mais novo para a escola durante os primeiros tempos (até ele requerer independência ciclística) e que uso quando tenho de fazer compras ou transportar algo (ou alguém). Nessa bicicleta adaptei como alforge uma mochila de 1911 do meu bisavô, que foi médico na primeira guerra mundial. E tenho a menina dos meus olhos, uma Raleigh amarela com a minha idade, um modelo sul-africano, restaurada por um amigo meu e que foi uma prenda - uma bicicleta linda, rápida e leve.

O que muda na tua vida nas sextas-feiras em que levas a bicicleta contigo?

A minha vida mudou a partir do momento em que adoptei a bicicleta como meio de transporte. À sexta-feira e em todos os outros dias.

Existem alguns mitos (sobre a utilização da bicicleta) que tenhas vencido?

Todos. Como a maior parte das pessoas, tinha dúvidas relativamente aos declives, à chuva, ao trânsito. Nada como experimentar para perceber que são ultrapassáveis ou, na pior das hipóteses, que se podem gerir sem qualquer problema (por exemplo, se chover muito, podemos sair a pé ou de metro, se a subida for muito inclinada, podemos sempre levar a bicicleta na mão um bocadinho, não é vergonha nenhuma. E de certeza que a seguir vem uma descida). Mas mais do que eu tê-los vencido (eu sou particularmente determinada quando quero mesmo fazer algo), a minha mãe e os meus filhos adoptaram a bicicleta e adoram. Acho que prova que não passam disso mesmo, de mitos.

O que poderia melhorar nos percursos que realizas?

O civismo de muitos condutores, a qualidade do piso, o acesso e a estrutura das ciclovias existentes.

Um momento em que te sentes mesmo bem a andar de bicicleta.

Todos. Adoro principalmente passar à beira-rio de manha e ao pôr do sol, andar silenciosamente a ver a passarada em caminhos com vegetação, e tenho imenso prazer em poder parar, quando encontro alguém e fico na conversa ou sigo com a bicicleta na mão.

Uma pessoa da praça pública que gostarias de ver a andar de bicicleta e porquê?

Os responsáveis pelo ordenamento e infraestruturas na cidade. Para que não cometessem os erros grosseiros de planeamento que são óbvios um pouco por todo o lado e que muitas vezes são anunciados como grandes obras. E para que interiorizassem que a bicicleta não é só para os outros, é possível e desejável para todos. A polícia de trânsito, também. Ficavam mais acessíveis aos cidadãos, mais alerta, e mais facilmente se aperceberiam e lidavam com o abuso que é cometido pelos automobilistas um pouco por todo o lado: na estrada, nos espaços pedonais, passadeiras, etc.

O que tens a dizer a quem diz que andar de bicicleta na sua cidade é impossível?

Que não o diga sem conhecimento de causa. Não acho possível que o diga, se já experimentou, porque não é. De todo.

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