A corrida de Chris Christie à Casa Branca pode ter parado num engarrafamento

Corte de vias provocou atrasos na assistência médica e foi uma vingança política contra mayor da oposição. Governador de Nova Jérsia diz que foi enganado pela sua equipa.

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O governador Chris Christie pediu desculpas e disse sentir-se "envergonhado e humilhado" Jeff Zelevansky/AFP

O governador do estado norte-americano de Nova Jérsia, Chris Christie, gostava de dizer que a sua honestidade e frontalidade compensavam o seu estilo tempestuoso e abrasivo, tantas vezes manifestado em público perante jornalistas, em conferências de imprensa, e até mesmo em discussões com potenciais eleitores.

Já poucos tinham dúvidas de que este republicano, capaz de fazer acordos com democratas e sempre pronto a criticar o seu próprio partido por não seguir o mesmo exemplo no Congresso, iniciara uma corrida imparável para a candidatura à Presidência dos EUA em 2016, mas a viagem está agora em risco de ficar a meio. E a culpa é do trânsito, mais precisamente de um gigantesco engarrafamento que entupiu durante quatro dias um dos acessos à Ponte George Washington, uma das mais movimentadas do mundo, que liga Nova Jérsia e Nova Iorque.

Na semana de 9 a 13 de Setembro do ano passado, os cidadãos do condado de Bergen, no lado de Nova Jérsia, viram as três faixas da sua entrada reduzidas a apenas uma, o que provocou longas filas e dificultou chegadas ao trabalho e a passagem de ambulâncias e de autocarros escolares. Segundo o jornal local The Bergen Record, o coordenador das emergências médicas queixou-se ao mayor da localidade de Fort Lee – a mais afectada pelo encerramento das vias – de que o tempo de assistência quase duplicou nesses dias, de uma média de quatro minutos para sete minutos. Num dos casos reportados, uma mulher de 91 anos que foi encontrada inconsciente e acabou por morrer à chegada ao hospital.

Indignados com a situação, habitantes e líderes políticos de Fort Lee pediram explicações ao gabinete do governador e foi aberta uma investigação. Até quarta-feira, Chris Christie tinha sempre desvalorizado a questão, atribuindo a causa dos engarrafamentos a um exercício da Autoridade Portuária de Nova Iorque e Nova Jérsia.

Vingança política?
Acusado pela oposição de envolvimento no caso, com o objectivo de punir o mayor de Fort Lee, o democrata Mark Sokolich – alegadamente por este não ter apoiado a sua recandidatura a governador de Nova Jérsia –, Chris Christie chegou a ridicularizar a situação, em resposta a uma pergunta de um jornalista numa conferência de imprensa, em Dezembro: "Fui eu que pus lá os cones. Estava disfarçado, mas estava lá, vestido com um macacão e um boné, a pôr os cones. Não estás mesmo a falar a sério, pois não?"

Mas desde quarta-feira, e numa questão de horas, o Chris Christie tempestuoso e abrasivo que todos conheciam e muitos admiravam deu lugar a uma versão mais em linha com um governador acossado que vê a sua ambição política posta em causa. Numa série de emails publicados em primeira mão pelo The Bergen Record e reproduzidos pela generalidade dos media norte-americanos – o primeiro dos quais enviado a 5 de Agosto de 2013, um mês antes do corte de vias no acesso à ponte –, uma das mais próximas colaboradoras de Christie, Bridget Anne Kelly, lançava o aviso a David Wildstein, representante do governador na Autoridade Portuária: "Chegou a hora de haver problemas de trânsito em Fort Lee." "Entendido", respondeu Wildstein.

A leitura dos emails (que apresentam várias passagens censuradas) não indica que o governador estivesse ao corrente das intenções dos seus colaboradores mais próximos, mas será difícil livrar-se de uma de duas acusações: ou sabia e protagonizou uma vingança mesquinha, que vai contra tudo o que sempre defendeu em público; ou não sabia e então não tem controlo sobre a sua equipa.

Numa primeira reacção, na quarta-feira, Chris Christie reafirmou que não sabia de nada e prometeu responsabilizar todos os envolvidos. "Sinto-me ultrajado e profundamente triste por saber que não só fui enganado por um membro da minha equipa, como esta conduta imprópria e não autorizada foi feita sem o meu conhecimento. Este comportamento não é representativo da minha administração e as pessoas serão responsabilizadas pelas suas acções", prometeu o governador de Nova Jérsia.

Já nesta quinta-feira, pediu desculpas aos cidadãos e declarou-se "envergonhado e humilhado" pela forma como "algumas das pessoas" da sua equipa agiram e anunciou que despediu Bridget Anne Kelly, a autora do email que desencadeou o escândalo. "Despedi-a porque ela me mentiu", afirmou. Para além da vergonha e da humilhação, o governador de Nova Jérsia disse-se ainda "espantado com a miserável estupidez demonstrada neste caso".

Na mesma conferência desta quinta-feira, Chris Christie disse que se reuniu com a sua equipa há um mês e que deu uma hora a todos os seus colaboradores para que lhe dissessem se tinham alguma responsabilidade no engarrafamento de Setembro. "Disse-lhes que iria dar uma conferência de imprensa uma hora depois, e que se ninguém me desse informações em contrário, iria dizer que ninguém da minha equipa estava envolvido nesta questão. (…) Isso acabou por se revelar ser uma mentira."

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