Três meditações à volta da morte de J.R.

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Larry Hagman Reuters

Se nos lembramos de Dallas, lembramo-nos em grande parte por causa de J.R. e do gozo quase teatral que Larry Hagman tinha em sublinhar essa vilania clássica.

Primeira: Em 1978, quando Dallas começou na cadeia CBS, os tempos eram outros. Portugal ainda tinha apenas dois canais estatais, estava a acordar do longo pesadelo do regime e a sair das convulsões (pós-)revolucionárias, mas não resistia a fenómenos televisivos como a Gabriela original ou a Visita da Cornélia, que paravam literalmente o país. Dallas era ponto de paragem obrigatória nas noites da RTP-1.

Segunda: Se nos lembramos de Dallas, lembramo-nos em grande parte por causa de J.R. e do gozo quase teatral que Larry Hagman tinha em sublinhar essa vilania clássica. Não foi o único actor a ficar marcado para sempre pelo seu papel televisivo. Mas o seu J.R. tornou-se de tal modo no centro de Dallas que nem mesmo Patrick Duffy, Victoria Principal ou Linda Gray, que com ele contracenavam, são hoje recordados quando pensamos na série. Dallas era J.R., como Gabriela era Sónia Braga. 

Terceira: Iniciada na viragem dos choques petrolíferos dos anos 1970 e da crise dos reféns iraniana, Dallas atingiu o pico durante os anos 1980-1984, correspondendo ao primeiro mandato de Ronald Reagan e à ascensão da economia yuppie, antecipando de alguns anos o greed is good de Gordon Gekko em Wall Street. Como qualquer fenómeno televisivo, foi verdadeiramente um produto do seu tempo. A morte de Larry Hagman é uma espécie de "prego" simbólico no caixão desses tempos. Já não um mistério como o "quem disparou sobre J.R.?" que prendeu milhões de espectadores aos televisores. Apenas um lamento com o seu quê de nostálgico pelo passar do tempo, uma memória de anos mais simples mas apenas aparentemente dourados.
 

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