Qualidade de vida versus austeridade: a Itália

São portugueses e emigrantes em países em recessão económica. Quisemos saber porque razão estes jovens não querem abandonar países que pouco ou nada parecem oferecer, embrulhados num cenário socioeconómico tão negro que nos faz imaginar que a única vontade que existe é a de fugir

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dianjo/Flickr

São 20 horas na cidade de Bergamo e a maioria dos cafés tem as portas encerradas. Em Portugal a constatação é estranha, mas ali, no Norte de Itália, António Oliveira conta que “os italianos têm hábitos sociais muito diferentes dos nossos”.

Foram os aviões que o levaram a emigrar e é como comissário de bordo que quer aproveitar para conhecer novos países e novas culturas. Fala na estabilidade encontrada e na qualidade de vida que Itália lhe oferece. E comprova-o: “se pensarmos que em Portugal o salário mínimo não chega sequer aos 500 euros e que em Itália varia de acordo com a profissão, sendo o mais baixo cerca de 1000 euros e o mais alto cerca de 6000 euros (brutos) e considerando que os bens essenciais custam aproximadamente o mesmo que em Portugal, percebe-se quem consegue ter melhor qualidade de vida”.

É nessa mesma cidade que se encontra Teresa de Oliveira. E quando se lhe fala na grave crise italiana, ela insiste em referir que Itália tem “muitas mais oportunidades de trabalho” e “um ordenado mais justo” do que o português. “Em Portugal o meu dia a dia era trabalhar oito horas, não ter fim de semana, pois tinha que ter outro emprego. E mesmo trabalhando desta forma era apenas, ou quase, para pagar contas. Aqui em Itália trabalho cinco dias, com horário bem flexível, tenho tempo livre e, depois de pagar as minhas contas, tenho dinheiro para outras coisas. Posso viver e não sobreviver”, comprova.

A burocracia, a falta de organização e o incumprimento de regras na Itália não são esquecidas. Mas Carolina Oliveira parece ter encontrado o melhor de dois mundos. Está naquela que é uma das suas cidades favoritas, Veneza, e tem agora a possibilidade de trabalhar na sua área de formação. E apesar de a palavra austeridade ser também parte do dicionário italiano, a docente crê que “a situação económica atual é bastante diferente”. “Apesar da crise, continua a haver emprego e muito dinheiro a circular em Itália”, afirma António Oliveira que, ao olhar para Portugal vê “as pessoas com elevada qualificação, maioritariamente os jovens, a criar uma nova vaga de emigração para países onde estão dispostos a apostar neles, por um salário mais justo”.

O que mudou com a saída de Berlusconi?

Do exterior vemos os números — 10,8% de desempregados, 35,3% de jovens sem trabalho — e lemos os factos: a economia italiana está em recessão. In loco assiste-se às consequências. “Um pouco por todo o país, nota-se uma grande movimentação dos jovens, de cidade em cidade, em busca de um melhor emprego e de melhores condições.” António Oliveira afirma que a população está “contente pela saída de Sílvio Berlusconi, mas não estão muito satisfeitas com o actual governo de Mario Monti”.

“Os jovens italianos também estão a emigrar”, atesta Carolina, acrescentando que “a mudança de governo não é suficiente para resolver a crise da dívida”. “A saída de Berlusconi do governo veio pôr a descoberto aquilo que todos temiam, que a crise financeira do país é bem maior do que aquilo que se pensava e que, durante anos, foi sendo escondida pelo anterior governo. Um pouco como em Portugal, as pessoas queriam uma mudança de governo, mas não querem a austeridade que os novos governos lhes impõem”, reconhece António Oliveira.

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