Oleodutos e gasodutos para contornar o estreito que o Irão ameaça

Foto
Menor consumo e produções alternativas mantém preços do petróleo em mínimos de há mais de cinco anos. Christian Charisius/Reuters

O transporte por terra é a resposta ao risco de um bloqueio no estreito de Ormuz que poderá atirar o preço do petróleo para os 200 dólares por barril.

Esteve para arrancar em Dezembro passado, mas as obras derraparam. O oleoduto de 480 quilómetros de Abu Dhabi que ligará os campos petrolíferos de Habsan até Fujairah, na costa do mar Arábico, deve ficar finalmente operacional entre Maio e Junho, prometem as autoridades do emirado dono da maioria das reservas de petróleo dos Emirados Árabes Unidos (EAU). Por essa altura, se as ameaças se concretizarem, estará a começar o embargo americano e europeu ao petróleo iraniano, que leva Teerão a ameaçar que bloqueará o estreito de Ormuz.

Fujairah fica a 160 quilómetros a sul da zona mais apertada do estreito, milimetricamente fora do espaço do potencial bloqueio iraniano. Serão 1,5 milhões de barris diários de petróleo que os EAU poderão exportar com custos menores. Trocar o carregamento em Abu Dhabi por Fujairah significa poupar dois dias de navegação e 38 mil dólares de frete.

O novo oleoduto da International Petroleum Company (gestora do fundo soberano de Abu Dhabi) está a ser construído pela China Petroleum Corporation, vai escoar 70% da produção do emirado e tem um custo estimado em 3,3 mil milhões de dólares.

A rede de oleodutos e gasodutos cresce no interior da península Arábica, com uma nova geração de projectos, como o de Fujairah, a revelar a preocupação dos países da margem esquerda do golfo Pérsico em encontrar soluções que lhes dêem acesso directo ao oceano Índico.

Os portos de Omã

Omã tem menos recursos petrolíferos do que os seus vizinhos, não chega a exportar um milhão de barris por dia, mas não depende do estreito de Ormuz para vender o seu petróleo e importar mercadorias, uma vantagem que interessa cada vez mais aos seus vizinhos e aliados. Omã tem neste momento em construção uma rede de portos ao longo dos seus 1700 quilómetros de costa para o mar Arábico. Através desta rede, o sultanato cria um novo canal de comunicação, por terra, do Índico para o resto da península Arábica até ao mar Vermelho, mar Negro e Mediterrâneo.

A nova malha de comunicações cria mais uma alternativa à passagem pelo estreito de Ormuz. A grande obra deste programa, e considerada a maior em curso no Médio Oriente, é o porto de Duqm, na costa omanense, que será um dos maiores portos de águas profundas do planeta, com capacidade para receber petroleiros de 600 mil toneladas a partir de 2013.Vai ser a porta de saída do petróleo e do gás da Arábia Saudita e dos EAU, poupando os navios à entrada no estreito de Ormuz.

A rota turca

O Conselho de Cooperação do Golfo, liderado pelos sauditas, tem ainda em construção uma rede de caminhos-de-ferro de mercadorias e passageiros para os cinco países-membros (Omã, Kuwait, Bahrein, Qatar e EAU) com o objectivo de ligar toda a península Arábica e o mundo árabe à Europa através da Turquia. Ancara está em negociações com o Qatar para a construção de um novo gasoduto de Doha até Istambul.

Pelo estreito de Ormuz passa hoje cerca de 30 a 40% do petróleo transportado por mar em todo o mundo. São 14 petroleiros por dia, correspondentes a 17 milhões de barris. Representam a maior parte da produção da Arábia Saudita, o primeiro produtor mundial, dos EAU, do Kuwait, Iraque, Qatar e Irão. No centro das sanções, o Irão tem a quarta maior produção mundial de petróleo e as segundas maiores reservas do mundo em gás natural. Pelo estreito de Ormuz passam também carregamentos significativos de alumínio e de fertilizantes.

Com mais de metade das reservas mundiais de petróleo e 40% das de gás, o Médio Oriente garante hoje um terço da produção mundial de petróleo e 14% do gás natural, na sua maior parte exportados através do estreito de Ormuz.

O país mais dependente da energia do Médio Oriente é o Japão, que compra à região 80 por cento do petróleo que consome e é o segundo maior cliente do Irão, segundo cálculos a partir das estatísticas anuais da BP. A Índia importa diariamente 3,5 milhões de barris, dos quais 2,6 milhões vêm do Médio Oriente, ou seja, 75%. Destes, 320 mil são comprados ao Irão. Depois, vem a China: 38% do petróleo que importa vem do Médio Oriente e um quarto deste vem do Irão, o que faz da China, de longe, o maior comprador a Teerão. A dependência energética da Europa em relação ao Médio Oriente é de 18 por cento, e há três países compradores a Teerão que serão especialmente afectados pelo embargo: Grécia (100 mil barris), Itália (180 mil) e Espanha (160 mil). Os EUA, por seu lado, apenas dependem em 14,6% do crude do Médio Oriente.

"Tudo se confina ao estreito de Ormuz", afirmava recentemente o presidente executivo da Partex, António Costa Silva. É a importância deste ponto estratégico do comércio mundial que também tem sustentado as previsões de que o barril de petróleo pode atingir temporariamente os 200 dólares, praticamente o dobro da cotação actual. Teerão usa este cenário como arma dissuasora; outros, como Daniel Yergin, têm dúvidas.

No último dia do ano passado, o ministro iraniano do Petróleo, Rostam Qasem, disse que os mercados internacionais "vão ter de pagar um preço pesado" pelas sanções e "farão subir o preço do petróleo para os 200 dólares o barril".

Para Daniel Yergin, o economista americano mais ouvido em assuntos de energia, há três novos factores que podem aligeirar a pressão sobre os preços e tornar a sua evolução mais incerta do que no passado. Estes têm essencialmente a ver com a descoberta de reservas não-convencionais e o crescimento gradual de nova oferta. Assim, a tecnologia que revolucionou a indústria de gás natural no final da década passada está a migrar para o petróleo, o petróleo do "pré-sal" no Brasil está a ser explorado e as areias betuminosas do Canadá também.

Sugerir correcção
Comentar