O fim dos vaivéns: um passo atrás?

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O Atlantis é o último vaivém da frota a ser retirado Foto: Stan Honda/Reuters

Pela última vez, um vaivém deixa o rasto de fumo luminoso nos céus para entrar na órbita da Terra. Será este fim um grande erro para um homem e um passo atrás para a humanidade?

O primeiro homem a pisar a Lua não reformulou a sua célebre frase ao descer do módulo de alunagem para fazer valer as suas opiniões. Mas assinou um artigo a criticar as opções políticas do Presidente dos Estados Unidos, por ter deixado a agência espacial norte-americana sem um rumo claro para a próxima década, em que os astronautas terão de ficar em terra, por falta de uma nave que os leve para o espaço.

Neil Armstrong, o primeiro homem na Lua, e Gene Cernan, o último a deixar lá impressas as suas pegadas, juntaram-se a Jim Lovell, o comandante da Apollo 13 - que teve de fazer meia volta quando ia a caminho da Lua, devido a uma avaria - para escreverem, no jornal USA Today, que a política espacial da Administração Obama, que falou apenas em idas a asteróides e a Marte, sem entrar em pormenores, está "substancialmente desorganizada".

Os veteranos astronautas protestam contra a decisão de abandonar o programa Constelação, lançado por George W. Bush em 2004, com o objectivo de regressar à Lua e, mais tarde, enviar astronautas a Marte, depois de aposentar os vaivéns o mais rapidamente possível. Deixar os vaivéns em Terra, após 30 anos de missões, foi uma exigência de segurança clara da comissão que investigou o acidente do vaivém Columbia, em 2003, no qual morreram os sete tripulantes a bordo, quando regressavam à Terra.

O Atlantis é o último vaivém da frota a ser retirado - cabe-lhe a honra da derradeira missão até à Estação Espacial Internacional (ISS), cuja construção foi a tarefa final com que os Estados Unidos se comprometeram.

Quando regressar à Terra, será o fim de 30 anos de trabalho das naves que começaram por ser anunciadas como "os camiões espaciais". Só que nunca foram nada de tão banal.

Mais velhos que o PC

Em 1981, quando se realizou o voo inaugural do Columbia (a IBM lançou o primeiro PC meses depois, um computador com um sistema operativo de 16 bits, o MS-DOS 1.0) as outras nações olhavam para os vaivéns como possíveis naves de guerra, pois o Pentágono tinha sido chamado para participar no seu desenvolvimento. A NASA precisava de apoios para financiar o projecto escolhido, o mais ambicioso, mas para o qual o Congresso não queria dar o dinheiro necessário. Temia-se que servissem para levar armas para o espaço, servindo como a guarda avançada da "Guerra das Estrelas".

Estabeleceu-se um calendário de viagens alucinante de 60 voos anuais, que exigia que até os satélites fossem colocados em órbita por astronautas no vaivém, e não por lançamentos automáticos, com foguetões, como hoje. Essa velocidade furiosa, que exigia mais do que um voo por semana, e o envolvimento dos militares, foi abandonada após o acidente do Challenger, em 1986, que mostrou que a NASA se começava a descuidar na segurança para tentar cumprir as imposições de calendário.

Nos cálculos de 1972, quando o projecto do vaivém foi apresentado, estimava-se que cada voo custasse 10,5 milhões de dólares - afinal, cada um custa mil milhões de dólares. E o sistema escolhido deveria durar apenas dez a 15 anos - não os 30 anos de serviço que completaram as naves, com custos e riscos cada vez mais elevados, sublinha num artigo na revista MIT Technology Review John Logsdon, professor jubilado do Instituto de Política Espacial da Universidade de George Washington e que fez parte da comissão que investigou o acidente do vaivém Columbia.

Erros políticos

Feitas as contas, valeu a pena aos EUA ter o programa destas naves reutilizáveis, que aterram como aviões? "Já escrevi que foi um erro político escolher o vaivém como o centro do esforço espacial após o programa Apollo, sem escolher os objectivos a cumprir", diz Logsdon, citando um artigo seu na revista Science de 1986.

E esse erro pode estar a ser cometido outra vez, diz Logsdon, em alguma sintonia com os astronautas da Apollo, que criticam a falta de definição de locais aonde queremos ir e com calendários definidos: "Dada a pressão do Congresso e da indústria para apressar o desenvolvimento de foguetões capazes de lançar [naves para além da órbita terrestre] sem ter uma estratégia clara sobre como esses veículos serão usados, estamos em risco de repetir esse erro".

Notícia actualizada às 12h57
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