Gérard Depardieu: o "Mammuth" da motocicleta

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Gérard Depardieu em "Mammuth" Gérard Martron/Funny Balloons/Alambique

O actor francês recorda-nos de como pode ser extraordinário numa gentil comédia surreal hoje em ante-estreia na Festa do Cinema Francês

Dois primos que não se vêem há vinte anos e se decidem masturbar mutuamente.Uma sobrinha artista que enterrou o pai no jardim sem dizer nada a ninguém. Um amor perdido que morreu num acidente de moto e cujo fantasma persegue o herói. Uma ladra que atende os telemóveis que rouba. Três caixeiros viajantes que se desfazem em lágrimas num restaurante de hotel. E Gérard Depardieu a colar tudo isto.

Não é exactamente um resumo do que se passa em "Mammuth", mas dá para perceber o ambiente gentilmente absurdista e surreal que a dupla francesa Benoît Delépine e Gustave Kervern (autores do road-movie em cadeira de rodas "Aaltra" e da negríssima sátira económica "Louise-Michel") criaram à medida do actor francês.

Recém-reformado do seu emprego numa fábrica de enchidos, Depardieu descobre que para receber a reforma por inteiro precisa de declarações de actividade que estão em falta no seu processo.

Parte então em viagem na sua velha motocicleta - a Munch Mammuth de 1973 que dá o nome ao filme - para reencontrar os sítios onde trabalhou ao longo dos anos.

É uma viagem, mais do que ao passado, pelo passado da personagem, que Delépine e Kervern filmam em super-16 ampliado e retrabalhado e constroem como uma sucessão de episódios aparentemente espontâneos e desconexos (não nos surpreenderia que parte do filme tivesse sido improvisado). Um reencontro com a sua identidade, uma espécie de porta de entrada para o que a vida ainda lhe pode trazer agora que tem tempo para a gozar.

Depardieu é notável numa personagem que se exprime exclusivamente pela sua presença física. É um daqueles papéis que nos recorda aquilo de que o actor ainda é capaz, e que só décadas de experiência e, sobretudo, de vida permitem enfrentar com tanta confiança e segurança.

"Mammuth" não se consegue verdadeiramente explicar nem descrever, mas deixa-nos com uma espantosa sensação de optimismo que o torna num dos mais estimulantes filmes franceses recentes. Vai chegar a Portugal em Novembro, voltaremos a ele, mas para já fica a chamada de atenção: este "mamute" está longe de ser um fóssil.

 "Mammuth" faz parte do programa de ante-estreias da Festa do Cinema Francês. Passa hoje às 22h00 no cinema São Jorge, em Lisboa, e será igualmente exibido no Porto (cinema Passos Manuel, 22 de Outubro às 19h30), Faro (Teatro Municipal de Faro, 27 de Outubro ás 21h30) e Coimbra (Teatro Académico de Gil Vicente, 9 de Novembro às 23h30).

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