Mais de 800 espécies e muito mais para descobrir

Caçadores portugueses de aranhas

Luís Crespo tem 26 anos e entre trabalhos publicados e a aguardar publicação conta já com nove artigos. Todos falam de aranhas e a maioria dos trabalhos foi feita em colaboração com outro biólogo português, Pedro Cardoso que se encontra a fazer um pós-doutoramento nos EUA. Alguns dos trabalhos em que são co-autores falam de novas espécies para a ciência, outros de novas espécies encontradas em Portugal. Alguns falam de descobertas quase acidentais, outras foram conseguidas após a armação de ciladas e armadilhas. “Isto só mostra como esta área está pouco estudada em Portugal e como a fauna das aranhas é desconhecida no país As aranhas são animais repelentes e mesmo no ambiente científico os especialistas que se dedicam a estas áreas não são notados como os que se dedicam, por exemplo, às borboletas ou aos escaravelhos”. E elas são importantes: “São predadores de topo, excelentes indicadores da qualidade de um ecossistema e bons instrumentos para estudos de impacto ambiental”. Além do papel que têm na natureza, há ainda o potencial no campo do desenvolvimento de novos fármacos feitos a partir dos seus venenos ou ainda a exploração da sua capacidade para produzir a seda natural com da maior qualidade que existe.

No catálogo das espécies existentes em Portugal (http://www.ennor.org/ ), o biólogo Pedro Cardoso contabiliza 779 espécies. Mas, nota Luís Crespo, “se juntarmos as espécies que foram recentemente publicadas e as que estão submetidas a contagem sobe para 819 espécies, sendo que certamente haverá mais para descobrir”. No mundo - de acordo com o World Spider Catalogue, uma base de dados providenciada pelo Museu de História Natural de New York – existem 40 mil e 700 espécies. “Mas as estimativas apontam para que existam mais de 170 mil”.

Biólogo português descobriu novas espécies de aranhas

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A Tegenaria barrientosi mede cerca de sete milímetros e foi uma das novas espécies descobertas DR

Algumas são novas para a Ciência, nunca antes descritas. Outras foram vistas em Portugal pela primeira vez. Luís Crespo, biólogo português, é um dos colectores responsáveis por estas novas descobertas na área dos aracnídeos e pelo aumento de espécies no catálogo nacional de aranhas. Para já, serão mais de 800.

A Tegenaria barrientosi entrou-lhe, literalmente, pela casa dentro. Luís Crespo estava a viver perto do Jardim Botânico, em Coimbra, e reconheceu a pequena aranha que lhe entrou em casa. “Em vez de acabar esmagada por uma vassoura, acabou num tubinho para ser analisada”, conta. Anos mais tarde era uma nova espécie descrita num artigo publicado (no mês passado) na revista de zoologia Zootaxa e que contou com a colaboração de outro biólogo português (Pedro Cardoso) e de Angelo Bolzern, especialista da Universidade de Basel . Mas esta não é a única descoberta do biólogo Luís Crespo no “mal-amado” mundo das aranhas. Há novas espécies encontradas no Paúl de Arzila, no Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros, no Alentejo e até no Parque Natural de Monsanto, entre outros lugares de Portugal.

Um comunicado divulgado hoje pela Faculdade de Ciência e Tecnologia da Universidade de Coimbra apresentava-nos duas novas aranhas para juntar à lista de espécies de todo o mundo. São a Tegenaria barrientosi e a Parapelecopsis conimbricensis e, ainda que existam noutros locais, foram descobertas no Jardim Botânico da Universidade de Coimbra, pelo biólogo Luís Crespo, da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC), através do IMAR. Mas há mais.

Os primeiros exemplares de Tegenaria barrientosi e a Parapelecopsis conimbricensis foram colhidos no Jardim Botânico de Coimbra mas Luís Crespo encontrou mais noutros locais. A Parapelecopsis conimbricensis que é descrita num artigo que aguarda publicação foi colhida também na Reserva Natural do Paúl de Arzila, por exemplo, e no mesmo trabalho o biólogo apresenta-nos outras seis novas espécies para a Ciência encontradas no norte de Portugal e Espanha, no Parque Natural do Douro Internacional, no Parque Florestal de Monsanto (Lisboa) e noutros locais dispersos do país.

No artigo publicado o mês passado na Zootaxa, Luís Crespo apresenta-nos a Tegenaria barrientosi e ainda a Tegenaria incognita , que é também uma nova espécie descrita para a Ciência e que foi encontrada no Parque Natural de Monsanto, em Lisboa. O biólogo português tem ainda um artigo em construção sobre quatro novas aranhas para Portugal e uma nova espécie para o mundo, encontradas nas ilhas Selvagens, outro ainda sobre uma nova espécie para Porto Santo (Madeira), outro ainda sobre uma nova espécie para a Ciência no Alentejo...

Mas, afinal; quantas novas espécies Luís Crespo já descobriu em Portugal? “Não sei... Vou ter de as contar”. Feitas as contas, serão mais de 20 novas espécies para Portugal e mais de uma dezena a nível mundial, ou, noutras palavras, para a Ciência.

Sobre os dois casos divulgados hoje no comunicado da Universidade de Coimbra, o biólogo adianta que a Tegenaria barrientosi e a Parapelecopsis conimbricensis são de famílias bem diferentes. “A nível filogenético... São primos afastados”, simplifica. São venenosas? “Quase todas as aranhas são venenosas. O que me quer perguntar é se são toxicologicamente perigosas para o homem? Não, não são. Aliás, a maior parte não é”, informa o biólogo. Além de inofensivas, as espécies que vivem no Jardim Biológico de Coimbra são pequeninas. A Parapelecopsis conimbricensis mede uns dois a três milímetros de corpo e a Tegenaria barrientosi cerca de sete. Entusiasmado, o especialista conta que para conseguir identificar um nova espécie é preciso uma trabalho rigoroso de análise de uma série de pormenores, a estrutura reprodutora, os olhos, as cores, o tamanho. No caso da Parapelecopsis conimbricensis há uma característica que merece destaque: “Os machos têm uma espécie de elevação na cabeça, que é uma espécie de torre com alguns olhos, onde existem dos sulcos que julgamos que são os locais onde a fêmea se prende quando acasalam”. Os estudos do comportamento virão mais tarde confirmar ou não a teoria, mas Luís Crespo não consegue esconder o ânimo com a descoberta.

Algumas destas descobertas, como nos contou, entram-lhe pela casa dentro. Outras dão-lhe mais trabalho e ele tem de montar armadilhas para as conseguir. E há aranhas de estimação na casa de Luís Crespo? “Vivas? Não, não concordo. Só tenho uma aranha viva em casa quando preciso de a criar até adulta para os meus trabalhos. De resto, tenho uma colecção de exemplares em casa... alguns milhares. Mas estão em tubinhos conservadas em álcool!”.

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