Tribunal de Contas confirma derrapagem de dinheiros e prazos da Casa da Música

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Casa da Música é a terceira de cinco obras auditadas pelo TC Nélson Garrido (arquivo)

A auditoria do Tribunal de Contas (TC) à obra da Casa da Música, divulgada ontem, conclui que o projecto emblemático da Porto 2001 custou mais 230 por cento do que o inicialmente previsto - um salto de um pouco menos de 34 milhões de euros para um pouco mais de 111 milhões - e que a inauguração do edifício sofreu um atraso de quatro anos e meio. Em Julho de 1999, quando arrancaram os trabalhos preparatórios, o objectivo oficial ainda era o de que a Casa da Música abrisse as portas em Dezembro de 2001, a tempo de coincidir com o final da Capital Europeia da Cultura. Acabou por ser inaugurada em Abril de 2005, mas os trabalhos só foram formalmente encerrados em Maio do ano seguinte.

Os números não constituem surpresa, já que estão muito próximos daqueles que o dono da obra, a Casa da Música/Porto 2001, foi divulgando, designadamente no relatório apresentado aos accionistas em Fevereiro deste ano, e que antecedeu a extinção da sociedade, em Junho passado.

Para o engenheiro Paulo Sarmento e Cunha, que acompanhou de perto a fase inicial da obra, enquanto administrador da Porto 2001, e que depois viria a ser nomeado administrador liquidatário da sociedade Casa da Música/Porto 2001, esta foi "uma auditoria muito bem feita" e que teve o mérito de ser a primeira que não se reduziu aos programas de financiamento e abordou "todo o processo de construção da Casa da Música, desde a decisão de avançar com a obra até ao seu fecho", passando pela escolha do terreno e por todos os outros momentos decisivos do projecto, incluindo os diversos contenciosos que foram complicando a execução do edifício projectado por Rem Koolhaas.

Sarmento e Cunha, que regressou à administração da sociedade Casa da Música/Porto 2001 na sua fase final, após ter sido afastado durante o consulado de Rui Amaral, acha que este é "um documento muito útil", porque parte de um exemplo concreto, investigado em profundidade, para adiantar recomendações susceptíveis de evitar que se cometam os mesmos erros em obras futuras.

Cinco obras que derraparam

Foi justamente esse, de resto, o objectivo do Tribunal de Contas, que decidiu promover auditorias a cinco obras públicas, que têm em comum os avultados investimentos envolvidos, uma grande complexidade técnica e a circunstância de todas elas terem "evidenciado derrapagens significativas nos custos e nos prazos de execução". Segundo o TC, o propósito é o de "detectar os principais erros e falhas cometidos e, seguidamente, emanar recomendações para que os mesmos não se repitam". Foram já aprovados os relatórios relativos ao Túnel do Rossio, à Linha Azul do Túnel do Terreiro do Paço/Santa Apolónia e, agora, à Casa da Música, estando em vias de conclusão os que respeitam à ampliação do Aeroporto Francisco Sá Carneiro e à Ponte Europa, em Coimbra.


O documento ontem divulgado permite perceber em detalhe o que foi correndo mal, desde o facto de a obra ter arrancado quando ainda não existia um projecto propriamente dito, até à algo tardia constatação de que o grau de complexidade da execução do "meteorito" de Koolhaas era muito superior ao que o arquitecto deixara entrever. O TC sublinha ainda que as sucessivas alterações propostas pela equipa de projectistas implicaram mudanças significativas na contratação das empreitadas, com acréscimo de custos e dilatação de prazos. Uma das empreitadas que registaram maior atraso foi a das escavações, que deveria ter exigido 91 dias e requereu 311, em boa medida por se ter concluído que era preciso construir mais um piso subterrâneo. Já a construção da estrutura, que demorou o dobro do que fora estimado, prendeu-se com as dificuldades técnicas impostas pelas paredes inclinadas do edifício, que implicaram um sofisticado e dispendioso sistema de escoragem.

Entre os reparos mais duros que o relatório dirige à gestão do projecto conta-se a negligente conservação do arquivo, que as mudanças de sede da Porto 2001 deixaram em péssimo estado, a ponto de o auditor não ter conseguido encontrar vários documentos relevantes, o que o TC considera "uma falha grave".

Os números da Casa

33,92 milhões de euros foi a primeira previsão orçamental para a construção da Casa da Música.

111,09milhões de euros foi o preço final da obra, o que representa uma derrapagem de cerca de 230 por cento.

28meses foi o prazo inicialmente previsto para a execução da obra, que deveria estar concluída em Dezembro de 2001.

82 meses (quase sete anos) foi o tempo que a obra realmente exigiu, contado desde Julho de 1999, quando arrancaram os trabalhos preparatórios.

3286foram, segundo a Casa da Música, os eventos até agora realizados.

600.095espectadores assistiram a concertos e outras actividades, de um total de quase um milhão e meio de visitantes registados desde a inauguração.

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