Cônsul português em Cabo Frio a monte no Brasil

Foto
António Braga não quis fazer comentários Lionel Balteiro

Dono da sede do PS no Rio de Janeiro e principal financiador do candidato socialista ao círculo fora da Europa em 2005, Licínio Soares Bastos foi detido em Abril no âmbito da Operação Furacão, que desmantelou a denominada "máfia dos bingos", grupo que compraria decisões políticas e judiciais para beneficiar o jogo clandestino.

A Polícia Federal (PF) brasileira suspeita que o português fosse o intermediário do grupo nas negociações para abrir casinos em Portugal e no Brasil, tendo as autoridades brasileiras já enviado para a Polícia Judiciária documentação sobre suspeitas de branqueamento de capitais. Desse processo faz ainda parte uma escuta telefónica em que Jaime Garcia Dias, outro luso-descendente também detido na mesma operação, cita o nome e o cargo de António Braga, secretário de Estado das Comunidades, como alguém capaz de "desbloquear" uma obra embargada. Uma versão contestada pelo secretário de Estado, que garante não conhecer Garcia Dias e ter tido apenas contactos formais com Bastos.

Em Julho, o Supremo Tribunal de Justiça concedeu um habeas corpus a Licínio Soares Bastos e a outros suspeitos de integrarem a "máfia dos bingos", uma decisão que foi rectificada a 29 de Agosto pela 6.ª Vara Criminal Federal do Rio de Janeiro, que detectou novos indícios de lavagem de dinheiro. Nesse dia, a Polícia Federal não conseguiu, no entanto, encontrar nem Licínio Soares Bastos nem o sócio Laurentino Santos, também de origem portuguesa. Até ao momento não há qualquer informação sobre uma eventual captura dos foragidos.

Um ano depois de apoiar financeiramente o candidato do PS pelo círculo Fora da Europa, Aníbal Araújo, Licínio Soares Bastos foi nomeado cônsul honorário de Portugal em Cabo Frio, a 150 quilómetros do Rio de Janeiro.

A nomeação, despachada pelo secretário de Estado das Comunidades, António Braga, foi publicada em Diário da República no dia 16 de Maio de 2006, mas veio a ser suspensa meses depois quando se constatou que Licínio Bastos estava a ser investigado pelas autoridades brasileiras - a secretaria de Estado justificou a indigitação pela "disponibilidade" manifestada por Licínio Bastos para suportar todas as despesas do posto consular.

"Se o secretário de Estado disse em Maio que a exoneração estava em curso, porque, se foi nomeado em despacho publicado no Diário da República, tem de ser exonerado da mesma forma, é muito estranho que quatro meses depois tal ainda não tenha acontecido", disse ao PÚBLICO o deputado do PSD José Cesário, que na semana passada remeteu um requerimento ao Governo sobre este caso.

O social-democrata considera que a situação é "tanto mais grave" quanto se sabe que Licínio Bastos está fugido à justiça. E frisa que, durante este quatro meses, António Braga já exarou outras exonerações. "Talvez a soma dos factos nos ajude a perceber melhor este enredo", frisou Cesário.

"Esse protelar do afastamento de uma pessoa acusada de cometer ilegalidades deixa mal o nome de Portugal. Espanta-nos que nem o primeiro-ministro, nem o ministro dos Negócios Estrangeiros, nem o secretário de Estado das Comunidades esclareça cabalmente todos estes pontos cinzentos", diz Hélder Amaral, do CDS/PP.

Contactado pelo PÚBLICO, o assessor de imprensa da Secretaria de Estado das Comunidades, Eduardo Saraiva, limitou-se a declarar que o "Governo não responde a requerimentos através da imprensa", sem precisar a tramitação do processo de exoneração de um cônsul honorário.

Na sequência de um acórdão emitido pelo Tribunal de Constitucional, que detectava "irregularidades" e "ilegalidades" nas eleições de 2005, o processo foi entregue ao Ministério Público. Também a Entidade de Contas e Financiamentos Políticos (ECFP) está a investigar o financiamento da campanha eleitoral para as legislativas de 2005 do candidato do PS pelo círculo fora na Europa. O Expresso noticiou que a Comissão Nacional de Eleições deu como "inequívoco que foram utilizados para promover a candidatura do PS anúncios em autocarros, rádio e televisão, ficando apenas por comprovar a alegada utilização de aviões.

Sugerir correcção
Comentar