Cavaco explica hoje o que entende ser a função de Presidente da República

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Na sessão de lançamento do livro, na FNAC-Chiado de Lisboa, é natural que Cavaco Silva continue a alimentar o seu tabu sobre a candidatura presidencial Francisco F. Neves/Lusa

O segundo volume da autobiografia política de Cavaco Silva, que é lançado hoje em Lisboa, vai incidir sobre um dos momentos mais difíceis da coabitação Governo-Presidente da República em Portugal dos últimos anos: a que correspondeu ao segundo mandato de Mário Soares, era primeiro-ministro Aníbal Cavaco Silva.

No livro, ao relatar o que foram as suas duríssimas relações com o então Presidente da República, Cavaco Silva explicará - "para quem souber ler politicamente", afirma um apoiante da candidatura presidencial do ex-primeiro-ministro - qual o seu entendimento do que devem ser os poderes presidenciais.

Cavaco Silva negará o potencial intervencionismo excessivo que alguns lhe apontam ao denunciar - como já o fez durante aquela turbulenta coabitação - as interferências de Mário Soares na esfera de acção do Governo. É, pelo menos, disto que os seus apoiantes estão à espera - de que hoje, ao lançar o segundo volume da autobiografia política, Cavaco defina o que entende como o "perfil ideal do Presidente da República", muito antes, naturalmente, de qualquer anúncio oficial de candidatura às presidenciais de 2006.

No entanto, Cavaco Silva pode surpreender mesmo os seus apoiantes: a 10 de Outubro de 1995, quando anunciou a sua primeira candidatura a Presidente da República, contra Jorge Sampaio, Cavaco Silva colou-se explicitamente ao mandato de Soares, que nos anos anteriores tinha renegado. "Os portugueses em geral apoiam, gostaram, gostam da forma como o dr. Mário Soares tem exercido a sua magistratura", disse Cavaco Silva no dia em que formalizou o seu avanço para Belém, fazendo tábua rasa do passado recente.

O "tacticismo" desta declaração explica que, hoje, para manter a porta aberta em relação a uma candidatura presidencial, o antigo presidente do PSD possa vir a não ser muito duro com Soares na sua versão dos acontecimentos da negra coabitação. Segundo sectores do PSD, esta táctica servirá a Cavaco para manter alguma simpatia que as sondagens dizem que os eleitores de esquerda têm em relação à sua candidatura e, em última análise, porque há figuras destacadas do PS que têm, em privado, impulsionado o avanço de Cavaco Silva.

PSD cada vez mais convencido que Cavaco avança

O PSD, por seu lado, está cada vez mais convencido que Cavaco Silva avança para as presidenciais em 2006. Depois do vice-presidente do PSD, Santana Lopes, ter vindo anunciar a sua disponibilidade para ser candidato, vários dirigentes sociais-democratas que, à partida, preferiam ver Santana em Belém, são da opinião que o mais provável é que seja Cavaco a apresentar-se a eleições.

No entanto, na sessão de lançamento do livro, na FNAC-Chiado, em Lisboa, é natural que Cavaco Silva continue a alimentar o seu tabu sobre a candidatura presidencial. Na semana passada, quando participou num debate sobre a Europa, na Assembleia da República, foi questionado sobre se tencionava falar de presidenciais no dia de hoje e respondeu apenas que vai "apresentar aquilo que se costuma chamar memórias políticas". O receio no PSD é de que Cavaco continue a dar "sinais contraditórios", como tem estado a fazer.

As memórias sobre as relações difíceis entre o primeiro-ministro Cavaco Silva e o seu então secretário de Estado da Cultura, Pedro Santana Lopes, irão ser também objecto de grande curiosidade. Entretanto, Santana Lopes já se antecipou à divulgação do livro e na semana passada reafirmou, através do semanário "Independente", a sua versão sobre os motivos da sua saída do Governo. Santana diz que saiu do cargo de secretário de Estado da Cultura, em Dezembro de 1994, porque não aceitava o tabu a que Cavaco então amarrou o PSD sobre a sua intenção de se candidatar às presidenciais de 1996.

Santana Lopes tentou condicionar o ex-primeiro-ministro, quando, em recente entrevista ao "Expresso", disse que o prazo para o candidato presidencial da direita se assumir é logo depois das europeias. Os cavaquistas garantem que não têm ainda a certeza se Cavaco vai avançar ou não, mas o "timing" que pretendem não é este. De qualquer forma, está tudo a postos para, que assim que Cavaco Silva dê luz verde, seja constituída a comissão de candidatura. O ex-primeiro-ministro sabe disso.

Se Cavaco avançar, a incógnita será o que vai fazer Santana. No PSD, um dos cenários que é equacionado é o de que o autarca de Lisboa não deverá suspender as tréguas com Durão e que a sua ambição é a de, depois do papel de putativo candidato a Belém em que vai coleccionando apoios, ganhar cada vez mais peso no PSD. Havendo congresso do partido no final do ano, Santana ajudaria a formar uma comissão política que lhe seja favorável. O risco, alertam alguns sociais-democratas, é o PSD vir a tornar-se um partido hostil ao (eventual) futuro Presidente da República (Cavaco Silva).

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