Garcia dos Santos é julgado hoje

O general Garcia dos Santos, presidente da extinta Junta Autónoma de Estradas (JAE) entre Abril de 1997 e 24 de Junho de 1998, quando João Cravinho era ministro do Equipamento Social, é julgado hoje, no Palácio da Justiça de Lisboa. Na origem do julgamento está uma queixa por desobediência qualificada, apresentada pela comissão parlamentar de inquérito à JAE, que tinha por objectivo principal a fiscalização dos actos de corrupção na JAE denunciados pelo próprio Garcia os Santos.

O general recusou-se a revelar os nomes dos empreiteiros que trabalhavam para a JAE e que, segundo o próprio Garcia dos Santos afirmou na comissão, tinham assumido em conversas particulares com ele que haviam financiado partidos políticos. Afirma o relatório da comissão: "O longo depoimento por ele [Garcia dos Santos] prestado constituiu uma enorme frustração: não revelou factos susceptíveis de integrar o conceito de corrupção; recusou revelar os nomes dos construtores civis que afirmou terem-lhe contado haver financiado partidos políticos; e limitou-se a discorrer sobre generalidades vagas ou a glosar situações de facto entretanto apuradas pela sindicância ordenada pelo ministro do Equipamento..." Hoje, perante o tribunal, Garcia dos Santos vai invocar o argumento de que, se revelasse os nomes dos empreiteiros, de que ele tivera conhecimento em conversas sob sigilo, estaria a faltar à sua palavra e arriscava-se a ser por eles processado por difamação, porque não tinha testemunhas dessas conversas nem provas documentais. Se for condenado, incorre numa pena até três anos de prisão.
Rangel de Lima, presidente da JAE até 1996, e igualmente ouvido na comissão de inquérito à JAE, opôs também uma "recusa reiterada" em revelar "a identidade de um secretário-geral de um partido político" que, segundo ele próprio, "terá sido a única pessoa da classe política a telefonar-lhe para saber do posicionamento de determinada empresa num concurso público da JAE". Por isso, também ele, segundo o relatório da comissão, "é susceptível de integrar o crime de desobediência qualificada".
A comissão solicitou ao presidente da Assembleia da República (AR) que participasse do comportamento de Garcia dos Santos e de Rangel de Lima à Procuradoria-Geral da República, mas apenas Garcia dos Santos foi acusado de "desobediência qualificada". Segundo fonte do PS, na ausência de queixa por desobediência qualificada contra Rangel de Lima terá pesado argumentação jurídica desenvolvida pelo presidente da AR, Almeida Santos, junto da própria comissão parlamentar de inquérito.
Garcia dos Santos renunciou ao cargo de presidente da JAE em Junho de 1998, depois de ter desistido de obrigar João Cravinho a demitir o então administrador da JAE SA, Donas Botto, indicado pelo próprio general para o cargo, numa altura em que Donas Botto era já conhecido como um dos "sete magníficos", um dos funcionários superiores da JAE que alegadamente controlavam este organismo no tempo de Rangel de Lima.
"A demissão do general Garcia dos Santos teve exclusiva referência a um conflito pessoal com Donas Botto. Nunca, em nenhuma circunstância, enquanto presidiu à JAE, ele falou em corrupção", afirmou ao PÚBLICO João Cravinho, que foi ministro do Equipamento Social até Outubro de 1999.
As primeiras afirmações de Garcia dos Santos de que havia corrupção dentro da JAE surgiram numa entrevista ao "Expresso" de 3 de Outubro de 1998. Uma semana depois, João Cravinho ordenou uma sindicância à JAE. Como resultado, até ao momento, há já quatro processos acusados, com um total de 19 arguidos, dez processos arquivados e dois que ainda aguardam despacho.

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