Juiz Carlos Alexandre acredita estar a ser alvo de escutas, mas diz que isso não o incomoda

Em entrevista à SIC, transmitida na noite desta quinta-feira, admitiu também estar isolado na magistratura e não ter amigos entre os juízes.

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O juiz Carlos Alexandre, o magistrado que ordenou a prisão preventiva do ex-primeiro-ministro José Sócrates no âmbito da Operação Marquês, disse numa entrevista à SIC, que foi transmitida esta quinta-feira, não ter dúvidas de que estará a ser alvo de escutas. Embora não o diga claramente sugere que essas escutas são ilegais.

Numa entrevista que decorreu em Lisboa e em Mação, a sua terra natal, em que nunca aborda os processos que teve ou tem em mãos, o juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal (TIC), recusa dar pormenores sobre os sinais dessas escutas por “não as poder comprovar”.

“Sinto-me escutado no meu dia-a-dia, sob várias formas. (…) Por vezes há pessoas que não conseguem estabelecer contacto comigo. O telefone vai a baixo para voice mail quando eu estou em sítios onde há carga máxima e onde há comunicações. Não estou a dizer que há forças dessas…nomeadamente dos serviços de informações. Não estou a imputar”, afirmou o juiz.

De qualquer forma, o magistrado diz que essas escutas não o incomodam porque fala “abertamente” sobre o que tem de falar com as pessoas em causa, não tem “segredos” e não vê motivos para “tanta preocupação”.

Carlos Alexandre, de 55 anos, falou ainda sobre o assalto à sua casa há sete anos e em que lhe deixaram uma arma em cima da fotografia do filho, assunto que foi alvo de investigação. E nesse contexto garantiu não ter medo. “Se tivesse medo não levantava da cama. (…) Aceito o meu destino. Tenho família, mas enquanto o assunto for comigo não me preocupo.”

Juiz há 30 anos, Carlos Alexandre revelou ainda que já não vai a restaurantes porque o preocupa “o que as pessoas estejam a dizer" de si nas mesas ao lado ou ouvir o que estão a dizer dele “à procura de mexericos".

Carlos Alexandre revelou ainda que, ao fim de semana, costuma fazer turnos extras no Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa para estar atento à realidade do país e para pagar as contas ao final do mês. “Como eu não tenho amigos, amigos no sentido de pródigos, não tenho fortuna herdada de meus pais ou de meus sogros, eu preciso de dinheiro para pagar os meus encargos. E não tenho forma de o alcançar que não seja através do trabalho honrado e sério.”

Apelidado de super-juiz, Carlos Alexandre recusa essa alcunha até porque até porque isso lhe causa “alguma animosidade na classe”. O homem que raramente dá entrevistas ou presta declarações aos jornalistas, diz ter poucos amigos entre os magistrados. Classifica-se até como o “saloio de Mação” e “bicho-do-mato”. Na sua terra, é como o “Carlos Lagarto”, recordou.

Durante a entrevista, revelou ainda que teve uma embolia pulmonar em Dezembro de 2014 depois das detenções na Operação Marquês que o obrigou a ficar internado no hospital. Aproveitou ainda para dizer que não tira férias há dez anos.

E se um dia deixar a Justiça? Se esse dia por acaso chegar, assegurou que não seguirá a carreira política. Com 1,69 metros de altura, o juiz Carlos Alexandre sublinha que "ninguém deve ter medo" dele. Se eu a usasse para o mal [a informação que tem em sua posse], é que era muito perigoso”, afirmou.

O homem que guarda os maiores segredos de Portugal?

Este é o homem que “guarda os maiores segredos de Portugal”? Carlos Alexandre diss apenas “que conhece muita realidade”. "Se traduzirmos essa palavra por eu conhecer muita da realidade económica, de alguns negócios, de algumas operações bancárias, de algumas decisões políticas, de algumas decisões jurisprudenciais – atrevo-me a dizê-lo -, o que se passa nos bastidores delas, então de facto, eu conheço muita realidade. Não nego isso”.

Admitindo que ao mesmo tempo “sente pressão” por ter “boa memória”, Carlos Alexandre garantiu que “não anda a coleccionar” os vários episódios, nem “anda sempre” a pensar nisso. “Sou um grande cultor da lei moral de Kant: age de uma forma tal que queres que outros ajam em relação a ti da mesma maneira”, salientou.

De passagem por Mação, onde revisitou alguns dos edíficios que marcaram a sua infância, entre eles a escola primária, Carlos Alexandre recordou que desde criança que dizia querer ser juiz. Nessa altura, frequentava muito a igreja e até imitava a missa em casa. Tem, admitiu, um fascínio pela figura de Jesus Cristo. “Ainda hoje sou capaz de dizer muitas passagens” da missa, acrescentou.

Na passada quarta-feira, a Procuradora-Geral da República, Joana Marques Vidal, escusou-se a avançar com uma data para a conclusão da investigação da Operação Marquês, antecipando que "na altura própria" os jornalistas serão informados.

O director do Departamento Central de Investigação e Acção Penal, Amadeu Guerra, fixou a data de 15 de Setembro como o prazo limite para a conclusão da investigação (com acusação ou arquivamento) da Operação Marquês. Mas também já admitiu recentemente que tal prazo pode vir a ser ultrapassado caso seja necessário.

Tal afirmação coincidiu com informações de que os investigadores da Operação Marquês realizaram buscas na PT, no encalço de novas pistas sobre os negócios desta empresa no Brasil, depois de terem centrado atenções na alegada interferência de José Sócrates na aprovação do empreendimento turístico de Vale do Lobo, no Algarve.

Inconformado com o atraso na conclusão do inquérito em que é arguido, o antigo primeiro-ministro anunciou que ia processar o Estado português pela forma como está ser tratado pelo DCIAP, desde que foi detido em Novembro de 2014.

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