Cinema paraíso

Ettore Scola evoca Federico Fellini num objecto sincero e curioso, misto de documentário reconstituído e livro de memórias.

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Um dos nomes maiores da comédia à italiana (devem-se-lhe clássicos do género como Tão Amigos que Nós Éramos, Feios, Porcos e Maus ou Um Dia Inesquecível), Ettore Scola saíu da “reforma” para, no 20º aniversário da morte do seu velho amigo Federico Fellini, lhe dedicar este filme simpático. Misto de documentário reconstituído e livro de memórias pessoais, Scola encena com actores, no lendário estúdio 5 da Cinecittà, vinhetas soltas da história de Fellini e da amizade de longa data entre os dois cineastas.

A redacção do jornal humorístico Marc’Aurelio, onde Fellini e Scola deram os primeiros passos artísticos com alguns anos de intervalo, é o ponto de partida para uma fantasia nostálgica, semi-ensaística, sobre os anos de ouro do cinema italiano e a complexa teia de amizades e relações entre quem o fez. Aqui se evocam nomes que se cruzaram precisamente na redacção do jornal, como o realizador Steno ou os argumentistas Ruggero Maccari, Agenore Incrocci e Furio Scarpelli, mas também actores como Marcello Mastroianni, Alberto Sordi ou Giulietta Masina, pelo meio de uma narrativa fluida construída ao sabor das memórias e intercalada por imagens de arquivo. 

É verdade que Que Estranho Chamar-se Federico tem qualquer coisa de “volta de honra” que quase exige desconto às evidentes fraquezas do filme - Scola tinha 81 anos aquando da rodagem e havia dez anos que não filmava – e que o final tem um aroma inconfundível de Cinema Paraíso, fazendo pelo cinema de Fellini o que Giuseppe Tornatore fez por toda uma geração de cinéfilos. Mas a nostalgia deste passado perdido, contado por quem o viveu, é mais pragmática e inevitável do que calculada ou gratuita. E essa sinceridade dá a este objecto curioso, espécie de “coda” de duas carreiras brilhantes, uma gravidade inescapável e um capital de simpatia irresistível.

 

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