Centro de arbitragem fiscal recebe número recorde de processos contra o Estado

Tempo médio de decisão dos processos na arbitragem tributária, de quatro meses e meio, torna o serviço mais atractivo.

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Em 2007, Manuel Albert Soares foi ilibado em tribunal de primeira instância do Porto Adriano Miranda

O Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), uma alternativa mais célere do que o Tribunal Tributário, já recebeu este ano 333 processos, ultrapassando o total de 311 queixas recebidas em todo o ano de 2013. O imposto único de circulação (IUC) e o Imposto do selo (IS) sobre imóveis de luxo, são, destacadamente, as matérias mais reclamadas pelos contribuintes.

O tempo médio de resposta, de quatro meses e meio, poderá ajudar a explicar o aumento de processos entrados no CAAD, a que se poderão juntar outras explicações, designadamente o sentido de algumas decisões entretanto publicadas e que são favoráveis aos reclamantes.

Criada em Julho de 2011, a arbitragem em matérias fiscais já recebeu 820 processos. As decisões do tribunal arbitral são obrigatórias para as partes, admitindo apenas dois tipos de recursos, um de impugnação das decisões para o Tribunal Administrativo, se tiver sido violada alguma das formalidades previstas no regime jurídico do tribunal arbitral, ou para o Tribunal Constitucional, se estiver em causa a violação de princípios constitucionais. No caso de uma das decisões sobre imposto do selo, decidido a favor do contribuinte, a Administração Tributária recorreu para o Tribunal Constitucional, mas este não aceitou o recurso, confirmando a sentença arbitral.

No Tribunal Tributário, onde, de acordo com o presidente da Associação Lisbonense de Proprietários (ALP), Menezes Leitão, estão a ser apresentados centenas de processos de impugnação relativos ao imposto sobre imóveis de luxo, não é conhecida qualquer decisão. Estes processos estão relacionados com a aplicação do IS de prédios antigos, em propriedade vertical, muitos com rendas congeladas, e terrenos classificados para construção, a que o Estado alargou o referido imposto.

O recurso ao CAAD e ao Tribunal Tributário tem custas equivalentes para quem perde o processo. No entanto, no CAAD, o valor pago a título de custas é um pouco mais elevado à entrada, já que corresponde a 50% do custo total. No Tribunal Tributário, o valor inicial corresponde a cerca de 1/3 das custas totais.

Dos processos entregues na CAAD até esta segunda-feira, 31% são relativos ao IUC, destronando da liderança o IRC. A este aumento não será alheia uma sentença recente e inédita da arbitragem tributária sobre este imposto, que deu razão a um contribuinte a quem as Finanças imputaram o IUC de viatura entretanto vendida, mas que o novo proprietário não registou em seu nome. Trata-se de uma situação com que se deparam muitos contribuintes, mas que assume valores elevados no caso de empresas de comércio ou aluguer de automóveis.

Na sentença em causa, a que se seguiram outras, o tribunal arbitral constituído para o efeito considerou válidas as provas de venda apresentadas e condenou o fisco a devolver as verbas cobradas.

Imposto do selo com 78 processos
A segunda matéria mais reclamada, que passou da terceira para a segunda posição, é o IS, com 78 processos já entrados este ano. Os pedidos de impugnação relativos a esta matéria estão directamente ligados ao imposto sobre imóveis com valor patrimonial tributário (VTP) superior a um milhão de euros, pelo que ficou conhecido como imposto sobre casas de luxo. O imposto, criado em 2012, depois de iniciativa semelhante em França, e que visava ajudar a corrigir o desvio orçamental e a cumprir a meta revista do défice de 5% para esse ano, está a ser cobrado, em larga escala, em imóveis em regime de propriedade vertical, pertencente ao mesmo proprietário, através da soma das várias fracções ou andares, e a terrenos com licença de construção, o que apanha muitos promotores imobiliários.

O valor corresponde a 1%, sempre que é atingido um VTP igual ou superior a um milhão de euros e acumula com outros impostos sobre o património. Os prédios em regime de propriedade horizontal ficam isentos deste imposto (porque não é feita a soma dos valores das várias fracções, no caso de pertencerem ao mesmo proprietário), bem como os imóveis destinados a fins comerciais, o que tem sido considerado uma situação discriminatória.

Dos 78 processos entrados, 36 são relativos a terrenos para construção e 42 a imóveis em regime de propriedade vertical.

O histórico de decisões no CAAD, sobre IS, num total de 10, todas favoráveis aos contribuintes, poderão ajudar a explicar o aumento de pedidos de arbitragem nesta matéria, desde o início do ano. Destas decisões, três estão relacionadas com prédios verticais e sete com terrenos.

Dos processos entrados este ano, as matérias relativas ao IRS e IRC representam 19% e 14% respectivamente. A incidência de processos sobre outras matérias é menor (ver infografia).

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