Que se passa com a banca?

A banca queixa-se sempre. Fá-lo discretamente, mas, não raras vezes, tem o poder suficiente para influir em decisões importantes do Estado.

“Democracy substitutes election by the incompetent many for appointment by the corrupt few”
George Bernard Shaw

Segundo notícias veiculadas pela comunicação social, a banca portuguesa espera acumular cerca de 2000 milhões de euros de prejuízo no ano de 2013.

Aparentam vir de longe os desatinos da banca (acompanham os do país...).

Remontam ao tempo em que o diligente professor Marcello Caetano entendeu aliviar o controlo e o respeito, em que a tinha o seu antecessor no cargo de presidente de Conselho de Ministros, e que vinha desde 1928; depois pelos desmandos do PREC, nomeadamente através das nacionalizações e das intervenções estouvadas.

A coisa nunca mais bateu certo.

O que os homens do dinheiro tinham a cobrar a comunistas, socialistas e outros “istas” estão-lhe estes a tentar cobrar agora, embora com vantagens para os primeiros. Até ver...

O capitalismo “selvagem” desregulou, entretanto, tudo e todos e não houve Comissão Europeia que antecipasse, evitasse ou combatesse fosse o que fosse. Passaram a ser, aliás, parte do problema e não da solução.

A população portuguesa vê a “guerra” ao longe, mas os tiros e as bombardas acertam-lhe em cheio.

Os poderes públicos comprometidos até ao tutano, com tudo o que de errado se passou, governam para a fotografia e continuam a atacar os efeitos em vez das causas. Os predadores internacionais agradecem e aproveitam para nos pilhar.

O país está de facto a ser “desmontado” e alienado.

Tem de haver muita inconsciência, ignorância, ganância, incompetência e corrupção no meio disto tudo. Ou uma combinação de vários.

Centenas de empresas abrem falência em Portugal, mas não há um único banco que o faça, apesar de todos os escândalos que já viram a luz do dia. Antes pelo contrário, os governos metem lá o dinheiro dos contribuintes para os segurarem.

Que teoria económica/financeira, ideologia política ou moralidade pública pode justificar semelhante atitude? Alguém sabe responder?

Por outro lado, centenas de outras empresas sobrevivem e desenvolvem-se sem o apoio efectivo da banca, sendo esse apoio a sua razão de ser primeira – apoiar a economia (ou será que é a distribuição de dividendos aos respectivos accionistas?).

Estão aquelas a ser muito elogiadas, por políticos pressurosos, por serem a esperança de salvação do país ao exportarem mais e assim melhorarem a balança de pagamentos, apesar de estar longe o crescimento que permita pagar os juros das dívidas que, a um ritmo de relógio suíço, continuamos a contrair...

Convinha, no entanto, termos estatísticas credíveis que permitissem verdadeiramente avaliar o comportamento da economia e saber até que ponto esta está dependente do turismo (que é conjuntural e sazonal); da venda de refinados de petróleo (cujo investimento – uma boa aposta – vai levar muito tempo a amortizar), e qual o montante de ouro e jóias de que as famílias portuguesas se estão a desfazer está a engrossar a saída de riqueza do país.

A banca queixa-se sempre. Fá-lo discretamente mas, não raras vezes, tem o poder suficiente para influir em decisões importantes do Estado.

Terá razões para se queixar? Eis uma questão que merece uma resposta.

Aparentemente não tem.

Goza de um estatuto privilegiado; o Banco de Portugal – que virou uma espécie de Estado dentro do Estado –, que supostamente a tutela e lhe impõe critérios e baias, tem sido de uma liberalidade pasmosa.

O Banco de Portugal, aliás, nada parece conseguir antecipar ou prever, actuando em conformidade, prática em que ganhou especial destaque o mandato do Dr. Vitor Constâncio, mais tarde promovido (certamente por distinção) a "vice" do BCE.

Consta também que a promiscuidade entre gestores do Banco de Portugal e a banca é vasta e, possivelmente, só tem paralelo no que acontece entre parlamentares e outros cargos privados que uma democratíssima legislação permite, confunde e incentiva...

A banca é menos penalizada nos impostos do que o mundo empresarial e o comum dos cidadãos; tem tido liberdade q.b. para comercializar os produtos mais díspares, incluindo a Bolsa, mesmo aqueles que vieram a ser apodados de “tóxicos”; idem para as taxas que cobram aos clientes; gozam da faculdade de contrair empréstimos a juros mais baixos, nomeadamente no BCE; fomentam (e já fomentaram mais) o endividamento de todos, através de uma publicidade agressiva e às vezes enganosa, relativamente a financiamentos, cartões de plástico, compras de bens, etc. e, agora, estão aflitos a tentar cobrar o crédito malparado e a gerir os bens que lhes caiem no regaço por falta de pagamento dos respectivos empréstimos.

Enfim, se olharmos bem para as nossas contas, constataremos que as mesmas estão sempre a ser escoadas por pequenas taxas constantemente aplicadas, que as mais das vezes desconhecemos e nem nos damos ao trabalho de perguntar.

No meio disto tudo, não há memória de ver um banqueiro pobre (e raramente se suicidam) nem a acompanhar uma refeição com um vinho abaixo da fasquia de um Pêra Manca – passe a propaganda – entretendo-se a fazer “opas hostis”; em guerras de família; a discutir ou a lutar por reformas milionárias; em tricas de gestão ou de “estratégia” e quase sempre a evitar ter o capital social que o “negócio” aconselha ou obriga. Todavia, sempre a queixarem-se.

Terão alguma razão quanto ao empréstimo que Governo lhes quer fazer com dinheiro da troika, cobrando em troca juros elevados e direito a nomearem gestores. Sabe-se como um dos principais bancos nacionais tem resistido a isto e os restantes bem se querem livrar dessa “canga”. Mas como com esse dinheiro depois emprestam a juro mais elevado a quem lhes bate à porta, acabam sempre por ser o público e as empresas a pagar para todos...

As preocupações sociais também lhes passam ao lado. Sobram para a Igreja e organizações de solidariedade...

E Portugal, como pátria individualizada no concerto das nações, dir-lhes-á alguma coisa? (E como lhes dirá se os próprios órgãos do Estado falam em alienar os poderes que detêm na CGD e importam financeiros ligados a poderes externos, a fim de orientar os nossos destinos?)

Não há problema: a população mantida na mais perfeita ignorância política e confusão moral pelos tais que Bernard Shaw apontava paga tudo e não manda nada. Desfruta do espectáculo nas televisões e descarrega a bílis na Net (o mais das vezes ao abrigo do anonimato) e, algumas vezes, na rua, o que não serve em rigor para nada (trata-se da bílis), já que apenas está a “usufruir do seu direito democrático à reunião e ao protesto”.

De facto, a banca queixa-se de quê?

Oficial piloto aviador

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