Presidente da Refer teme que “se deixe cair a empresa por causa da fusão” com a Estradas de Portugal

Trabalhadores da gestora ferroviária vão debater nesta terça-feira eventuais formas de luta contra este processo.

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Presidente da Refer contesta poupanças de mil milhões anunciadas pelo Governo Foto: Luís Po

O presidente da Refer não esconde a sua insatisfação pela forma como a comissão que lidera o processo de fusão da empresa com a Estradas de Portugal está a conduzir os trabalhos, pondo e dispondo dos seus quadros, que recorrentemente chama para reuniões. “Isto está a demorar tanto tempo que começamos a ter problemas internos de funcionamento. Não se pode deixar cair a empresa por causa da sua fusão. A fusão tem de ser feita com as empresas em funcionamento”, disse ao PÚBLICO Rui Loureiro.

Num despacho assinado na semana passado, o conselho da administração da Refer informava que, a partir 1 de Dezembro, os colaboradores da empresa “não estão autorizados a responder a convocações directas da comissão” e que a assistência a reuniões “passará a ter de ser autorizada pelo respectivo administrador do pelouro”.

O mesmo documento, a que o PÚBLICO teve acesso, referia ainda que os quadros da Refer deverão fazer “uma súmula dos assuntos tratados nas reuniões” com a equipa de António Ramalho (que preside à comissão que está a preparar a fusão das duas empresas e que liderada a Estradas de Portugal).

O despacho recorda que aquela comissão foi criada a 6 de Agosto e que administração da Refer “tudo tem feito para permitir a execução do seu trabalho, nomeadamente aceitar que a comissão tenha convocado directamente directores e estruturas intermédias para reuniões sem seu conhecimento prévio, com óbvio prejuízo das competências que lhe foram legalmente cometidas, nomeadamente a da gestão dos seus recursos humanos”.

Mas, passados cinco meses, a situação de chamar directamente quadros da Refer para reuniões de trabalho “está a provocar distorções de interpretação de responsabilidade na empresa, eventualmente potenciados pelo voluntarismo de alguns dos nossos colaboradores, com evidentes prejuízos no funcionamento da Refer”, lê-se no documento.

O PÚBLICO sabe que, internamente, há quadros desmotivados com a perspectiva do fim da empresa, que vai ser fundida nas Estradas de Portugal, enquanto outros estão altamente motivados para conseguirem posicionar-se favoravelmente na nova estrutura. Daí o “voluntarismo” referido no comunicado do conselho de administração da Refer. O drama, no funcionamento da empresa, é que Rui Loureiro, que não integra a comissão da fusão, “já não manda” enquanto presidente da Refer e António Ramalho “ainda não manda” formalmente na empresa, embora tacitamente muitos considerem que sim.

Como António Ramalho já anunciou que não serão mantidos todos os postos de trabalho, só o pessoal da Refer directamente ligado à actividade ferroviária da empresa poderá considerar-se a salvo, havendo, por isso, alguns que se voluntariam para colaborar com a comissão. No entanto, e como é voz corrente entre os funcionários, sindicatos, comissão de trabalhadores e até mesmo através de comunicados da estrutural sectorial do PS, não há nenhum funcionário da Refer que seja favorável à fusão, tendo esta decisão do Governo apanhado toda a gente de surpresa.

O desalento foi tal que em Julho passado o próprio Rui Loureiro sentiu necessidade de reunir os quadros de topo incentivando-os a trabalhar com o mesmo entusiasmo, fazendo-lhes recordar que a actividade da empresa já era, até 1997, desenvolvida no âmbito da CP e que continuaria a sê-lo agora sob a égide da futura Infra-estruturas de Portugal.

Mas hoje já não há tanta certeza disso. Uma das áreas que já está em estudo é o planeamento dos investimentos em manutenção que passará a agrupar as estradas e o caminho-de-ferro num só canal. Por exemplo, a linha do Oeste será agrupada com a Estrada Nacional nº8, que corre paralela, e a linha do Douro agrupará com a EN 222, o mesmo acontecendo no Minho e no Algarve. Só as auto-estradas não entram no mesmo canal porque estão concessionadas.

A comissão de trabalhadores da Refer agendou para esta terça-feira um plenário, pelas 10h, para debater a fusão e eventuais formas de luta.

No início do Verão, o Governo elevou exponencialmente as expectativas de poupança com esta fusão para mais de mil milhões de euros até 2019, quando inicialmente se apontava para valores entre 350 e 400 milhões. Este incremento foi explicado com o facto de se prever a alienação de diversos activos imobiliários, o que não significa que haja uma poupança, mas antes um encaixe que poderia existir mesmo sem que as empresas fossem fundidas. O PÚBLICO questionou recentemente a Refer e a Estradas de Portugal sobre os imóveis que serão alienados, mas não obteve resposta.

O presidente da Refer, porém, questiona estes números. “Mil e cinquenta milhões de euros em cinco anos são 200 milhões por ano, mas os custos operacionais da Refer são de 180 milhões por ano. Só se a Refer fechasse. E mesmo assim ainda teriam de ir poupar dinheiro noutro lado”, disse ao PÚBLICO. Com Raquel Almeida Correia

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