O dinheiro saía de Chipre enquanto o Presidente negociava

Sucursais dos bancos cipriotas em Londres não fecharam, nem impuseram limites aos levantamentos. Também foram autorizadas transferências para empresas e compras de produtos humanitários e medicamentos.

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Os levantamentos controlados nas caixas automáticas não foram a única via para tirar dinheiro dos bancos cipriotas Nuno Ferreira Santos

Enquanto o Presidente Nicos Anastasiades hesitava sobre um resgate por parte da União Europeia que poderia a acabar com a condição de Chipre como um refúgio financeiro, havia dinheiro a sair dos bancos que estavam fechados.

Em notas levantadas nas máquinas automáticas e em transferências excepcionais para “abastecimentos humanitários”, grandes quantidades de euros saíram da ilha, tanto antes, como depois dos deputados cipriotas terem surpreendido a Europa ao rejeitar uma taxa sobre todos os depósitos bancários.

Os negociadores da União Europeia aperceberam-se de que algo estava errado quando o Banco Central de Chipre pediu ao Banco Central Europeu mais notas do que aquelas que seriam necessárias, tendo em conta os levantamentos que estava a comunicar a Frankfurt. “As quantidades que os cipriotas comunicaram (...) numa base diária eram muito inferiores à realidade”, afirmou uma fonte da União Europeia familiarizada com o processo.

A confusão sobre quanto dinheiro saiu ao certo dos bancos cipriotas é ilustrativa da confusão que marcou todas as negociações. Apesar de representar apenas 0,2% da economia da zona euro, Chipre (que estava particularmente exposto à economia grega, a primeira a ser resgatada) ameaçou reacender a crise.

Ninguém sabe ao certo quanto dinheiro saiu dos bancos de Chipre, nem para onde foi. As duas instituições no centro da crise – o Laiki e o Banco de Chipre – têm sucursais em Londres que permaneceram abertas ao longo da semana e que não impuseram limites aos levantamentos. O Banco de Chipre também tem 80% do banco russo Uniastrum, que não colocou quaisquer limites aos levantamentos na Rússia – os russos estavam entre os maiores depositantes nos bancos cipriotas.

Enquanto os cipriotas comuns faziam filas nas máquinas automáticas para levantar algumas centenas de euros, outros depositantes usaram uma série de técnicas para ter acesso ao dinheiro nas contas. A algumas empresas foram assegurados fundos para evitar que entrassem em incumprimento e também foram autorizadas transferências para a compra de produtos humanitários, medicamentos e combustível de aviões.

Chris Pavlou, que foi vice-presidente do Laiki até sexta-feira, afirmou que, apesar de ter sido levantado dinheiro ao longo de vários dias, as operações foram na ordem dos milhões de euros, não dos milhares de milhões. O ministro alemão das Finanças, Wolfgang Shaeuble, escusou-se a avançar números, mas disse que o encerramento dos bancos limitou a fuga de capitais e que o Banco Central Europeu estava a olhar para o assunto com atenção.

Ao abrigo do acordo fechado na madrugada desta segunda-feira entre Chipre, a Comissão Europeia e o FMI, os grandes depositantes (entre os quais russos e britânicos) vão acabar a pagar uma taxa de 30% sobre os depósitos, muito mais do que os 10% dos quais o presidente cipriota os tentou inicialmente proteger – isto, se o dinheiro ainda lá estiver.

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