Krugman acredita que há espaço em Portugal para medidas menos "severas"

Nobel da economia diz que o mais preocupante no país é a queda da população activa.

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Paul Krugman Rui Gaudêncio

Paul Krugman, mediático Nobel da Economia, defende que há espaço em Portugal "para se ser menos severo". Apesar de o país não "poder deixar de se preocupar com a dívida", a austeridade a que esteve sujeito nos últimos anos "foi mais do que a necessária" e teve consequências para a economia.

Discursando num auditório completamente cheio no Museu do Oriente, em Lisboa, onde participou no congresso da Associação Portuguesa das Empresas de Distribuição, Krugman defendeu que "não há boas razões para se ser religioso quanto às metas orçamentais". Ainda assim criticou o valor do salário mínimo nacional, que considera elevado e acima de um "nível prudente".

Questionado mais tarde pelos jornalistas, admitiu não estar muito a par das medidas do Governo para estimular a economia, mas voltou a frisar que “há espaço para um pouco de redução da austeridade”. Krugman acrescentou que “infelizmente” o executivo tem pouca margem de manobra. “Não se podem fazer grandes mudanças dentro da zona euro, há grandes constrangimentos”, sublinhou.

Mas o que preocupa mais o Nobel da Economia é a demografia e a emigração, não só em Portugal, mas também na União Europeia. "Se o número de futuros trabalhadores não cresce, há menos pessoas a pagar impostos", fez notar. Não é preciso construir mais fábricas ou empresas, exemplificou. Demasiada austeridade "força a emigração", alertou. "Tenho razões para me preocupar", disse.

O economista identificou ainda outros riscos para a economia da UE – que pode entrar em colapso, se “houver um choque”. “A Grécia ainda persiste. Não é uma grande economia, mas pode abalar a economia. Há o 'Brexit' – o meu palpite é que o Reino Unido não vai sair da UE –, há ainda acontecimentos na China, um mercado de importação e exportação importante para a Europa. Há ainda o declínio do euro face ao dólar”, disse. “E não era bom de ver o que aconteceria à Europa se Donald Trump ganhasse as eleições”, ironizou.

Comissão Europeia "tem de relaxar mais"

Por estes dias, há dois universos que dominam a economia: um é o Banco Central Europeu, “liderado por pessoas inteligentes e observadores, com consciência dos riscos e que estão a tentar fazer tudo o que podem”. O outro “são os políticos em Bruxelas – e ainda pior de Berlim – que têm uma visão do mundo que parece baseada na moralidade” e “bastante afastados dos problemas reais”, especificou.

Aos jornalistas o Nobel não foi parco em palavras quando foi questionado sobre as metas orçamentais definidas pela Comissão Europeia. “A Comissão Europeia devia relaxar um pouco. A rigidez das regras não é apropriada, tendo em conta a natureza do problema. O problema não é a indisciplina orçamental, mas sim de um ajustamento difícil e de fraqueza da economia”, sustentou, acrescentando que Bruxelas “está obcecada com números”. “Não nos podemos esquecer que, quando um país grande viola os acordos orçamentais, de alguma forma é perdoado. E isso devia acontecer mais com os pequenos países.”<_o3a_p>

No encerramento do congresso, o ministro da Economia, Manuel Caldeira Cabral, sublinhou que em Portugal “já se notam sinais de retoma”, que está a ser “mais lenta do que é desejável, também pela falta de mais estímulo da política europeia”. Pegando numa ideia defendida por Krugman, Caldeira Cabral disse que o investimento tem de vir de “países que têm margem orçamental para o fazer”. “Portugal não pode liderar uma política expansionista e de estímulo ao crescimento”, disse.<_o3a_p>

Paul Krugman esteve em Portugal pela primeira vez em 1976, incluído num grupo de estudantes de doutoramento do MIT (do qual fazia parte Miguel Beleza). A pedido de Silva Lopes, na altura governador do Banco de Portugal, os alunos passaram três meses das férias escolares a estudar a economia nacional. Mais tarde, Krugman diria que o país era semelhante a uma economia da América Latina.

Três anos depois de ter estado em Lisboa, escreveria o artigo de dez páginas que revolucionou a teoria do comércio internacional e geografia económica que lhe valeu o Nobel da Economia. Braga de Macedo já o caracterizou como "o economista mais elegante do mundo".

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